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ARTIGO
Aids e hepatite C
DAVID EVERSON UIP
ESPECIAL PARA A FOLHA
O programa brasileiro para tratamento de pacientes com Aids é
um dos melhores do mundo. É reconhecido e testado como eficaz e
exitoso.
Consiste em disponibilizar, pela
Coordenação Nacional de DST/
Aids, 15 medicamentos para terapia anti-retroviral a adultos,
crianças, gestantes que apresentem indicações clínico-laboratoriais pré-estabelecidas pelos consensos de especialistas que compõem os comitês-assessores para
tratamento, de acordo com critérios técnico-científicos constantemente atualizados.
Dados oficiais, que avaliaram o
custo-benefício do programa,
mostram resultados impressionantes, tais como queda de 50%
na taxa de mortalidade por Aids
no país e economia de US$ 667
milhões, resultado da redução de
80% das internações hospitalares
decorrentes de doenças oportunistas que foram evitadas.
O acesso universal e gratuito aos
medicamentos anti-retrovirais,
garantido pela lei nš 9.313/96, de
iniciativa do senador José Sarney,
é motivo de orgulho para nós brasileiros, que temos esse programa
elogiado e imitado por países desenvolvidos e mais ricos.
Outro grande desafio de saúde
pública surgiu quando, a partir de
1989, foi descoberto o vírus da hepatite C e os testes-diagnósticos
evidenciaram a extensão do perigo e a gravidade do problema.
O vírus C é o mais comum agente etiológico, responsável pela
doença crônica, cirrose e câncer
de fígado em todo o mundo.
Nos EUA, são estimados 3,9 milhões de indivíduos com a presença de anticorpos e 2,7 milhões
com o vírus detectável no sangue.
No Brasil, os números devem ser
semelhantes e de cinco a dez vezes
maiores que os da Aids.
Fatores de risco frequentes na
transmissão do vírus são o uso de
drogas ilícitas por via venosa,
transfusão de sangue e derivados,
transplante de órgãos, acidentes
perfurocortantes, hemodiálise e
perinatal.
O grande avanço no tratamento
das hepatites crônicas, causadas
pelo vírus do tipo C, deveu-se ao
reconhecimento da importância
da associação interferon e ribavirina. Atualmente, quando é identificado o genótipo 1, prescreve-se, com sucesso, o interferon peguilado.
A co-infecção Aids e hepatite C,
cada vez mais frequente, agrava o
prognóstico dos pacientes, em face das dificuldades terapêuticas.
À semelhança do que acontece
com a Aids, o diagnóstico, o tratamento, o monitoramento e a prevenção da hepatite C necessitam
de consideráveis recursos financeiros.
A hepatite C é considerada, hoje, uma doença potencialmente
curável, com índice de resposta
sustentada superior a 60%. Não
adotada a terapêutica adequada,
até mesmo por falta de acesso aos
medicamentos, de alto custo, só
recentemente disponibilizados
pelo SUS, e sendo doença de evolução lenta e silenciosa, a derradeira opção de tratamento é o
transplante de fígado, cada vez
mais bem-sucedido em nosso
meio, mas muito mais oneroso
aos cofres públicos.
Diante da extrema gravidade do
problema, é necessária uma conjugação de esforços para viabilizar recursos, melhor racionalizá-los, distribuir medicamentos para
as duas doenças, tendo como parâmetro os centros integrados de
referência, treinamento e tratamento da Aids/DST/hepatites.
Os clínicos, gastroenterologistas, hepatologistas e infectologistas devem caminhar juntos, porque, desgraçadamente, há doentes e trabalho para todos.
Com uma determinação forte e
adoção de uma política de saúde
integrada podemos ter os mesmos êxitos do programa da Aids.
David Everson Uip é professor livre-docente da USP, professor titular da Faculdade de Medicina do ABC, diretor da Casa da Aids (Departamento de Doenças
Infecciosas e Parasitárias Fundação Zerbini) e diretor do Núcleo de Infectologia
do Incor/HC-USP
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