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Política econômica recessiva gera 583 mil novos desempregados nas grandes cidades e desgasta propaganda dos programas sociais
Desemprego em alta ofusca "retórica da fome"
MARTA SALOMON
GABRIELA ATHIAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Luiz Inácio Lula da Silva assumiu a Presidência prometendo
aos brasileiros três refeições ao
dia, mas termina os primeiros seis
meses no cargo amargando a cifra
de 583 mil novos desempregados
nas grandes cidades e o recrudescimento do trabalho infantil no
Nordeste, a região mais pobre.
Ao longo desse período, Lula
percebeu que a fome não é o principal desafio a enfrentar. No saldo
dos seis meses, o desemprego
aparece como a principal sequela
na área social -resultado de uma
opção por juros mais altos e cortes pesados nos gastos públicos.
"O risco era de uma desorganização da economia", pondera o
ministro do Trabalho, Jaques
Wagner, sobre a opção, insistindo
em que está mantida a meta da
campanha de Lula de criar 10 milhões de empregos. Mas avisa:
"Sou ministro do Trabalho e não
mágico: empregos são gerados
com crescimento econômico".
Levantamento do Ministério do
Trabalho confirmam o desaquecimento da economia e a desaceleração no número de novos postos de trabalho com carteira.
Os empregos criados estão sobretudo fora das regiões metropolitanas pesquisadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Foram criados 435 mil
postos com carteira assinada de
janeiro a maio de 2003 contra 547
mil em igual período do ano passado, num claro sinal de desaceleração. Na construção civil, chegou a haver redução de vagas.
Aos seis meses de governo, Lula
começará a tirar do papel uma das
prioridades da campanha: após
vários adiamentos, o Programa
Primeiro Emprego será lançado
amanhã com o objetivo de dar
trabalho a jovens de 16 a 24 anos.
Além do desemprego, alguns fatos enodoam a área social, que deveria ser a vitrine do governo. O
maior exemplo é o atraso no pagamento das bolsas do Peti, o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, destinado a retirar
crianças e adolescentes de até 16
anos do trabalho penoso, estimulando-os a frequentar a escola e
participar de uma jornada extra
de atividades socioculturais.
Na zona rural do Nordeste, as
crianças do Peti foram tiradas
principalmente de pedreiras,
campos de sisal e casas de farinha.
Nas zonas urbanas, dos lixões.
"Fiquei chocada ao saber que as
crianças estavam voltando para
os lixões de Olinda (PE)", disse
Reiko Nimi, a representante do
Unicef (Fundo das Nações Unidas
para a Infância) no Brasil.
Pernambuco e Bahia recebem
30% das 810 mil bolsas que o programa distribui hoje. São dois dos
maiores focos de trabalho infantil
do país. Na Bahia, 118 mil crianças
dependem da bolsa para sair da
"lida". Em Pernambuco, 126 mil.
Na Bahia e em Pernambuco os
atrasos variam de um a dois meses. José Augusto Valente, coordenador-geral do Ministério da
Assistência e Promoção Social,
pasta responsável pelo Peti, explicou que o governo passado deixou de pagar as bolsas de novembro e dezembro e que isso teve um
efeito negativo no cronograma de
pagamentos. Disse que, em agosto, tudo já estará regularizado.
"É inconcebível que isso ocorra
num governo que diz priorizar a
infância", diz Isa de Oliveira, presidente do Fórum do Trabalho Infantil. Para a economista Sônia
Rocha (FGV), a descontinuidade
do Peti "é um desastre total". Boa
parte das crianças que deixou de
receber a bolsa voltou ao trabalho.
Os ministérios da área social
não foram poupados dos cortes
de gastos. A maior vítima foi o
Ministério das Cidades, responsável por programas de saneamento
e infra-estrutura urbana. Perdeu
mais de 85% das verbas destinadas a investimento e custeio de
programas, com impacto direto
em indicadores de pobreza.
O segundo maior alvo de cortes
foi o Ministério do Desenvolvimento Agrário. O ritmo lento da
reforma agrária sob Lula é o argumento usado pelos sem-terra para o aumento das invasões nos
seis primeiros meses do ano.
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