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EDUCAÇÃO
Faltam vagas para 46% das crianças e dos jovens em idade escolar em uma das maiores favelas de São Paulo
Governos deixam Paraisópolis sem escola
GABRIELA ATHIAS
DA REPORTAGEM LOCAL
A família de Cláudia dos Santos
Silva, 30, tomou uma decisão incomum para quem mantém quatro filhos com R$ 280 por mês:
gastar 45% da renda familiar com
transporte escolar para assegurar
que duas das crianças estudem.
Antônio Carlos, 8, e Grazieli,11,
da família Santos Silva, e outras
1.700 crianças em idade de cursar
da 1ª à 8ª série da favela de Paraisópolis, zona sul, não conseguiram vaga nas escolas públicas locais. A maioria também não conta
com transporte escolar gratuito.
Grazieli estuda no Brooklin, a
dez quilômetros de casa. Antônio,
no Itaim-Bibi, que fica à mesma
distância. Em Paraisópolis, uma
das maiores favelas de São Paulo,
há 14.000 habitantes entre sete e 18
anos e apenas cinco escolas, com
8.800 vagas, contado o ensino
fundamental (de 1ª à 8ª série) e o
médio (antigo segundo grau).
Natália Amorim, 5, balança a
cabeça para responder que não
está na escola. A mãe dela, Creuza
Gomes, 25, tenta mudar de assunto para distrair, em vão, a garotinha. Natália chora.
As lágrimas têm motivo: seus irmãos Natasha, 7, e William, dez
meses, vão para a escola todos os
dias. Natália fica em casa sem ter
com quem brincar. "Ela não teve
sorte", diz a mãe, fazendo com
que a menina chore ainda mais.
Natália é uma das 3.500 crianças
de quatro a seis anos de Paraisópolis que poderiam estar em creches ou pré-escolas. Mas apenas
700 são assistidas pelas quatro
creches (três das quais são mantidas com dinheiro de empresas).
Esses números todos mostram
que, do total de crianças e jovens
em idade de ir da pré-escola ao
ensino médio (17.500), 46% não
podem estudar no bairro.
A informação sobre a população e os alunos que estudam fora
da comunidade é do Fórum Multientidades de Paraisópolis, que
reúne 16 instituições públicas e
privadas que atuam no local.
O dossiê sobre a falta de vagas
recém elaborado por esse fórum
resume a luta da comunidade,
formada basicamente por operários de origem nordestina, para
que seus filhos estudem.
A situação ficou ainda mais grave neste ano, quando uma parte
do terreno da escola municipal
Paraisópolis 2 (uma das escolas
metálicas construídas emergencialmente no final de 2000) despencou por causa das chuvas e 6
das 11 salas foram interditadas.
Em março de 2001, pouco depois da inauguração do prédio, a
direção da escola enviou um ofício ao Núcleo de Ação Educativa 5
(antiga delegacia municipal de
ensino), solicitando a construção
de um muro de arrimo porque a
erosão provocada pelas chuvas
estava comprometendo a estrutura do prédio. Não adiantou.
Agora, para "compensar" as
classes interditadas, a direção
adotou um sistema de "rodízio"
entre os 1.080 alunos. A cada duas
horas, uma turma entra em classe
para estudar. A medida reduziu a
jornada escolar de quatro horas
para duas horas.
Do ponto de vista de infra-estrutura, o improviso é uma das
marcas das escolas públicas de
Paraisópolis: 40% dos alunos estudam em escolas "emergenciais", feitas de alumínio.
Pelas contas do fórum, seria
preciso construir duas escolas de
1ª à 8ª série para atender as 1.700
crianças de sete a 14 anos, que ou
estão fora da escola ou estudam
fora da comunidade. Para as de
quatro a seis anos, seriam necessárias seis pré-escolas.
Mônica Mation, do fórum, explica que, como a prefeitura e o
Estado não dispõem de um cadastro único de alunos (exceto para a
1ª série do ensino fundamental), é
difícil saber quantos estudam fora
de Paraisópolis e quantos estão
realmente fora da escola.
No entanto, levantamento recente do fórum mostra que há pelo menos 398 alunos de 1ª à 4ª série sem acesso a vaga escolar.
Se a Prefeitura de São Paulo e o
Estado cumprissem a Constituição, pelo menos os pais dos alunos de sete a 14 anos não precisariam lutar por vagas. A lei obriga o
poder público a oferecer o ensino
fundamental a todas as crianças
dessa faixa etária.
Caso a escola esteja localizada a
mais de dois quilômetros da residência, o aluno tem direito a
transporte gratuito.
Em outubro de 2000, o juiz Rodrigo Lobato Junqueira Enout, da
Vara da Infância, determinou que
os dois governos pagassem escola
particular às crianças de Paraisópolis que não tivessem conseguido vaga no bairro. Também determinou a oferta de transporte
escolar para os que morassem a
mais de 2 km da escola.
Após a sentença, a solução encontrada pela prefeitura foi construir mais uma escola emergencial metálica no local, a Paraisópolis 2 -aquela que despencou.
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