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SAÚDE
Representantes brasileiros comemoram participação em encontro internacional e oferecem know-how a países pobres
Brasil foi destaque de conferência de Aids
AURELIANO BIANCARELLI
ENVIADO ESPECIAL A BARCELONA
O Brasil deixa a 14ª Conferência
Internacional de Aids de Barcelona, encerrada na sexta-feira, com
a sensação de que "ganhou todas". Não havia taça em disputa,
nem gritos de "penta", mas em todos os sete dias do encontro realizado na Espanha houve trabalhos, apresentações e entrevistas
de imprensa colocando o país no
centro do cenário.
"Foi a conferência do Brasil",
resumiu Paulo Teixeira, coordenador do Programa Nacional de
Aids, fazendo um balanço da semana de trabalhos.
Já no domingo passado, durante a abertura do encontro, o representante das Nações Unidas citou
o programa brasileiro de troca de
seringas como modelo a ser seguido pelos países cuja epidemia
disparou por conta do uso de drogas injetáveis.
A Rússia e as nações da antiga
União Soviética formam a região
onde a Aids cresce mais rapidamente, justamente por causa da
droga. Para comandar as operações nessa área, o programa das
Nações Unidas para a Aids
(Unaids) acaba de indicar o brasileiro Pedro Chequer. Ex-coordenador do Programa Nacional de
Aids, Chequer representava a
Unaids no Cone Sul.
Na terça-feira, o Brasil reuniu a
imprensa internacional para
anunciar um programa de cooperação para dez países. Está oferecendo US$ 1 milhão ao ano em
medicamentos, além de assistência técnica, para que esses países
produzam genéricos para combater a Aids. Em várias apresentações, a política brasileira de produção de remédios, de enfrentamento com laboratórios para redução dos preços, e a disputa com
os Estados Unidos na questão das
patentes, foi citada como modelo.
O jornal catalão "El Periódico"
de Barcelona dedicou sua manchete de sexta-feira às propostas
brasileiras. "Brasil propõe rebelião contra os laboratórios",
anunciou. Sob a foto do ex-presidente norte-americano Bill Clinton, que participou do encerramento da conferência, uma submanchete afirmava que ele "apóia
os países pobres na redução dos
preços dos medicamentos". Nas
duas palestras que fez, Clinton sugeriu às nações que procurem o
Brasil caso os laboratórios não reduzam seus preços.
Na última quinta-feira, depois
de participarem da gravação de
um programa especial para a
MTV, Clinton e Teixeira conversaram durante 15 minutos. "Clinton me perguntou se uma mudança de governo poderia trazer
problemas para o programa de
Aids", disse Teixeira. "Respondi
que o programa tem 20 anos e que
a sociedade não permitirá nem
mudanças nem atrasos."
Os dois conversaram sobre a
importância que a produção de
genéricos da Aids, "iniciada pelo
Brasil", tinha no combate à epidemia. E na necessidade de participação dos países ricos na formação do Fundo Global para a Aids.
Segundo Teixeira, também a
criação desse fundo se deve em
grande parte ao empenho brasileiro nos últimos anos.
Nas entrevistas e nos discursos,
eram citados os 30 projetos de
apoio a países pobres que o Brasil
desenvolve. Numa parceria com o
grupo Médicos Sem Fronteiras, o
governo brasileiro passou a doar
medicamentos fabricados pelo
Far-Manguinhos, laboratório do
Ministério da Saúde, para 70
doentes sul-africanos. A recuperação desses pacientes foi tão expressiva que provocou críticas de
autoridades da África do Sul, já
que centenas de outros pacientes
passaram a pedir remédios.
Nos debates sobre ética em pesquisa, o jornal da conferência deu
destaque à apresentação do professor Dirceu Greco, da Universidade Federal de Minas Gerais,
que chamou a atenção para as
tentativas de associações médicas
norte-americanas para mudar a
Declaração de Helsinque. "Querem permitir nas pesquisas o uso
de placebo [droga inócua", mesmo quando já há uma droga sabidamente eficaz, o que significa
risco de morte para o paciente",
diz Greco. "O Brasil e a África do
Sul vêm resistindo."
Entre os sete "jovens cientistas"
premiados na conferência, um
era a brasileira Valéria Oliveira
Cruz, que falou sobre o programa
do país contra a Aids. Nas conclusões de temas do congresso
-epidemiologia, prevenção, e
tratamento- todos citavam o
Brasil. Dos 8.000 trabalhos apresentados na conferência, 800
eram brasileiros. Cerca de 200
países participaram do encontro.
Na plenária final, um dos convidados aplaudidos foi Paulo Teixeira, que se sentiu à vontade -e
no direito- para chamar a atenção dos países pobres para seus
preconceitos e suas políticas que
negligenciam a saúde, e para dar
um "puxão de orelha" nos chamados países ricos.
As cores do Brasil apareceram
até nos protestos. Na quinta-feira,
a manifestação latino-americana
por direito a tratamento tinha entre seus líderes o brasileiro José
Araújo, do Grupo de Incentivo à
Vida, de São Paulo. "Não podemos permitir que o Brasil feche os
olhos para os doentes dos países
vizinhos", afirmou. Ele falou agitando uma bandeira brasileira.
O jornalista Aureliano Biancarelli viajou
a convite do laboratório Abbott
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