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Lei seca ignora prevenção, diz advogado
Bernardes Jr., da OAB-SP, critica governo por permitir propaganda de cerveja no rádio e na TV em qualquer horário
"Você pune o sujeito que toma meia lata e dirige, mas ele é bombardeado logo de manhã com anúncios dessa cerveja na TV", ele afirma
RICARDO WESTIN
DA REPORTAGEM LOCAL
Ao criar a lei seca, o governo
se preocupou mais com a punição de quem dirige alcoolizado
do que com a prevenção, afirma
o advogado Francisco de Paula
Bernardes Jr., da comissão de
direito criminal da OAB-SP
(seccional São Paulo da Ordem
dos Advogados do Brasil).
Para ele, é contraditório que
o governo adote valores diferentes para definir o que é bebida alcoólica. Pela lei seca, basta
ter 0,5 grau Gay-Lussac. Pela
lei que restringe a publicidade
no rádio e na TV à madrugada e
ao fim da noite, a concentração
alcoólica deve ser de ao menos
13 graus. Enquanto o uísque
tem restrições, a cerveja é livre.
"Você pune o sujeito que toma
meia lata e dirige, mas ele é
bombardeado logo de manhã
com anúncios dessa cerveja na
TV", diz o advogado.
Em janeiro, a Presidência levou ao Congresso, com regime
de urgência, um projeto que teria evitado a contradição, baixando o teor alcoólico para fins
de publicidade a 0,5 grau. Em
maio, o governo retirou a urgência -deputados acusaram o
lobby das empresas de cerveja e
publicidade. O texto agora pode
levar anos para ser votado.
FOLHA - As bebidas alcoólicas têm
mais de uma definição legal...
FRANCISCO DE PAULA BERNARDES JR. -
A nova lei seca estipula como
bebida a que tem pelo menos
0,5 grau Gay-Lussac. O motorista que dirige com uma concentração mínima de álcool no
sangue comete uma infração
gravíssima, paga multa, perde a
carteira e tem o carro apreendido. Se a quantidade de álcool
for um pouco mais alta, ele pode ser preso em flagrante e responder a inquérito e até a uma
ação penal. Ao mesmo tempo, a
lei que restringe a propaganda
de álcool define como bebida a
que tem ao menos 13 graus. Até
13 graus, a publicidade é liberada em qualquer horário. A legislação não é tão rigorosa com
a propaganda como é com o
motorista. É uma contradição.
FOLHA - Então o motorista está em
desvantagem?
BERNARDES JR. - Está, porque
não é educado nem orientado.
É apenas punido. Você pune o
sujeito que toma meia lata, mas
ele começa a ser bombardeado
logo de manhã com anúncios
dessa cerveja na TV. A lei da publicidade só restringe a propaganda da bebida com mais de 13
graus Gay-Lussac [permitida
das 21h às 6h]. É contraditório
você ter uma lei de trânsito que
proíbe o sujeito de dirigir tendo
uma quantidade pequena de
cerveja no sangue e uma lei de
publicidade que só restringe a
bebida mais forte.
FOLHA - Qual seria a solução?
BERNARDES JR. - Temos de adequar a lei da publicidade. O
mais coerente é que os anúncios de cerveja mencionem que
a ingestão dessa latinha torna o
motorista um infrator. Mas a
mudança da lei teria de passar
por ampla discussão. Já que a
política é diminuir os acidentes
de trânsito, que a prioridade seja a prevenção. A lei seca tem tido efeito positivo. Mas conhecemos o Brasil, as coisas são
momentâneas. A lei deve cair
no esquecimento, e a fiscalização deve ser relaxada. A prevenção é algo de médio e de longo prazo e, por isso, mais eficaz.
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