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TV paga abre disputa entre grupos de mídia
Projeto na Câmara que estabelece sistema de cotas de canais e de conteúdo nacional causa divergência entre empresas
Relator do projeto,
deputado Jorge Bittar (PT-RJ)
defende sua proposta ao
dizer que ela vai criar
ambiente de competição
VALDO CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Depois da guerra travada entre teles e TVs, agora é a vez da
batalha envolvendo os grupos
de comunicação na votação do
projeto que irá definir o futuro
da TV paga e da convergência
digital no país.
De um lado, a Globo trabalha
para derrubar o sistema de cotas de canais e de conteúdo nacional na TV paga tal como está
proposto, sob o argumento de
que ele vai tornar o serviço
mais caro e afetar a qualidade
da programação.
Do outro, grupos como Abril,
Band e Record, apoiados pelos
produtores independentes, defendem as cotas criadas pelo
relator do projeto na Câmara,
deputado Jorge Bittar (PT-RJ),
pronto para ser votado na Comissão de Ciência, Tecnologia e
Comunicação.
Esses grupos alegam que as
cotas de canais e conteúdo nacional vão estimular a concorrência na TV paga brasileira, ao
criar um mercado mínimo para
produtoras que hoje têm dificuldades para conseguir espaço
nesse setor.
Traduzindo: está em disputa
o negócio de fornecimento de
conteúdo nacional para a TV
por assinatura, hoje dominado
pela Globosat com seus canais
esportivos e de notícias.
Concentração que se repete
na distribuição do serviço no
país: dois grupos controlam
quase 80% desse mercado
-Net (associação entre a Globo
e o mexicano Carlos Slim) e Sky
(controlada pelo grupo americano Liberty Media, com participação da Globo).
Com a entrada em peso das
teles fixa no setor, a partir das
mudanças na legislação atual, a
estimativa é que o número de
assinantes salte dos pouco mais
de 5,3 milhões de hoje para 18
milhões em 2018.
Um mercado que, crescente,
tende a atrair parte do bolo publicitário do setor de mídia, estimado hoje em R$ 8 bilhões
anuais -90% vão para a TV
aberta, concentrado na Globo.
Esse risco de perda de faturamento na TV aberta, por sinal,
sempre foi um dos motivos para que as emissoras de televisão
se colocassem contra a entrada
das teles no mercado de TV por
assinatura, algo hoje tido como
inevitável.
As TVs costumam citar que o
faturamento do setor no Brasil
gira na casa dos R$ 10 bilhões
anuais, enquanto as teles faturam cerca de R$ 140 bilhões e
teriam, assim, um poder econômico muito maior para dominar o mercado no futuro.
Competição
Relator do projeto, o petista
Bittar defende sua proposta ao
dizer que ela vai "criar um ambiente de competição, estimulando a melhor utilização das
redes e permitindo pacotes de
TV por assinatura combinados
com banda larga e serviços de
voz a preços menores do que os
atuais".
Até aí, os pesos pesados do
setor estão de acordo. A divergência surge nas propostas de
Bittar para estimular a produção nacional por meio da criação do sistema de cotas, tanto
de canais nacionais como de
conteúdo brasileiro. Disputa
que acabou gerando um impasse no Congresso, obstruindo a
votação do projeto.
As Organizações Globo distribuíram um texto aos deputados da Comissão de Ciência,
Tecnologia e Comunicação em
que classificam como "negativo" o capítulo 5º do relatório de
Bittar, que "impõe aos distribuidores diversas formas de cotas -de canais, de origens de
conteúdo e tipos de programas,
entre outras-, afetando a liberdade de oferta de conteúdo, a
qualidade da programação, a livre concorrência e aumentando o custo para os assinantes".
Diretor-geral da Globosat,
Alberto Pecegueiro diz que não
é contra cotas, mas ao formato
proposto pelo relator. "Algum
nível de cota faz sentido. Só que
no relatório há um exagero de
cotas", afirma, acrescentando
que algumas têm "endereço
certo, que é reduzir o espaço da
Globosat".
Uma crítica indireta ao modelo de programador brasileiro
incentivado previsto pelo deputado Jorge Bittar na definição de cotas, que se encaixa no
perfil dos grupos Abril, Band e
Record. Pelo projeto do relator,
esses programadores teriam,
por exemplo, uma garantia de
espaço de um terço nos canais
nacionais. Esses grupos desejam até aumentar esse espaço.
A Record não concorda com
a crítica. "Apoiamos a manutenção do capítulo 5º [da criação das cotas], não queremos
sua supressão. Se sua aprovação depender de ajustes na redação, pode haver", afirma Higes Andres Manara, consultora
jurídica da empresa.
Na opinião da Record, a Globo não quer a aprovação do
projeto por causa da entrada
das teles no mercado de TV paga. "A Globo é contra esse projeto. Eles não querem que as teles entrem no mercado, e nós
não nos importamos", diz Higes Manara.
Pecegueiro, da Globosat, diz
que seu grupo não se opõe à entrada das empresas de telefonia
fixa no mercado. "É inevitável
que elas entrem, o que precisamos é que haja uma legislação
regulando esse mercado, é isso
que defendemos."
Espaço
O relator defende seu texto
das críticas. "A Globo é um "player" importante nesse mercado, sabemos disso, mas ela precisa abrir espaço para outros",
defende o relator do texto, cuja
votação deve ficar para este semestre.
Segundo os concorrentes da
Globo e da Net, essa demora só
beneficia as duas empresas, sugerindo que elas apostam no
impasse para crescer ainda
mais no setor até que a legislação seja, de fato, alterada.
Dentro do Congresso, o tema
divide os parlamentares entre
aqueles mais alinhados à Globo
e os que são ligados aos outros
grupos de comunicação, além
dos que defendem mais as teles. Ninguém arrisca uma previsão sobre a votação.
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