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Veja o que ocorreu com os estudantes que foram às ruas para afastar Collor
Dispersão política marca caras-pintadas
CYNARA MENEZES
DA REPORTAGEM LOCAL
Eram os outros, os inimigos, os
chamados colloridos. Mas quem
entrou para a história com o rosto
pintado por guache, caneta hidrográfica ou batom foram eles. Meninos e meninas, adolescentes, tomaram as ruas com palavras de
ordem bem-humoradas e um jeito festivo de protestar nunca visto, antes ou após o impeachment.
Olhando para trás, pode-se dizer que o movimento dos caras-pintadas tinha consistência política? Mesmo quem participou, embora tome para si a façanha de ter
derrubado um presidente, admite: se muitos foram por consciência de que o país ia mal, outros se
juntaram porque as passeatas se
tornaram ponto de encontro. E
parecer politizado era tudo.
Cecília Lotufo tinha 17 anos
quando participou da primeira
grande manifestação contra o governo Collor, em 11 de agosto de
1992, em São Paulo. Com a palavra "Fora" escrita na testa, sua foto apareceria estampada na primeira página dos jornais no dia
seguinte. Logo se tornaria a "musa teen" do impeachment.
"Havia, sim, muitos que iam
por modismo", acredita Cecília.
"Mas você chegava na passeata e
sentia uma energia muito forte,
porque era algo que vinha da base, não da estrutura do movimento estudantil. O papel da UNE
(União Nacional dos Estudantes)
foi mais organizacional."
Hoje, aos 27, após curta passagem pelo PT, Cecília atua numa
ONG que criou, a Kairós, ligada à
educação ambiental. "Descobri
que sou uma pessoa que gosta de
política, mas não do meio da política. Apesar de votar no Lula, sinto falta do que o partido era no começo. Era mais puro", critica.
Se Cecília era a musa, o "muso"
era o então presidente da UNE,
Lindberg Farias, então com 22
anos, chamado "Lindo-berg" em
coro nas passeatas pelas meninas.
Uma terceira musa também chamava a atenção, na TV: a atriz
Cláudia Abreu, a guerrilheira Heloísa da minissérie "Anos Rebeldes", de Gilberto Braga, na Globo.
Ninguém duvida que o sucesso
da minissérie foi uma influência
decisiva, assumida pelos próprios
líderes do movimento. "Nós soubemos utilizar a minissérie. Tanto
que o cartaz feito pela UNE para a
primeira manifestação dizia:
"Anos Rebeldes, Próximo Capítulo: Fora Collor'", conta Farias.
A música de abertura da ficção,
"Alegria, Alegria", de Caetano
Veloso, virou trilha sonora das
passeatas. O ex-presidente da
UNE diz que o secretário de governo de Collor, Jorge Bornhausen, teria chegado a comentar que
a minissérie tinha sido "um tiro
no pé" dado pelas Organizações
Globo. Bornhausen nega que tenha dito a frase.
O grande aliciador para os novos rebeldes seria uma certa glamurização da ficção televisiva às
manifestações. "É como se nós
quiséssemos copiar essa geração
anterior à nossa, que lutou muito
mais", diz Roberto Vinícius Zogbi, 27. Personal trainer e sócio de
academia em São Paulo, Zogbi diz
que o movimento não teve o papel de conscientizar sua geração.
"Eu mesmo só fui pensar nos problemas sociais do Brasil na faculdade, nas aulas de sociologia."
As manifestações pró-impeachment se tornariam uma opção de
programa. "Nas últimas, virou
moda. Quem não fosse, estava
por fora", reconhece um dos
coordenadores da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas à
época, Antonio Parente, 34, hoje
vereador pelo PMDB em Cuiabá.
O estudante de administração
Rafael Cytrynowicz, 24, foi um
desses que foram pela farra: "E
também para tirar um pouco da
culpa que tinha, porque em 89 eu
era Collor roxo". Rafael é o exemplo dos que defendem que os caras-pintadas não deixaram marcas sobre essa geração: nunca militou num partido e confessa não
ter nenhuma atuação social.
"Quem ficou marcado pelo movimento foram as lideranças, não
os jovens que participaram", avalia José Luis Sanfelice, autor do livro "Militância Estudantil" (Cortez) e professor da Unicamp.
"Os caras-pintadas não tiveram
uma importância decisiva. Era
uma coisa da rapaziada de classe
média e o Collor teria sido afastado mesmo sem eles", diz o professor de Ciência Política da UFMG
Fábio Wanderley Reis.
Difícil é um movimento desses
ocorrer novamente. "Foi a última
aventura coletiva da sociedade
brasileira", diz o jornalista Sérgio
Sá Leitão, que lança agora, com
Barbara Axt, o livro "Fora Collor:
A Incrível Aventura da Geração
Que Derrubou Um Presidente".
Mas o próximo presidente, ainda que seja Lula, que se cuide:
candidato à Câmara, desta vez pelo PT, Farias já planeja levar os
funcionários públicos às ruas no
primeiro ano de governo para
exigir recomposição salarial.
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