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POLUIÇÃO NUTRITIVA
Últimos pescadores da represa dizem que a redução do esgoto provocou escassez de peixes
Água mais limpa "mata" pesca na Billings
AMARÍLIS LAGE
DA REPORTAGEM LOCAL
O dia nem raiou quando Antônio Lopes, 73, veste a touca, o
agasalho, calça as botas de borracha e sobe no barco para mais
um dia de pesca. O vira-lata Talti
pula no barco e os dois partem.
Aos poucos, o sol vai clareando o
vasto espelho d"água e a mata ao
redor. Ele desarma a rede. Se for
um dia de sorte, conseguirá uns
5 kg. Muitas vezes, porém, a rede
sobe vazia: os peixes da represa
Billings estão sumindo.
O fenômeno já provocou uma
mudança socioeconômica na região. Há 10 anos, quando a cada
dia eram pescadas 25 toneladas
de tilápias, lambaris, carpas e
outros, mais de 500 pescadores
viviam ao redor da Billings. Cerca de 50 se concentravam em
uma vila, em São Bernardo do
Campo (Grande São Paulo).
Hoje, essa última vila de pescadores da Grande São Paulo tem
menos de 10 integrantes, entre
os quais Antônio Lopes -ou
seu Antônio, como é conhecido.
A comunidade tem uma explicação inusitada para o sumiço
dos peixes: isso ocorreu, segundo eles, porque a represa está
mais limpa. Em 1993, a água do
rio Pinheiros parou de ser bombeada para a Billings, o que diminuiu o volume de esgoto despejado. Isso também significou,
porém, a redução na quantidade
de nutrientes para os peixes.
"Claro que a gente não quer
que suje de novo. Mas a quantidade de peixe diminuiu", afirma
Maria Lúcia da Silva, 50, que
mora na vila há 20 anos.
A percepção popular está correta, de acordo com Carlos Bocuhy, coordenador da Campanha Billings, Eu Te Quero Viva.
Não há estudos científicos que
comprovem a relação entre a diminuição dos peixes e a melhor
qualidade da água na Billings.
Mas, segundo o ambientalista, é
possível concluir que isso esteja
ocorrendo, pois a a concentração de esgoto só mata os peixes
ao provocar a eutroficação
-proliferação de algas e outros
organismos que "roubam" o
oxigênio da água.
Antes de chegar a esse ponto,
porém, o esgoto constitui um
"banquete" para os cardumes.
Para Bocuhy, a alta oferta de
peixes no local representava um
desequilíbrio ecológico. "A mudança pode ser qualificada como
uma retomada do equilíbrio",
diz o ambientalista.
O ideal, segundo Bocuhy, seria
repovoar a represa com espécies
adequadas à quantidade e à qualidade de nutrientes disponíveis.
"Falta uma política pública para
desenvolver na represa sua grande vocação, que são atividades
de lazer e pesca. Essa seria a
grande saída para garantir a preservação da Billings", afirma.
Um projeto nesse sentido está
sendo desenvolvido atualmente
pela Prefeitura de São Bernardo.
De acordo com Sônia Lima, diretora de meio ambiente da prefeitura, o projeto consiste na retomada da atividade pesqueira
por meio de tanques-rede, para
uma produção em grande escala
e com controle de qualidade.
Não raro, ao recolher a rede
vazia, seu Antônio pensa em desistir e ir morar com um dos filhos em Guaianazes (zona leste
de São Paulo). Mas, por enquanto, adia a partida. "Não quero ficar sentado na beira de uma rua.
Quero ficar na beira d'água."
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