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AMBIENTE
Produto degrada em um ano e pode ser usado em embalagens e na medicina
Bagaço vira plástico biodegradável
MARIANA VIVEIROS
DA REPORTAGEM LOCAL
Objetos de plástico que demoram apenas um ano -e não dois
séculos- para se degradar e podem virar adubo orgânico. Resinas que não dependem do petróleo, tampouco de processos de
produção que eliminam gases que
agravam o efeito estufa. Polímeros (aglomerado de moléculas)
que, na sua fabricação, dão um
destino adequado para os cerca
de 8 milhões de toneladas de bagaço de cana que sobram da co-geração de energia nas usinas.
Reunindo esses três benefícios
ambientais, o plástico biodegradável mais parece um sonho saído da ficção científica. E, a rigor,
ainda é. Mas vem se tornando realidade à medida que pesquisas
científicas desenvolvem matérias-primas e processos que produzem polímeros de qualidade e
que, ao menos no mercado externo, já têm um preço competitivo.
A mais recente descoberta nessa
área é de autoria das pesquisadoras Luiziana Ferreira da Silva e
Marilda Keico Taciro, da divisão
de química do Agrupamento de
Biotecnologia do IPT (Instituto de
Pesquisas Tecnológicas).
Elas desenvolveram uma técnica que usa bagaço de cana para fazer plástico biodegradável por
meio da ação de bactérias que se
alimentam do bagaço e formam,
dentro de si, o PHB (polihidroxibutirato), que pode ser usado na
fabricação de vasos, colheres e sacolas plásticas, entre outros.
A bactéria Burkholderia sacchari, que transforma o que ia para o
lixo em algo que pode ir para as
prateleiras dos supermercados,
foi descoberta pelo próprio IPT e
já está "trabalhando", desde 2000,
na fabricação de PHB diretamente a partir do açúcar, numa usina
em Serrana (315 km de SP).
É lá que a ficção científica busca
se tornar parte do cotidiano. A
planta piloto (que já custou o
equivalente a R$ 28,7 milhões em
investimentos aos grupos sucroalcooleiros Biagi e Balbo) produz de 50 a 60 toneladas por ano
do PHB, que é exportado para o
Japão, os EUA e a Europa.
Por sua vez, o novo processo,
usando o bagaço, ainda não foi
aplicado comercialmente.
A resina biodegradável custa
quatro vezes mais que a normal,
mas há dois pontos a destacar,
sustentam Silva e Taciro: a escala
ainda é muito reduzida e ninguém consegue produzi-la mais
barata que o Brasil. "O quilo do
PHB de açúcar (ou do bagaço da
cana) custa US$ 5. O equivalente
na Inglaterra custa US$ 14. Por isso há mercado lá fora", diz Silva.
A competitividade do preço
aliada à maior consciência dos
consumidores e ao maior nível de
exigência da legislação ambiental
em alguns países desenvolvidos
animam a PHB Industrial de Serrana a tentar produzir em escala
comercial a partir de 2005.
"Não temos [no Brasil] a pretensão de competir com a grande
indústria de plástico. Vamos buscar nichos. Por exemplo, empresas de cosméticos que privilegiem
uma imagem ambientalmente
correta", afirma Sylvio Ortega Filho, responsável pelo projeto.
Notebooks, talheres, pílulas
As pesquisas em torno do plástico biodegradável começaram nos
anos 80 em todo o mundo. Vêm
sendo testados os usos de beterraba, ácido láctico, milho e proteína
da soja; algumas aplicações já começam a sair dos laboratórios.
Na prática, as resinas já são usadas em sacolas que podem virar
adubo naturalmente e talheres
descartáveis (produzidos pela
empresa californiana Biocorp) e
até em peças de notebooks da Fujitsu japonesa. Os estudos apontam ainda possibilidades de uso
na medicina, por exemplo, em suturas internas e cápsulas para liberação gradual de medicamento.
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