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São Paulo, domingo, 27 de julho de 2003

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SEGURANÇA

Administrador, que teve o filho assassinado em tentativa de roubo, percorre o Congresso contra proposta de desarmamento

Para pai, arma poderia ter salvado filho

DA REPORTAGEM LOCAL

O administrador de empresas Jorge Damus, 48, já andava armado quando o filho Rodrigo, 20, foi assassinado com uma arma de registro raspado durante um tentativa de roubo em 1999.
O pai é responsável pelo planejamento da segurança de um condomínio fechado de Barueri, na Grande São Paulo.
"Talvez se tivesse preparado Rodrigo não para viver, mas para matar, ele teria uma chance". Ontem sua outra filha, de 22 anos, começou o curso de tiro.
Damus percorreu gabinetes no Congresso nos últimos tempos repetindo os argumentos de seu grupo, o MRC (Movimento de Resistência ao Crime), contra a proposta de desarmamento de particulares que seguiu à Câmara dos Deputados: as armas ilegais são as mais utilizadas em crimes e o projeto em tramitação não mexe com elas. Continuarão, portanto, abastecendo o crime. E a população estará desguarnecida. Na ação do Estado, ele não confia.
A realidade só será diferente para os que podem pagar empresas de segurança, afirma Damus.
"Ninguém compra uma arma e a legaliza para tirar a vida", diz Misael Antônio de Sousa, 52, diretor regional da ANPCA (Associação Nacional dos Proprietários e Comerciantes de Armas).

Criminalidade
Os ativistas pró-armas levam embaixo do braço estudos que mostram que a criminalidade aumentou onde houve restrições ao registro e ao porte. E caiu em locais em que o acesso foi facilitado.
As principais fontes são análises dos crimes com armas de fogo ocorridos na Inglaterra, país que proibiu a venda de armas de alto calibre em 1997 (acima de .22), e a bíblia do movimento pró-armas, o livro "Mais Armas, Menos Crimes", de John Lott, ex-professor das universidades de Chicago e de Stanford, nos EUA, que, em entrevista recente à Folha, defendeu que os pobres brasileiros têm o direito de ter armas para defesa.
Da indústria de armas nacional, que faz o mesmo discurso, os grupos dizem nada receber, e também não esperam muito -o projeto em discussão não arranharia a principal fonte de lucro do setor, as exportações, destacam.
"Querem que nos rendamos ao banditismo", diz o professor de filosofia Luiz Afonso Santos, 56, da Apaddi (Associação Paulista de Defesa dos Direitos e das Liberdades Individuais), sobre o projeto. Vislumbra uma conspiração. "Não querem o cidadão altivo."
Um dos maiores financiadores dos movimento pelo desarmamento seria George Soros (megainvestidor internacional), crítico da ação armamentista norte-americana, diz acreditar.
Sousa avança. Diz que os pró-controle não são democráticos. "Hitler disse que haveria ordem porque os judeus estavam desarmados", afirma. "Amanhã será o direito à propriedade que irá embora", diz Damus, do MRC.
Pesquisa de vitimização realizada entre maio e junho do ano passado pelo Ilanud para o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República mostrou que 4% dos domicílios de São Paulo, 6% no Rio, 5% em Recife e 6% em Vitória possuem armas de fogo.
Como motivo para ter o armamento, 60% disseram que é para proteção, seguidos de 23% que afirmaram ser policiais ou das Forças Armadas. O dono de arma tem nível superior (12%), ganha mais de R$ 1.600 (13%) e possui principalmente revólveres (60%) e pistolas (28%).

Lembrança de infância
Santos, da Apaddi, diz que a arma faz parte do seu cotidiano. Na infância mirava em latas. A arma evitou um roubo em uma praia deserta numa tarde de namoro na juventude. Ele não se vê sem ela.
Já Sousa, da ANPCA, viu nas armas uma oportunidade de ganhar dinheiro. Opera um escritório de assessoria sobre produtos controlados, mas afirma que as armas hoje lhe rendem quase nada. Coleciona algumas. "Você está preocupado em defender o que a vida lhe deu. Isso é do ser vivo." Ladrões fizeram "uma limpeza" na casa de campo de Sousa quando não havia ninguém no local.
Jorge Damus cita Thor, deus guerreiro da mitologia nórdica, e diz que o problema não são as armas, mas os portadores.
"A espada de Thor adquire a personalidade de Thor."


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