São Paulo, domingo, 03 de novembro de 2002 |
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LIÇÕES CONTEMPORÂNEAS Pingos nos "is" LUCIANO COUTINHO
Diante de recentes declarações autolaudatórias de tucanos de graduadas plumagens a
respeito da situação do Brasil
-começando pelo próprio presidente Fernando Henrique Cardoso-, não posso deixar de registrar fatos: 1) o governo de Sua Excelência entrega o país em meio a
uma grave crise de asfixia cambial cuja reversão exigirá da sociedade brasileira e do próximo
governo mais um período de tremendos sacrifícios; 2) esse sofrimento adicional se projeta sobre
um quadro social já seriamente
dilacerado por alto desemprego
(18% na região metropolitana de
São Paulo), criminalidade e dissolução da solidariedade social
resultantes de anos seguidos de
recessão ou, no máximo, de crescimento curto e pífio desde a crise
internacional de 1997; 3) a margem de manobra da política econômica brasileira no próximo
ano, sob a supervisão do FMI
(Fundo Monetário Internacional), é praticamente nula e é precária a situação orçamentária legada ao novo governo; 4) apesar
da alienação de ativos públicos
no valor de R$ 260 bilhões, a dívida pública interna e o passivo externo líquido (tanto público como
privado) cresceram, respectivamente, de 21% para 46% do PIB e
de 25% para 100% do PIB durante os oito anos de tucanato, sob o
efeito de uma política macroeconômica que se auto-engessou em
juros elevadíssimos; 5) o peso do
serviço e da rolagem do estoque
dessas duas dívidas constitui um
fator de constrangimento para a
possibilidade de reduzir rapidamente a taxa de juros; 6) a vulnerabilização externa e interna da
economia brasileira foi resultado
direto da opção por uma estabilização com resultados rápidos, baseada em âncora cambial supervalorizada com juros superaltos;
7) a demora em reconhecer e em
corrigir o processo de vulnerabilização é de responsabilidade exclusiva de Sua Excelência e de sua
equipe econômica, que não podem arguir que lhes faltaram
alertas e oportunidades; 8) a falta
de empenho em reduzir incisivamente a vulnerabilidade externa
após a correta adoção do câmbio
flutuante, em janeiro de 1999,
também só pode ser debitada ou à
tibieza ou à opção de seu governo;
9) a fragilidade do sistema de metas de inflação em condições de
alta vulnerabilidade é, também,
inextricavelmente, resultado das
escolhas supramencionadas. Luciano Coutinho, 54, é professor titular do Instituto de Economia da Universidade de Campinas (Unicamp). Foi secretário-geral do Ministério da Ciência e Tecnologia (1985-88). Texto Anterior: Opinião econômica: Erro de diagnóstico Próximo Texto: Tendências internacionais: Nova guerra mundial já começou na internet Índice |
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