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LUÍS NASSIF
O rei desconhecido do sincopado
No panorama musical carioca, dos anos 30 e 40, há
dois grupos de músicas, irmãs de
sangue, englobadas em dois gêneros pouco estudados como tal,
mas fundamentais na formação
da música brasileira do período: o
samba sincopado e o samba choro.
Um de nossos sambas sincopados favoritos é "Beija-me" ("Beija-me / quero seu rosto coladinho
ao meu"). É talvez o maior clássico do gênero samba sincopado,
que teve em Ciro Monteiro, Dilermando Pinheiro, Vassourinha e
Joel e Gaúcho seus intérpretes
mais expressivos.
O sincopado foi construído por
autores extraordinários, como
Geraldo Pereira, Wilson Batista,
Janet de Almeida. Um dos autores centrais, mais conhecido pelas
composições do que pelo nome,
foi Roberto Martins, autor de
"Beija-me". E quem me faz relembrar desse clássico é meu conhecido Eduardo Martins, de Ribeirão Preto.
Roberto Martins nasceu no Rio,
em 29 de janeiro de 1909. Morreu
em 14 de março de 1992. Morou
na Tijuca e em São Cristóvão. Cedo ficou órfão de pai, o português
José Francisco Martins. A mãe,
Isaura Maria Machado Martins,
o educou para a vida e para a
música. É de 1929 seu primeiro
samba, "Justiça". E de 1933 suas
primeiras gravações -"Regenerado" e "Segredo", gravados por
um certo Leonel Faria.
É curioso o pouco conhecimento
sobre a dimensão de Roberto
Martins na música brasileira. No
sincopado, suas composições estão à altura dos maiores. O sucesso começou em 1936 quando, com
Valdemar Silva, compôs "Favela", um clássico interpretado por
Francisco Alves. E não parou
mais. Como me lembro, na infância, ouvindo aquela música, que
me foi ensinada pelo meu tio Leo,
um carioca da gema. Eu andava
pelos cantos cantando, repetindo
obsessivamente "Favela, oi, favela / favela que trago no meu coração" -como a Beatriz, com seus
quatro anos, faz com seus CDs de
estimação. "Favela" foi das primeiras músicas brasileiras gravadas internacionalmente.
No Carnaval de 1939, em parceria com Nássara, compôs "Meu
Consolo é Você", gravado por Orlando Silva. No ano seguinte,
"Cai Cai" ("Cai, cai, cai, cai / eu
não vou te segurar"), gravada pelos embaladíssimos Joel e Gaúcho.
A essa altura, consagrado como
compositor, Roberto Martins largou sua carreira na polícia e virou ritmista da orquestra de Simon Boutman, uma das mais famosas dos anos 30. Em 1943, compôs "Beija-me", em parceria com
Mário Rossi. A música foi gravada por Ciro Monteiro e se tornou
um dos clássicos do samba sincopado. Junto com Rossi, Martins
comporia outro clássico do samba
choro, o "212" ("Lá na rua onde
eu moro / no 212 / mora a mulher
que eu adoro / que quando eu
passo faz pose").
Foi um tremendo autor de marchas carnavalescas, à altura de
um Braguinha ou de um Lamartine Babo. Além do "Cai Cai", em
1945 compôs o "Cordão dos Puxa-Sacos", em parceria com Eratóstenes Frazão, gravada pelos Anjos
do Inferno. Ainda com Frazão,
em 1947 compôs "A Marcha do
Gafanhoto" ("Gafanhoto deu na
minha horta / comeu, comeu, toda a minha plantação"), gravada
por Albertinho Fortuna e, nos
anos 80, por Nara Leão. Com Ari
Monteiro compôs o "Cadê Zazá?", de 1948, gravado por Carlos
Galhardo.
Foi também autor de valsas célebres, como "Dá-me Tuas Mãos",
em parceria com Mário Lago,
gravada por Orlando Silva.
Em 1949, lançou o "Pedreiro
Valdemar" ("Que não tem onde
morar"), em parceria com Wilson
Batista, outro clássico, gravado
por Blecaute, nascido ali em Santo Antonio do Pinhal, que se tornou uma das figuras clássicas do
Carnaval carioca, e que faleceu
há exatos 20 anos. No samba de
Carnaval também foi autor de
composições brilhantes como
"Meu Consolo é Você" ("Meu
consolo é você / meu grande amor
/ eu explico por que").
Quando leio essa produção acadêmica sobre a bossa nova, sustentando que a música brasileira
anterior era composta só de dramalhões, coloco no aparelho as
músicas de Roberto Martins e me
dá uma pena desses pesquisadores...
E-mail - LNassif@uol.com.br
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