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DESASTRE EM ALCÂNTARA
Programas de autonomia tecnológica herdados do regime militar de 1964-85 não recebem verbas suficientes nem são cancelados
Projetos militares continuam precários
RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL
O VLS é apenas um entre vários
megaprojetos tecnológicos das
Forças Armadas que sobrevivem
precariamente com verbas limitadas. Outro bom exemplo é o submarino nuclear em lentíssimo desenvolvimento pela Marinha.
São heranças do regime militar
(1964 a 1985) que foram sendo
empurradas com a barriga pelos
governos posteriores que não tiveram condições políticas de cancelá-las, com exceção da mais perigosa -o sonho de alguns militares de fazer a bomba atômica.
A história mais bem-sucedida
foi a da construção aeronáutica.
Ela surgiu por iniciativa da FAB,
mas a estatal Embraer quase faliu.
Privatizada, hoje é um sucesso
mundial de vendas.
Sem verbas para comprar os
novos veículos blindados que a
empresa privada Engesa construía, como o moderníssimo carro de combate (tanque) Osório, o
Exército não teve como continuar
apoiando a indústria, e essa empresa faliu.
A construção naval também sofre. Uma corveta e um submarino
ainda estão em lenta construção
hoje, quando outros navios semelhantes foram construídos antes
em bem menos tempo.
Volta e meia as forças armadas
liberam recrutas parte do dia por
falta do que acompanhar o arroz
com feijão. E ao mesmo tempo
elas tentam acompanhar o frenético ritmo de desenvolvimento da
tecnologia bélica.
Como resultado da falta de verba, não conseguem nem alimentar os recrutas, nem desenvolver a
tecnologia até o ponto de torná-la
operacional.
Uma das fontes do problema é a
excessiva autonomia das três forças, concordam os analistas.
Durante um recente encontro
no Rio em que militares da FAB e
da Marinha discutiam as operações ligadas à Guerra da Lagosta
-o conflito pesqueiro com a
França em 1963-, concluiu-se
que aviadores e marinheiros fizeram suas patrulhas sem a menor
coordenação entre si.
As três Forças Armadas são historicamente "estanques", foi a
conclusão dos presentes. Essa independência continua até hoje,
apesar da criação de um Ministério da Defesa que deveria contribuir para integrá-las.
Isso significou que Exército,
Marinha e Força Aérea iniciaram
seus principais projetos ignorando as prioridades das outras forças. Durante a fase inicial, ainda
no regime militar, a verba permitiu a criação de equipes e o início
dos projetos.
Mas, quando os investimentos
teriam de ser aumentados para os
projetos deslancharem, eles secaram. Simplesmente não houve
verba para tudo, e nenhuma força
queria desistir dos seus.
Os vôos dos VLS deveriam ter
acontecido na primeira metade
da década de 90 -o primeiro satélite brasileiro, que ele deveria ter
lançado, foi ao espaço em 1993 em
um veículo americano. O primeiro vôo, fracassado, acabou sendo
apenas em 1997.
Previa-se que na primeira década do século 21 um submarino
nuclear estaria sendo incorporado à esquadra. Faz anos que não
se fala mais em datas como 2010
ou 2015. No ritmo atual e com as
verbas de hoje, o submarino é coisa para 2030, se tanto.
Megaprojetos tecnológicos
criam uma dinâmica própria e se
tornam difíceis de serem cancelados, mesmo revelando problemas
graves, e não só no Brasil.
Um dos melhores exemplos foi
o desenvolvimento em Israel de
um moderno caça supersônico, o
Lavi. Era um avião tecnicamente
magnífico, mas caro demais.
Contrariando o desejo da Força
Aérea, o governo israelense cancelou o projeto e optou por comprar mais caças F-16 dos EUA.
Mesmo nos EUA o Departamento de Defesa precisa decidir
sobre o cancelamento de projetos
e contrariar as Forças Armadas.
Foi o caso, recente, do canhão autopropulsado Crusader, que o
Exército queria com paixão.
Um dia, um ministro da Defesa
brasileiro vai ter de decidir se cancela ou concede verbas. Ou se
continua empurrando com a barriga projetos eternos.
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