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MÁFIA DOS COMBUSTÍVEIS
Deputados que investigam o setor tiveram campanhas financiadas por empresas ligadas à área
12 integrantes da CPI receberam doações
FERNANDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Instalada neste ano para investigar "operações no setor de combustíveis relacionadas à sonegação dos tributos, máfia, adulteração e suposta indústria de liminares", a CPI dos Combustíveis tem
entre os seus integrantes 12 deputados que receberam doações de
campanha de empresas relacionadas a essa área da economia.
Desses 12 deputados, oito são titulares na CPI. Esses oito representam 33% dos 24 titulares. Os
suplentes participam da comissão, mas não têm direito a voto.
Os casos mais evidentes são os
dos deputados João Caldas (PL-AL) e Rose de Freitas (PSDB-ES).
Ambos receberam doações diretamente de usineiros de álcool.
João Caldas declarou à Justiça
Eleitoral que toda a sua campanha foi patrocinada por empresas
do setor. A maior parte, R$ 941,5
mil, veio da Usina Caeté, do Grupo Carlos Lyra.
"Declaro isso em minha prestação de contas. De forma nenhuma
há incompatibilidade entre essa
doação e a minha participação na
CPI dos Combustíveis. O Grupo
Carlos Lyra é sério", afirma o deputado João Caldas.
Amizade
Rose de Freitas disse ter amizade há 22 anos com o usineiro
Márcio José Pavan, de Araçatuba
(530 km a noroeste de São Paulo).
Ela recebeu R$ 272 mil (65,35%
do total gasto em sua campanha)
de Pavan. "Ele é meu amigo. Não
considero incompatível. Só se eu
não tivesse tomado nenhuma atitude para que a CPI investigasse o
setor de álcool", declara a congressista. Rose propôs a criação
de uma subcomissão para investigar o setor de álcool, mas a sua
idéia não foi adotada.
O presidente da CPI, deputado
Carlos Santana (PT-RJ), recebeu
R$ 59,9 mil do estaleiro Enavi Reparos Navais Ltda. O valor equivale a 37,16% do total das doações
de Santana. Ocorre que um dos
sócios do Enavi é também acionista da Petro Amazon, uma empresa investigada pela Assembléia
Legislativa de Rondônia.
"Não recebi doações de campanha do setor. Quando se recebe
uma doação de uma empresa não
se tem acesso à declaração de renda de quem está doando", explicou Santana à Folha.
Há outros casos de deputados
que receberam doações mais modestas, diretamente de postos de
gasolina. É o caso de André Luiz
(PMDB-RJ), que declarou R$ 16
mil recebidos de seis postos de
combustíveis. O montante representou 3,44% de seu financiamento eleitoral.
"São empresários da minha região, zona oeste do Rio. Creio que
não há incompatibilidade. Por
que teria de haver? Aliás, a gasolina já chega adulterada ao posto",
disse o deputado André Luiz.
Edson Andrino (PMDB-SC) declarou que R$ 12,75 mil (16,36%
de suas doações) vieram do Posto
Lagoa. Ele é dono do posto.
Eis a explicação de Andrino:
"Há 12 anos eu aluguei o posto para a Texaco. Não trabalho mais
com gasolina. Só alugo o prédio,
mas uso ainda a mesma razão social do posto. No fundo, eu fiz a
doação para mim mesmo".
Eliseu Padilha (PMDB-RS), ex-ministro dos Transportes no governo FHC, recebeu R$ 100 mil da
OPP Química, uma empresa petroquímica que também fornece
insumos para o setor de combustíveis. O ex-ministro diz não ter
visto "até hoje nenhuma incompatibilidade", pois "nem a OPP
nem sua atividade figurava como
suspeita ou passível de investigação nas motivações para a instalação da CPI".
Gervásio Silva (PFL-SC) recebeu R$ 29 mil de empresas como
a Companhia de Petróleo Ypiranga e postos de gasolina. Como está
tudo declarado em sua prestação
de contas, diz não considerar haver conflito de interesses para ele
na CPI. "Minha atuação é transparente", afirma.
João Magno (PT-MG) teve uma
pequena doação de R$ 4.160,00
(2,51% do total que arrecadou) do
Posto de Serviço Líder. Para ele,
não há "qualquer incompatibilidade" com sua função na CPI.
José Carlos Araújo (PFL-BA) está numa situação semelhante à de
Eliseu Padilha. Recebeu doações
de R$ 25 mil da empresa OPP, do
setor petroquímico, o que representou 14,02% do total de seu financiamento de campanha. O deputado avalia que a OPP "não tem
nada a ver" com combustíveis. E
completa: "Produz resinas, e nós
investigamos os postos de combustíveis e as distribuidoras".
Marcus Vicente (PTB-ES) tem
explicação oposta à de Araújo:
"Não estamos fiscalizando postos, mas sim a máfia dos combustíveis, a adulteração e a indústria
de liminares que arrombam os
cofres públicos". Ele diz isso porque nas suas contas de campanha
aparecem R$ 3.500 doados pelo
Posto Spinasse Ltda.
Todos os deputados citados
nesta reportagem receberam perguntas por escrito da Folha na última quarta-feira. No dia seguinte, o jornal telefonou para os gabinetes e detalhou mais o tema.
Sem resposta
Dois congressistas não responderam ao jornal até o final da tarde de sexta-feira: Luciano Zica
(PT-SP), corregedor da Câmara,
que recebeu R$ 5.000 da FBA-Frano Brasileiro S.A. de Açúcar e de
Álcool, e Helenildo Ribeiro
(PSDB-AL), em cujas contas de
campanha aparece uma doação
da R$ 40 mil da empresa petroquímica Trikem.
Outros dois deputados -Daniel Almeida (PC do B-BA) e Paulo Rubem Santiago (PT-PE)- explicaram que receberam doações
irrisórias (R$ 100 e R$ 962,95, respectivamente).
Se Daniel Almeida e Paulo Rubem também fossem contabilizados no grupo dos outros congressistas citados neste texto, subiria
para 14 o número de deputados
da CPI dos Combustíveis que recebeu algum tipo de doação relacionada ao setor.
Do ponto de vista formal, a direção da Câmara não pode tomar
nenhuma atitude em relação a deputados que participam de investigação de setores dos quais receberam doações de campanha.
A única medida possível é o
próprio congressista se declarar
impedido de ocupar a função. Nenhum dos ouvidos pela Folha disse considerar necessário tomar
essa decisão.
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