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Pessoas residem em cavernas dentro de viadutos
BRUNO LIMA
DA REPORTAGEM LOCAL
Enquanto a Prefeitura de São
Paulo coloca grades embaixo dos
viadutos para evitar a ocupação
por moradores de rua, pessoas vivem em cavernas dentro do próprio viaduto. Onze pessoas moram em três buracos feitos no
muro de alvenaria construído sob
o viaduto Pires do Rio, na Radial
Leste (zona leste de São Paulo).
O viaduto é um dos 25 que, segundo a Secretaria de Assistência
Social, devem sofrer intervenção
até o fim do ano para a retirada de
pessoas. Também há 18 barracos
montados no vão do Pires do Rio.
Pelo plano da prefeitura, após a
desocupação, os viadutos são isolados -normalmente com grades ou alambrado- para evitar
novas ocupações. Além da SAS,
outras três secretarias estão envolvidas: Habitação e Desenvolvimento Urbano, Infra-estrutura
Urbana e Implementação de Subprefeituras. Já foram investidos
R$ 2,5 milhões no programa.
A SAS trata de maneira distinta
quem mora debaixo do viaduto
só com um cobertor, por exemplo, de quem tem uma "casa"
montada com tábuas de madeira.
Esses últimos, segundo a SAS, estavam presentes em 44 viadutos
da cidade -19 já foram desocupados, e os moradores atendidos
pelo programa Baixos Viadutos.
Levantamento realizado pela
prefeitura, de agosto a outubro de
2001, mostrou que cerca de 1.200
pessoas viviam em moradias precárias em vãos de viadutos na cidade. Desses, 767 já teriam sido
retirados das ruas. Segundo a Sehab, 552 pessoas estão em moradias alugadas pela secretaria, 167
estão em hotéis e 48, em albergues, abrigos ou casa de parentes.
A outra categoria de moradores
de rua seria formada por andarilhos, que podem dormir cada dia
em um local. A SAS diz que essas
pessoas devem ser atendidas pelo
Programa Acolher, que oferece
abrigo, alimentação, banho e atividades profissionalizantes em albergues e casas de convivência.
Cerca de R$ 400 mil foram gastos desde março pela Secretaria de
Implementação das Subprefeituras com o isolamento de vãos de
viadutos. Segundo a SIS, das 209
áreas sob vãos de 169 viadutos
existentes na cidade, 166 já sofreram algum tipo de intervenção. A
secretaria informou que 118 já foram gradeadas, e 48 aguardam fechamento ou outra obra. Os dados incluem todos os viadutos desocupados, inclusive os que não
tinham moradores de rua.
Toca do Tatu
Viaduto Pires do Rio, número
13. Esse é o endereço de Vilma
Maria Alves Guilherme, 46, e José
Augusto do Nascimento, 33, que
há três meses cavaram um buraco
no viaduto, escolheram um número para pintar na porta e passaram a morar no local. O trabalho durou três dias. "Aqui é uma
toca de tatu", diz Nascimento.
Vilma veio do Paraná, Nascimento, do Maranhão. Moram
com a ex-mulher dele, Iracema
Lacerda, 44, pernambucana que
passou por vários hospitais psiquiátricos, e também com a filha e
um dos netos de Vilma. Há ainda
duas gatas, que, segundo Vilma,
"graças a Deus, comem os ratos".
A caverna tem dois cômodos
com cerca de 1,80 m de altura,
mas é preciso agachar para passar
de um espaço a outro. Há lâmpadas, fiações por todo lado e uma
TV -a energia elétrica vem de
uma ligação clandestina. No
quarto, há um colchão no chão,
cercado por terra. Vilma diz que,
à noite, sente medo. "Falta ar, parece que o teto vai cair e vou ficar
enterrada. Mas penso comigo, tenho de me acostumar."
Na caverna vizinha, vive a paranaense Maria da Conceição Lima,
25, com o marido e três filhos. Ela
diz morar ali há mais de dois
anos. "Parece morada de bicho,
mas fazer o quê?" Em uma terceira portinha, o Roberto de Orcena,
38, mora sozinho. Há cerca de um
mês, caiu do viaduto quando entrava em casa e quebrou um dedo
da mão. Como Rocha e Nascimento, ele trabalha com uma carroça, catando lixo.
Segundo a CET, das 17h às 20h,
passam cerca de 20 mil veículos
no viaduto. Dentro das cavernas,
é possível ouvir o barulho de cada
carro que passa.
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