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Relatório aponta superlotação e falta de lazer em asilos
Segundo documento da OAB e do CFP, o Brasil não possui infra-estrutura mínima de abrigamento para população idosa
O documento foi feito a partir de inspeções em 22 Instituições de Longa Permanência para Idosos localizadas em 12 Estados
WILLIAN VIEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
São 15h, e 20 idosos enfileirados em dois bancos de madeira
aguardam a atividade do dia -
ver um filme dublado na televisão, ao lado de um senhor que
lê uma revista de três semanas
atrás e de outros que dormem
em cadeiras de rodas. A cena é
comum em asilos superlotados
do Brasil onde milhares de idosos ociosos "esperam pela morte", segundo o relatório da OAB
(Ordem dos Advogados do Brasil) e CFP (Conselho Federal de
Psicologia) obtido pela Folha.
"O Brasil não possui infra-estrutura mínima de abrigamento para sua população idosa",
diz o documento, feito a partir
de inspeções em 22 ILPIs (Instituições de Longa Permanência para Idosos), das quais 18
privadas, em 12 Estados. Dez
foram tidas como superlotadas
(quatro idosos por quarto), 11
não ofereciam lazer e 13 não tinham funcionários suficientes.
Uma nem sequer tinha médico.
"Vimos depósitos de idosos
abandonados, sem família ou
contato com a comunidade",
diz Ana Luiza Castro, coordenadora da Comissão Nacional
de Direitos Humanos do CFP.
Ela diz que a "maioria dos asilos não está nas mãos do Estado" -dado confirmado pela
Anvisa (Agência Nacional de
Vigilância Sanitária). "A estimativa é de que a maioria seja
privada", diz o órgão, que está
fazendo o levantamento dos
asilos existentes no país". São
2.879 cadastrados até agora.
"Denúncias" motivaram a
escolha dos asilos. Na Estância
Cantareira, em São Paulo, a
conselheira do Conselho Regional de Psicologia, Beatriz
Belluzo, viu idosos misturados
com casos psiquiátricos e a ausência de lazer. "Havia mesas
em frente aos quartos que viviam à espera da refeição."
No Solar da Vivência, onde
há somente idosos, "a situação
é ainda mais precária", diz Belluzo. "Lá só dão comida e remédio e havia idosos dormindo
em cadeiras de rodas. Não se
investe em atividades de lazer.
Todo o resto é perfumaria."
Em Pernambuco, a cena se
repete. "A ociosidade é o que há
de mais grave", diz a conselheira Christina Veras. "Eles ficam
sem fazer nada, como restos de
pessoas depositadas nas camas,
sem oficinas e espaços para ler,
pintar ou qualquer coisa que os
ocupasse." No Residencial da
Melhor Idade, Veras viu a dona
colocar cadeiras na calçada em
frente ao asilo, onde os idosos
ficavam à espera de uma visita.
"Nos outros, nem isso."
A dona da Estância Cantareira, Cleide Mazzuli, negou a superlotação e disse oferecer atividades de lazer, como "cinema
com pipoca uma vez por semana e terapia ocupacional quase
todo dia". No Residencial da
Melhor Idade, a dona, Luciane
do Monte, disse ter "um recreador terças e quintas, o máximo que se consegue pagar
com a mensalidade de um salário mínimo". No Solar da Vivência, ninguém respondeu.
O relatório termina afirmando que o Estatuto do Idoso tem
sido desrespeitado e recomenda ao Ministério Público a "instauração de procedimentos administrativos". Aprovado em
2003, o Estatuto garante ao
idoso o direito ao lazer, à liberdade, à dignidade, a acomodações para recebimento de visitas e até assistência religiosa.
Em parte dos asilos, as queixas dos internos falam de falta
de sexo (os quartos, coletivos,
são divididos por gênero) e de
falta de padres. No dia em que a
Folha visitou o Estância Cantareira, um padre celebrava
uma missa. "De tanto pedirem
a gente trouxe um", diz a dona.
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