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Cúpula ambiental só vai reafirmar compromissos de outras reuniões; chefes de Estado começam a chegar
Johannesburgo recicla metas da Eco-92
Moacyr Lopes Junior/Folha Imagem
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Manifestantes sem terra do movimento LPM marcham no bairro de Alexandra, Johannesburgo |
CLAUDIO ANGELO
ELIANE CANTANHÊDE
ENVIADOS ESPECIAIS A JOHANNESBURGO
Quando o presidente Fernando
Henrique Cardoso e outros 103
chefes de Estado se juntarem
amanhã em Johannesburgo para
bater o martelo sobre o futuro do
planeta, na Rio +10, eles provavelmente não terão muito a resolver.
A maior parte das recomendações acordadas no texto principal
da Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável é reprise
de negociações anteriores.
Os principais pontos sobre os
quais houve "avanço" na rodada
técnica de discussões da cúpula,
iniciada na última segunda-feira,
remetem a três conferências prévias da ONU: a Eco-92, que consagrou o conceito de desenvolvimento sustentável, a cúpula sobre
financiamento ao desenvolvimento de Monterrey, México, no
início de 2002, e a rodada ministerial da OMC (Organização Mundial do Comércio) realizada em
Doha, Qatar, em 2001.
Recuo em compromissos
Antes do começo da Rio +10, os
países ricos, liderados pelos EUA,
queriam a todo custo recuar em
compromissos assinados na Eco-92. Os principais pontos ameaçados de retrocesso eram o das responsabilidades comuns, mas diferenciadas -princípio segundo
o qual a culpa e a conta da poluição são majoritariamente dos países ricos-, e o da destinação de
0,7% do PIB dos países ricos para
o desenvolvimento dos pobres.
Dez anos depois, a realidade
mudou. Os EUA, apesar do crescimento econômico de uma década, não cumpriram a meta de ajuda externa. O total destinado pelos ricos para os pobres, na verdade, caiu em relação a 1992 -de
0,36% para 0,22% do PIB.
De forma análoga, países como
Índia, China e Brasil cresceram e
passaram a consumir mais recursos naturais. Razão suficiente, segundo os países ricos, para que
passem a pagar mais pela conservação e pela mitigação de danos
ambientais do que prevê o princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas
Os EUA vieram a Johannesburgo dispostos a não adotar metas,
nem a fixar datas. Países como o
Brasil vieram dispostos a não deixar que os princípios do Rio de Janeiro virassem letra morta. Ambos ganharam.
A solução de compromisso se
choca com tudo o que as ONGs
temiam: elas preferiam um fracasso retumbante a um acordo
fraco, mas é isso que devem obter.
Dos 64 mil participantes da Rio
+10, pelo menos 200 compõem a
delegação brasileira, aí incluídos
diplomatas, a equipe do Ministério do Meio Ambiente, 22 empresários ligados principalmente à
Confederação Nacional da Indústria e ONGs de todas as cores.
Tal multidão se movimenta
com pressa pelos cinco andares
do Sandton Centre, no subúrbio
de Sandton, o mais chique de Johannesburgo. Essa metrópole da
África do Sul surpreende pela
modernidade de determinadas
zonas, para onde a população
abastada literalmente fugiu da
violência, abandonando o centro.
A cidade na qual FHC desembarca hoje está bem policiada. As
poucas manifestações que aconteceram na primeira semana da
Rio +10 foram restritas e bem-humoradas -além de autorizadas
pelo governo, como manda a lei
sul-africana. Um acordo entre
movimentos sociais e autoridades
impediu uma passeata que fecharia o acesso dos líderes mundiais
ao Sandton Centre.
O principal problema, mesmo
em Sandton, é transporte. Os taxistas e motoristas de ônibus improvisados simplesmente não conhecem ruas e avenidas. Constrangidos, explicam: "Não somos
daqui. Fomos chamados para a
conferência".
Discórdia
Até sexta-feira à noite, havia impasse em pelo menos 14 pontos
centrais do chamado plano de
ação, que definirá as diretrizes
-que todos aqui chamam de
"guidelines"- para os países e o
planeta nos próximos anos.
Esse plano de ação será anunciado com o documento final político da Rio +10, na quarta-feira.
E, como disse à Folha o embaixador do Brasil na ONU, Gelson
Fonseca, 14 itens indefinidos depois de cinco dias de debate não
são pouca coisa. "Isso representa
praticamente toda a conferência."
Os itens que estrangulam a conferência são: os princípios do Rio,
a governança, direitos humanos,
saneamento, energia, comércio e
finanças, biodiversidade, bens
públicos, globalização, dívida social, parcerias, o fundo de solidariedade proposto para os países
mais pobres e a questão da mudança climática. Há, ainda, o plano de trabalho de dez anos para
implementar a Agenda 21 -carta
de intenções produzida pela Eco-92 para a conquista do desenvolvimento sustentável.
Para o Brasil, energia e biodiversidade são pontos de honra. O
país propôs a adoção de uma meta de 10% de energias renováveis
pelos países até 2010.
A proposta recebeu alguns
apoios e diversas resistências dentro do G-77, grupo das nações
subdesenvolvidas. Reunidos ontem no Sandton Centre, representantes dos países da América Latina e Caribe (são 33 no total) oficializaram o apoio conjunto à
contribuição brasileira.
A União Européia apresentou
uma proposta similar, de 15% de
meta, mas que inclui na definição
de "renováveis" grandes hidrelétricas (consideradas de alto impacto ambiental) e qualquer tipo
de biomassa (turfa, bagaço de cana, lenha etc.).
No item biodiversidade, o Brasil, país com o maior número de
espécies do mundo, assumiu sua
posição de vidraça: só aceitou discutir metas para reduzir as extinções nos próximos dez anos
quando as nações detentoras da
tecnologia de exploração da fauna
e da flora aceitarem repartir com
o Terceiro Mundo os benefícios
econômicos obtidos.
De novo, um retorno à Eco-92.
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