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GILBERTO DIMENSTEIN
Gravidez também é epidemia
Impotentes e atônitos, especialistas em saúde pública têm
detectado e alertado sobre o aumento do número de adolescentes
brasileiras. Alguns deles já classificam a gravidez nessa idade de
epidemia -ou seja, uma doença.
Dos partos realizados atualmente na rede pública, cerca 25%
são de adolescentes; em 1990, essa
proporção era de 10%. A tradução: todos os anos o Brasil ganha
mais um milhão de mães precoces, fragilizadas na escola e no
mercado de trabalho.
Pesquisas revelam que os jovens
têm informação sobre os métodos
contraceptivos e conhecem os riscos da gravidez e de contrair
doenças. Uma imensa maioria
prefere arriscar e não usa camisinha.
O problema é alarmante, está
fora da agenda social e as ações
para prevenção são ainda, na melhor das hipóteses, tímidas.
Por causa dessas informações
que você acabou de ler, considero
que o primeiro projeto inovador
do Governo Lula foi lançado na
semana passada: a distribuição
de camisinhas nas escolas acompanhada de um programa de
educação sexual.
Na área econômica, Lula tem
repetido as diretrizes de seu antecessor, e, na área social, suposta
especialidade do Partido dos Trabalhador, nada apresentou que
fugisse da mesmice. Pior: no caso
do Fome Zero, retrocedeu; a ofensiva contra a desnutrição está
marcada pelo viés mercadológico
e assistencialista.
Falta ainda uma política coerente e abrangente para a juventude envolvendo diversos ministérios. O programa de primeiro
emprego é, até aqui, uma simples
intenção, as idéias contra a violência estão apenas no papel, não
se vêem os recursos para a melhoria de ensino. Sintomaticamente,
a palavra educação não apareceu
uma única vez (quem quiser, confira), na longa entrevista que Lula deu para a revista "Veja".
Nessa pasmaceira, distribuir camisinhas nas escolas é a primeira
alternativa criativa e corajosa
desse governo para enfrentar
uma mazela social.
Gravidez precoce significa riscos
de saúde; é uma das razões, entre
outras, porque o Brasil é o campeão mundial de mortalidade
maternidade. Não é o pior problema: significa também mais um
obstáculo para o progresso escolar e profissional de jovens, aumentando a miséria.
Com base em dados do IBGE,
um estudo concluído na semana
passada mostrou 3,7 milhões de
jovens estão sem emprego, quase
metade do total de desempregados brasileiros. O dado mais grave é o seguinte: 4,5 milhões de jovens não trabalham, não estudam nem procuram emprego, vivendo em inatividade. Não fazem
parte nem sequer do índice de desemprego, é gente que já desistiu
de tudo.
Tal desalento é alimentado pelo
baixo crescimento econômico, é
óbvio. Mas também pela gravidez
precoce; basta ir a uma favela ou
nos bairros mais pobres das regiões metropolitanas e ver quantas adolescentes são mães, impedidas de estudar e, por isso, com
mais dificuldades de obter um
emprego.
Para piorar, faltam creches e escolas de educação infantil; o que
existe, no geral, é de qualidade sofrível.
Vive-se uma explosão diária da
bomba jovem, visível nos índices
de criminalidade. Sabe-se que a
única saída consistente é desenvolver uma política de juventude
acoplada ao crescimento econômico com melhoria do ensino público.
Distribuir camisinhas como
parte de uma programa de educação sexual nas escolas públicas
é apenas um detalhe diante da
grandiosidade dos desafios -
mas já é alguma coisa.
P.S. - Na semana passada, começou a prosperar outro debate
importante para a questão da juventude. Todos sabemos do abuso
crescente de álcool entre adolescentes ricos e pobres; educadores
estão desnorteados. Acidentes de
trânsito e violência são provocados, em larga medida, pela bebida. Uma comissão interministerial está buscando um acordo
com empresários para limitar a
propaganda e a venda ao redor
das escolas.
É bem mais difícil educar os jovens se as empresas gastarem tanto dinheiro associando álcool com
alegria, saúde e pujança sexual,
usando os mais sofisticados recursos publicitários. Se os políticos
não entrarem nesse assunto -assim como entraram na questão
do tabaco- nada vai mudar.
Mas, como mostram várias experiências, não adianta apenas
proibir o álcool, as drogas ou o sexo. Nem muito menos só limitar a
propaganda. O sucesso, mostram
as experiências, está em trabalhar
com valores e perspectivas: jovens
com boa auto-estima, estrutura
familiar e que apostam no futuro
podem, eventualmente, abusar
das drogas e do álcool, mas tendem a buscar um ponto de equilíbrio. Sabem, afinal, que têm muito a perder.
E-mail - gdimen@uol.com.br
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