São Paulo, domingo, 02 de junho de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

COLAPSO DA ARGENTINA

Para chefe da missão do Fundo para o país, troca de depósitos por títulos deveria ser compulsória

FMI questiona plano que "abre" curralzinho

JOÃO SANDRINI
DE BUENOS AIRES

O plano do governo Duhalde para flexibilizar o curralzinho, formalizado ontem e que propõe a troca dos depósitos bloqueados por títulos públicos, foi questionado pelo FMI (Fundo Monetário Internacional).
Segundo o jornal "La Nación", a diretoria do Fundo discutiu o plano na sexta-feira. O chefe da missão do FMI para o caso argentino, Anoop Singh, teria dito ao diretor-gerente, Horst Köhler, e à vice-diretora-gerente, Anne Krueger, que a proposta não eliminaria as restrições impostas pelo curralzinho, pois só uma parcela dos correntistas deve optar pela troca de depósitos por títulos.
Segundo o jornal, o FMI teria concluído que o melhor seria impor a obrigação de que todos os correntistas recebessem títulos, porque só assim o curralzinho poderia ser de vez eliminado sem haver pressão sobre o dólar.
Ontem, ao apresentar o decreto que flexibiliza o curralzinho, o ministro da Fazenda, Roberto Lavagna, admitiu que a troca compulsória era a opção preferida por Singh, mas afirmou que o mecanismo é "inviável" do ponto de vista legal e "não reparte equitativamente os impactos do colapso do sistema financeiro". Acrescentou que houve manifestações favoráveis ao decreto atual por parte de alguns diretores do Fundo.
Segundo Lavagna, o fim do curralzinho não é um pré-requisito para a negociação de um empréstimo estimado em US$ 9 bilhões, e o início dessa negociação com o FMI só depende do fechamento de acordo para a redução do déficit da Província de Santa Fé.
O presidente argentino, Eduardo Duhalde, disse ontem que o acordo com o FMI sai "em questão de semanas" e que "a antecipação da eleição presidencial não soluciona a crise".
Segundo Lavagna, o decreto beneficia os correntistas por oferecer três opções de títulos para a devolução dos depósitos -dois em dólar e um em pesos. A opção poderá ser exercida durante 30 dias a partir de amanhã. Quem rejeitar os títulos terá de esperar para receber os recursos em dinheiro, em várias parcelas e até 2005, seguindo o cronograma estabelecido pelo governo em fevereiro.
O governo espera que o plano dê alento ao setor produtivo, já que os títulos poderão ser usados para a compra de casas e carros novos e de ações lançadas em Bolsa, para investir em fundos, cancelar dívidas, pagar hipotecas e impostos atrasados, além de poderem ser revendidos em Bolsa.
O ministro também decidiu usar o temor de quebradeira de bancos a seu favor. O decreto prevê o socorro dos correntistas pelo governo nesses casos, mas com títulos públicos com menor rentabilidade do que os que estão sendo oferecidos agora.
Lavagna também declarou que o projeto cria mecanismos para promover a "rebancarização" na Argentina porque prevê a duplicação de parte das 17,6 milhões de contas correntes existentes no país. As novas contas formarão uma espécie de sistema bancário paralelo que não terá restrições para saque e pagará correção monetária para compensar a inflação.
Para o governo, as antigas contas que obedecem às regras do curralzinho deverão desaparecer em alguns anos, restando apenas o novo sistema.
Além disso, o governo prometeu dar aos bancos US$ 9,5 bilhões em bônus para compensá-los pela "pesificação" da economia. Mesmo assim, os banqueiros consideram o plano "insuficiente". Eles acreditam que a duplicação das contas só vai agregar custos às instituições financeiras.
"O problema é a falta de confiança no sistema bancário, o que não será resolvido enquanto houver o curralzinho", disse Gabriel Caracciolo, analista de bancos da Standard & Poor's. "Penso que, com esse plano, os argentinos continuarão a buscar o dólar, e não os bancos, para se precaver da desvalorização cambial", afirmou.



Texto Anterior: Saiba mais: Entenda como os "fundos seguros" perderam
Próximo Texto: Comércio Exterior: Eleições adiam acordos comerciais do Brasil
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.