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SAÚDE
Poluição pode afetar fertilidade masculina
CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL
A qualidade dos espermatozóides caiu nas últimas décadas e
uma das explicações pode ser a
poluição ambiental ou ocupacional nos países industrializados.
Problemas de morfologia e de
motilidade (faculdade de mover-se) dos espermatozóides são os
principais fatores da infertilidade
masculina, que atinge de 10% a
15% dos homens em idade fértil,
segundo a Sociedade Americana
de Medicina Reprodutiva.
Alguns estudos internacionais
indicam uma redução média de
50% na concentração espermática de homens que vivem em países industrializados.
Um deles analisa amostras seminais de dois grupos de homens
de 18 anos que viviam nas zonas
rural e urbana da República Tcheca. Os homens expostos à poluição do ar apresentavam mais frequentemente alteração da motilidade e morfologia e da estrutura
da cromatina dos espermatozóides (medida da integridade genética) do que os jovens menos expostos, que viviam na zona rural.
No Brasil ainda não há um estudo amplo sobre o assunto. Uma
pesquisa realizada pela Unicamp
(Universidade Estadual de Campinas), com 10.842 espermogramas, no período de 1990 a 1999,
indica uma queda na qualidade
dos espermatozóides ao longo
dos anos.
Segundo o urologista Paulo Augusto Neves, 44, responsável pelo
setor de infertilidade masculina
da Unicamp, o estudo mostra um
declínio da motilidade e da porcentagem de espermatozóides
normais, o que eleva as taxas de
infertilidade. Metade dos problemas de esterilidade é atribuída a
causas masculinas.
Neves e o também urologista
Nelson Rodrigues Netto Júnior
lançaram na semana passada um
livro sobre infertilidade masculina, a primeira obra que trata estritamente desse problema na América Latina.
Neves diz que há vários estudos
sugerindo que a exposição ambiental ou ocupacional a compostos químicos alteraria o equilíbrio
endócrino e poderia ser uma das
causas da infertilidade masculina.
Contudo, há outras pesquisas que
não reconhecem essa relação.
Além do declínio da produção
espermática, ele diz que em vários
países houve um aumento da incidência do câncer de testículo e
de outras alterações do trato reprodutivo masculino como a hipospádia (desenvolvimento insuficiente da uretra em seu trajeto
peniano) e criptorquidia (ausência de testículo no escroto).
Em palestra realizada no mês
passado no Hospital Albert Einstein, a pesquisadora americana
Rebecca Sokol disse que estudos
clínicos e com animais têm identificado várias substâncias químicas como sendo tóxicas para o
aparelho reprodutivo. Entre elas
estariam os resíduos industriais,
os pesticidas e metais pesados.
Segundo Rebecca, metais pesados têm sido relatados como tóxicos para a fertilidade masculina. A
exposição ao chumbo, por exemplo, altera a função espermática e
dos hormônios reprodutivos, e o
contato com o cádmio pode destruir a irrigação testicular, reduzindo a fertilidade. O crômio pode interferir na motilidade do espermatozóide.
O técnico em química João Carlos Gomes, 36, atribui a má qualidade de seus espermatozóides ao
contato que teve com produtos
químicos no período em que trabalhou na Rhodia de Cubatão.
A unidade, que produzia o ultratóxico "pó-da-china" e solventes clorados, está interditada desde 1993. A Rhodia não acredita
que os problemas de fertilidade
estejam ligados à contaminação.
Gomes possui espermatozóides
com problemas de motilidade e
morfologia, o que teria dificultado a gravidez da sua mulher durante cinco anos.
Ele chegou a fazer uma cirurgia
e a tomar medicamentos à base de
citrato de clomifeno durante um
ano para melhorar a qualidade espermática, mas o tratamento não
surtiu efeito.
Em 1997, quando já pensavam
em fazer uma fertilização in vitro,
a mulher de Gomes engravidou
naturalmente do menino L.U.,
único filho do casal.
Gomes move uma ação civil
contra o INSS, em que tenta vincular seu problema de fertilidade
com a contaminação sofrida.
Uma das substâncias encontradas no seu sangue é o hexaclorobenzeno (HCB), considerado um
interruptor endócrino, que tem
sido associado à redução do número de espermatozóides.
Água
Há estudos que também relacionam a queda da fertilidade
masculina ao consumo de água
contaminada por hormônios
-como o estrógeno e a progesterona- e por metais pesados.
Segundo Edson Borges Júnior,
presidente da Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida, uma
pesquisa está sendo feita em São
Paulo para avaliar a influência da
água na qualidade dos espermatozóides. Foram coletadas amostras em vários locais na cidade. Os
resultados saem em um mês.
Para o médico Jorge Adad Filho,
pesquisador na área de reprodução humana da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), os
estudos que relacionam o fator
ambiental à queda da fertilidade
estão no caminho certo, mas ainda são muito inconclusivos. "Ainda não dá para provar nada."
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