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SISTEMA PRISIONAL
Após a destruição parcial de Bangu 1 em motim de presos, governo do Rio tenta eliminar vulnerabilidades
Rebelião derruba mito da segurança máxima
DA SUCURSAL DO RIO
DA REPORTAGEM LOCAL
O governo do Rio promete transformar Bangu 1, onde ficam detidos os principais chefes do tráfico de drogas no Estado, de novo em um presídio de segurança máxima. A reforma iniciada na semana passada, orçada em R$ 714 mil, inclui a instalação de bloqueador de celulares, um parlatório com grade de aço -que será
usado inclusive pelos advogados dos presos-, câmeras blindadas
e novos detectores de metais.
O status de Bangu 1 como penitenciária de "segurança máxima"
foi posto em dúvida pela rebelião
que resultou em quatro mortes de
traficantes rivais do Comando
Vermelho, no dia 11 deste mês, e
pelas gravações do Ministério Público que mostraram presos, como Luiz Fernando da Costa, o
Fernandinho Beira-Mar, fornecedor de drogas para o CV, ainda
comandando seus negócios.
Inaugurado em 1988, com capacidade para 48 detentos em celas
individuais, Bangu 1 foi planejado
para isolar presos que exerciam liderança negativa dentro do sistema penitenciário. Passados 14
anos, simboliza o atual estágio de
poder do crime organizado e a
precariedade das prisões no país.
Conforme resolução da Secretaria da Justiça do Estado, a unidade
deverá funcionar em um regime
especial, parecido com o que existe hoje em três presídios de São
Paulo para tentar conter a influência do PCC (Primeiro Comando da Capital) e de outras
facções criminosas. Um deles, o
CRP (Centro de Reabilitação Prisional) de Presidente Bernardes
(589 km de São Paulo) é o único
do país com bloqueador de celular -hoje, o principal meio de articulação do crime organizado.
Mas regime diferenciado é exceção, não a regra, segundo a lei prisional. Pode ser aplicado apenas
por um período determinado.
""Querem que pessoas como
Fernandinho Beira-Mar, entre
outros, cumpram pena de 30 anos
em presídios desse tipo. Eu até
acho que deveria, mas então o
Congresso precisa aprovar uma
lei nesse sentido", afirma o secretário da Administração Penitenciária de São Paulo, Nagashi Furukawa, 53.
De especialistas ouvidos pela
Folha na Colômbia, país que encarcerou e vigia narcotraficantes
internacionais e guerrilheiros,
vem a principal recomendação
para controlar essas organizações
paralelas: não bastam presídios
de ponta e equipamentos de última geração se os homens que vigiam as cadeias se corrompem.
""Você pode ter os melhores
equipamentos do mundo e, se as
pessoas que cuidam são corruptas, sair pela porta da frente", afirma Gerardo Reyes, repórter para
a América Latina de ""El Nuevo
Herald" e membro da equipe do
jornal ""Miami Herald" que ganhou o prêmio Pulitzer em 99.
História
Quando começou a funcionar,
Bangu 1 tinha um sistema informatizado que permitia o controle
das celas sem que os agentes tivessem contato direto com os presos.
"O presídio foi todo informatizado para que o agente penitenciário não precisasse carregar chaves
e cadeados, como aconteceu no
dia da rebelião. A impressão que
eu tenho é que esse sistema enguiçou e ninguém consertou", afirma Oswaldo Deleuze, diretor do
Desipe (Departamento do Sistema Penitenciário) na época da
inauguração da unidade.
Na última rebelião do CV, agentes prisionais rendidos pelos presos entregaram cópias das chaves
das celas, o que facilitou o assassinato de quatro traficantes rivais.
O presença das chaves lá dentro
está sendo investigada pela polícia do Rio.
Outro erro apontado pelo ex-diretor é a tolerância com a apropriação do local pelos presos. "As
imagens da televisão depois da rebelião mostram as celas pintadas,
com cartazes dos presos", diz Deleuze. Para ele, detalhes como esse
acabam diminuindo a autoridade
do poder público.
Marcelo Freixo, presidente do
Conselho da Comunidade (que
fiscaliza e participa da administração do sistema penitenciário),
critica o uso do local como opção
de confinamento permanente.
"Bangu 1 foi criado como um
presídio para castigo. Há um descumprimento da lei, pois não
existem, por exemplo, atividades
de trabalho ou espaço físico adequado para o confinamento. O local virou uma prisão de ociosidade máxima, uma fábrica de loucos", afirma Freixo.
O governador do Estado no ano
da construção de Bangu 1, Moreira Franco (PMDB), discorda de
Freixo e diz que a prisão não foi
pensada como um local de castigo, mas como um local com procedimentos mais rigorosos para
isolar criminosos.
"A diferença era que o presídio
tinha procedimentos diferentes
de outros de segurança máxima.
Lembro-me de ter tido problemas
com a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) na época, porque
proibi a entrada de advogados
que não tivessem clientes presos",
diz o ex-governador.
Todos concordam, no entanto,
que uma das principais falhas de
Bangu 1 é a deterioração dos equipamentos de segurança. "Havia
uma deterioração absurda dos
detectores de metais, por exemplo. Além disso, as condições de
trabalho são muito negativas. Os
alojamentos dos agentes penitenciários chegam a ser piores do que
as celas dos presos", diz Freixo.
Reconstrução
A reforma iniciada na semana
passada pelo Desipe para recuperar os equipamentos de segurança ainda não tem prazo para acabar. O novo diretor do órgão, o
major da PM Hugo Freire, afirma
que ela será capaz de tornar Bangu 1, novamente, uma penitenciária de segurança máxima.
Para lá serão devolvidos Beira-Mar e os outros 24 presos transferidos depois da rebelião do dia 11.
O traficante Elias Pereira da Silva, o Elias Maluco, apontado pela
polícia como responsável pela
morte do jornalista Tim Lopes, da
Rede Globo, também deve ficar
em Bangu 1, ao final da reforma.
No lugar dos agentes penitenciários do Desipe, afastados da
unidade, 50 policiais militares serão recrutados em turmas recém-formadas, segundo anúncio do
governo do Rio da última sexta.
A administração do lugar passou do controle da Secretaria da
Justiça, que cuida dos presídios
fluminenses, para a Secretaria da
Segurança após a crise deflagrada
pela rebelião liderada pelo traficante Beira-Mar.
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