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GOVERNO LULA CEM DIAS
Secretário do Ministério da Fazenda vê momento favorável para redução de dívida e não descarta novo aumento no arrocho fiscal
Receita ortodoxa mostra eficácia, diz Canuto
LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O governo Lula deve aproveitar
a conjugação de dólar mais baixo
com a manutenção de um superávit fiscal elevado para reduzir a
proporção da dívida pública em
relação ao PIB (Produto Interno
Bruto) mais rapidamente.
"Você pode aproveitar essa conjuntura [dólar mais baixo" para,
com o mesmo superávit primário,
acelerar ainda mais a redução da
proporção dívida/PIB", disse à
Folha Otaviano Canuto, secretário de Assuntos Internacionais do
Ministério da Fazenda.
Canuto não descarta a hipótese
de que a meta de superávit primário (economia de receitas para o
pagamento de juros da dívida) seja aumentada nos próximos anos.
Para este ano, ela foi elevada de
3,75% do PIB para 4,25%, o equivalente a R$ 68 bilhões.
O superávit para 2004 e a meta
indicativa para os dois anos seguintes serão definidas nos próximos dias pelo governo.
A Folha já publicou que a equipe do ministro Antonio Palocci
Filho (Fazenda) é favorável a um
superávit maior no próximo ano.
"Quando o ministro Palocci
anunciou a meta de 4,25% [do
PIB" para este ano, ele disse textualmente o seguinte, que vale a
pena recuperar: "Esse percentual
de 4,25% nem é o máximo que a
gente poderia obter nem é o mínimo, é aquele que achamos conveniente no momento'", ressaltou.
Canuto disse ainda que o atual
nível do dólar não prejudica as exportações. "Com o atual nível de
câmbio, a margem de rentabilidade das exportações continua favorável", afirmou.
Em sua opinião, mesmo com a
melhora dos indicadores econômicos brasileiros nas últimas semanas, o risco-país (medida da
confiança dos investidores internacionais têm em que um país vá
pagar suas dívidas, que se traduz
no diferencial de juros pagos pelos papéis da dívida externa acima
da taxa dos títulos do Tesouro
americano) ainda está alto para
que o governo volte a tomar empréstimo no exterior.
Folha - Apesar da melhoria dos
indicadores, o risco-país (fechou na
sexta-feira em 940 pontos) ainda
não está muito alto?
Otaviano Canuto - Está, tem
chance de declinar bastante, só
não me pergunte até que nível.
Folha - O prêmio de risco está
mais alto do que a média histórica
ideal paga pelo Brasil.
Canuto - Sim, sim. Mas o governo não está falando em emissão.
Folha - Qual a necessidade de o
país hoje voltar a tomar empréstimo no exterior?
Canuto - Estamos com folga. Temos captações privadas indo
bem, temos uma posição de reservas confortável, estamos em uma
situação bastante confortável. Por
isso podemos nos dar ao luxo de
tomar a decisão de ir ou não ao
mercado e quando e como.
Folha - O atual nível do dólar
atrapalha as exportações, como já
reclamam alguns empresários?
Canuto - Uma das ótimas notícias desde o ano passado foi o teste concreto de como o regime de
câmbio flexível opera bem. Nível
de taxa de câmbio não é em si foco
de política econômica.
Folha - Que leitura faz a Fazenda
sobre esse nível de câmbio para
manter a correção do balanço de
pagamentos?
Canuto - Com o atual nível de
câmbio, a margem de rentabilidade das exportações continua favorável. O grau de desvalorização da
taxa real de câmbio no ano passado foi estrondoso. Na verdade, a
economia tem uma margem para
absorver uma certa valorização
real da taxa de câmbio.
Folha - Há margem até para absorver uma taxa de câmbio menor
do que o nível atual?
Canuto - Eventualmente, alguns
segmentos podem ter temporariamente a sua competitividade
afetada. Mas, dado o grau de desvalorização do ano passado, nos
níveis de câmbio em que nós estamos isso é pouco significativo.
Folha - Justifica o exportador dizer agora que esse nível de câmbio
o prejudica? Há um certo exagero
nessas declarações?
Canuto - Isso é uma questão de
mercado. O sistema que deu a resposta ao choque negativo no ano
passado é o mesmo que dá a resposta agora à correção desse choque negativo.
Folha - Mesmo que a cotação do
dólar caia muito, o governo não vai
interferir na correção do balanço
de pagamentos?
Canuto - Não, porque nós vivemos em um regime de câmbio flexível, e num regime de câmbio flexível não há metas cambiais.
Folha - Essa mudança dos indicadores brasileiros veio mais rápido
do que vocês esperavam?
Canuto - A gente tinha certeza da
direção, do ritmo não necessariamente. Nada do que foi dito ou
feito até hoje foi por acaso.
A palavra-chave é "delivery"
[entrega", como bem empregou
um analista de Wall Street. A gente está prometendo e a gente está
entregando. A promessa e a realização da promessa [medidas econômicas" em sequência, dentro
de uma linha coerente, é o que
tem dado destaque ao Brasil como emergente.
Folha - Apesar de o Brasil estar fazendo tudo certo, do ponto de vista
do mercado, o país ainda paga um
prêmio de risco de aproximadamente 400 pontos (quatro pontos
percentuais) acima da média dos
países emergentes.
Canuto - O que dá uma idéia da
margem de queda que a gente
tem.
Folha - Dependendo do nível em
que a taxa de câmbio se estabilize,
a necessidade de superávit primário pode mudar, ou seja, cair?
Canuto - A sustentabilidade da
dívida, isto é, os superávits primários mínimos para manter a dinâmica da dívida [controlada", depende de vários fatores. Se o crescimento do PIB aumenta e cai o
custo real de carregamento [rolagem" da dívida, os requisitos em
termos de superávit primário são
menores. Ou você pode aproveitar essa conjuntura [dólar mais
baixo e risco em queda" para, com
o mesmo superávit primário, acelerar ainda mais a redução da proporção dívida/PIB.
Folha - O governo estuda aumentar a meta de superávit primário,
como meio de reduzir a relação dívida/PIB de forma mais rápida?
Canuto - Quando o ministro Antonio Palocci anunciou a meta de
4,25% [do Produto Interno Bruto" para este ano, disse textualmente o seguinte: "Esse percentual de 4,25% nem é o máximo
que a gente poderia obter nem é o
mínimo, é aquele que achamos
conveniente".
Folha - Ou seja, ele deixou implícito que não se descarta aumentar?
Canuto - Que não se descarta aumentar nem diminuir. O bom é
ter a condição de tomar a decisão
conveniente. E é isso o que nós estamos adquirindo a cada dia.
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