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Depressão é um dos problemas mais frequentes; no entanto, pode ser o momento em que parentes se unem
Desemprego compromete relação familiar
LUIZ CAVERSAN
DA REPORTAGEM LOCAL
Se o final da relação de emprego
ocasiona perda generalizada na
qualidade de vida das pessoas, o
impacto nas relações familiares e
na saúde psicológica do trabalhador é enorme. Eis dois dados bastante reveladores:
1 - Estudo realizado pelo serviço
de saúde de Manchester, Inglaterra, envolvendo 61 mil pessoas, indicou que o desemprego é o terceiro maior elemento detonador
de transtornos afetivos, sobretudo depressão. Perde apenas para
a ausência de relacionamento íntimo/familiar e doenças graves.
2 - Pesquisa desenvolvida em 17
países pelo Grupo BPI, multinacional da área de recolocação profissional, aponta que um em cada
dois casos de separação conjugal
detectados foi precedido por problemas relacionados a desemprego envolvendo um dos integrantes do casal. Ou seja, 50% das separações tiveram a falta de trabalho como fator preponderante.
Há um consenso entre especialistas a respeito dos "malefícios"
do desemprego nessas áreas.
Quanto às relações familiares, verifica-se um paradoxo: a desestabilização financeira pode ser um
elemento de aproximação familiar, pois força a criação de uma
rede de proteção entre parentes.
Mas, quanto à saúde, não há o
que discutir: "A literatura médica
é farta em referências a esse respeito. E essa pesquisa inglesa, reveladora de uma situação muito
grave e atual", afirma o psiquiatra
Jair Mari, professor titular da Escola Paulista de Medicina.
Para Mari, a relação direta entre
desemprego e depressão segue os
ditames de um esquema perverso: "O principal sentimento que
emerge na situação de perda de
emprego é o de inutilidade. Esta,
por sua vez, vai ocasionar três tipos de transtornos: a ansiedade,
os transtornos somatoformes
(dores generalizadas) e a depressão, o mais frequente."
Mari alerta para o fato de que
nem todo desempregado irá desenvolver a doença. "Mas os que
tiverem predisposição correm
um risco maior. E o que se segue é
uma série de obstáculos, uma vez
que a depressão é incapacitante e
vai dificultar muito o retorno ao
mercado de trabalho."
Mari afirma que o problema
afeta mais os homens do que as
mulheres ("Ele perde sua condição de provedor, sente-se diminuído.") e pode ser detectado fortemente no dia-a-dia clínico. Na
verdade, os problemas de saúde
podem começar mesmo antes de
a demissão ocorrer.
A Isma, entidade internacional
voltada para o estudos sobre o estresse, entrevistou no Brasil 304
pessoas que estavam na iminência de perder o emprego. Constatou que: 53% aumentaram o consumo de álcool, 93% se queixaram de tensão muscular, 56%
apresentaram distúrbios de sono,
31% estavam mais agressivos e
29% tinham alterações na libido.
Se os dados da pesquisa da BPI,
revelados pelo professor da FGV e
diretor da empresa, Gilberto Guimarães, indicam o impacto desastroso do desemprego nos relacionamentos, ela aponta também
para situações de sobrevivência
entre os 50% que não se separaram. A mais notável é a "rede de
solidariedade" familiar que se estabelece em torno de um parente
afetado pela crise.
Historicamente, ensina a professora Ana Maria Bianchi, titular
da Faculdade de Economia da
USP, as famílias se unem no momento de risco à sobrevivência.
"Antigamente, se ajudavam na lavoura. Hoje, na contabilidade da
renda familiar. É aí que aparece
aquele parente que funciona como um banco, fazendo a compensação e a transferência para o
que está em dificuldades."
Se ainda não precisou recorrer
ao "caixa" de parentes, o casal
Marco Antônio, 45, e Tânia Pedrosa, 36, vive a inversão dos papéis em casa. Formado em engenharia e administração, com pós-graduação em administração
hospitalar, ele perdeu o emprego
há dois anos. Desde então, a renda familiar caiu de cerca de R$
7.000 para perto de R$ 3.000, o salário dela como secretária. "Se
não fosse a compreensão e o
apoio de minha companheira, estaríamos perdidos", diz ele, que
hoje cuida do filho de oito anos e
de outros afazeres domésticos, intercalados com trabalhos esporádicos e a busca de novas oportunidades.
"Tivemos que cortar a empregada, não saímos mais para comer fora, os passeios são restritos,
mas estamos unidos e enfrentando a situação, inclusive com o
apoio do restante da família, que é
de boa índole", afirma
Esse tipo de apoio também foi
dedicado a Marta Tramonte, 36,
que vivia por conta de um emprego numa empresa de moda e do
trabalho de atriz. Ela perdeu o primeiro trabalho e, junto com o filho de 14 anos, foi obrigada a deixar o apartamento em que vivia
para voltar à casa dos pais, ambos
professores. "É difícil, mas estou
encarando como um recomeço."
Além de ter sido obrigada a vender o carro e ver sua renda diminuída em perto de R$ 3.000, ela
tem agora que lidar com questões
delicadas, como a divisão do espaço. "É uma relação totalmente
invasiva, não sei se boa ou ruim.
Mas há momentos em que eu não
quero que ninguém me pergunte
se estou bem ou não."
O problema de Marta pode ser
minimizado, no entanto, se comparado ao de Fernando, 48, que
não quis revelar o sobrenome. Ele
perdeu o alto posto que ocupava
numa multinacional, onde tinha
salário de R$ 25 mil. Hoje, está em
tratamento à base de antidepressivos e com sérios problemas com
a mulher, com quem é casado há
dez anos. "Ela quer se separar. Estou no fundo do poço", diz.
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