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Especialistas criticam política prisional
AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL
Ao aplicar um "remédio amargo demais" para todos os presos,
o Estado está "incentivando a violência em indivíduos não necessariamente violentos". Ao construir
presídios grandes com 500 vagas
ou mais -"que logo estarão superlotados"-, o governo "está
fechando um Carandiru e abrindo 20". E, ao ignorar as famílias
dos presos -só no Estado de São
Paulo, são cerca de 107 mil-, deixando-as expostas à humilhação e
ao descaso, o Estado está "criando
um caldo de violência e ódio" do
lado de fora das prisões.
As críticas são de instituições e
especialistas em direitos humanos e se referem à política de endurecimento adotada pelo governo diante das ações do crime organizado. Para eles, o poder paralelo instalado pelas organizações
criminosas foi uma reação à violência do sistema prisional e ao
vazio deixado pelo Estado.
"Os grupos surgiram pela ausência de compromisso do Estado
e pelo descaso do Judiciário para
com os presos pobres", diz padre
Valdir João Silveira, coordenador
da Pastoral Carcerária da Arquidiocese de São Paulo.
Por um período, o domínio das
facções reduziu as mortes e a violência dentro das celas, mas fez
crescer os sequestros, os assaltos e
o tráfico nas ruas, como forma de
financiar as fugas.
Com funcionários despreparados e mal pagos, a corrupção passou a ser o meio de fuga mais empregado. "O Estado e a sociedade
tratam o agente penitenciário como trata o preso", diz Silveira.
No entanto, o "funcionário é peça-chave" na ordem dos presídios
e na ressocialização do preso, diz
Hélio Bicudo, vice-prefeito de São
Paulo e presidente do Centro Santo Dias de Direitos Humanos.
Na prática, a Lei de Execuções
Penais, de 1984, considerada moderna e civilizada, está cada vez
mais distante de ser aplicada. Pela
lei, a função da prisão não é a punição, mas a "ressocialização das
pessoas condenadas", que devem
ter seus direitos protegidos.
"O preso não tem escola nem
trabalho, alguns têm ocupação,
costuram bola para evitar que façam túneis", diz Bicudo.
Para ele, em vez de "ir à raiz, oferecendo condições ao preso de se
educar e se recuperar, o governo
toma medidas de curto prazo que
se caracterizam pela violência".
"O preso é tratado como um animal, come como um animal. Ao
construir grandes presídios, afastando o preso de sua família, o Estado está criando 20 outros Carandirus."
Apenas uma parte desse universo de 170 mil presos do país exigiria tratamento especial, dizem as entidades de direitos humanos.
"Elias Maluco e Fernandinho Beira-Mar, que precisam ser tratados
com extremo rigor, não representam a média dos presos", diz o sociólogo Sérgio Adorno, coordenador do Núcleo de Estudos da Violência da USP. "Não dá para tratar todos com o mesmo remédio amargo. Um sistema que reforça a
violência vai socializar o preso para ser delinquente. Hoje, quase
metade dos presos que saem da prisão acaba voltando ao crime."
Do lado de fora, o Estado estaria esquecendo a família do preso, referência fundamental na sua recuperação. Padre Silveira calcula em quase 500 mil os familiares de presos no Estado. "São crianças discriminadas nas escolas e mulheres humilhadas. O governo está criando um caldo de ódio."
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