São Paulo, domingo, 08 de dezembro de 2002

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É preciso simplificar escolha, diz consultor

DA REPORTAGEM LOCAL

As pessoas gastam hoje não mais do que 20 minutos na cozinha, para preparar o jantar em casa. Mais precisamente, 17 minutos. Nos anos 50, eram 131 minutos. A redução ocorreu graças aos avanços da indústria na produção, um fato inegável. A questão, porém, está em como manter esse consumidor fiel às marcas e aos produtos sem sufocá-lo com centenas de novidades, diz Peter Sealey, 62, consultor da Coca-Cola e autor do livro "Marketing da Substituição". "Cerca de 44% dos lançamentos hoje são feitos apenas para as marcas manterem sua participação de mercado. É só uma atitude defensiva", diz. Leia trechos de entrevista concedida à Folha por Sealey.

 

Folha - O senhor acredita que as empresas já perceberam que o consumidor não está interessado em sair da loja estressado, em ter de escolher entre dezenas e dezenas de produtos a cada nova compra? Peter Sealey - Acredito que isso está acontecendo cada vez mais. A questão passa a ser operar com a linha de produção a toda carga apenas com produtos de alta lucratividade. Ou seja, seguir mais a linha do "faça o que vende" e não "venda o que você faz". Isso, claro, nem sempre é possível. Mas é preciso focar o negócio pensando em reduzir o estresse do cliente. Isso ocorre, em parte, simplificando o processo de escolha.

Folha - Como isso pode ser feito?
Sealey -
A Wal Mart (a maior rede varejistas do mundo), por exemplo, está experimentando nos EUA lojas com 25% do tamanho de seus grandes pontos. Eles descobriram que muitos clientes simplesmente não querem ir a uma loja com centenas de opções a cada compra.

Folha - O Brasil é um país com mercado consumidor respeitável, mas novamente está sob o fantasma da inflação e da queda na renda. Faz sentido, neste momento, colocar menos itens no mercado e simplificar a compra? Sealey - O segmento de varejo é um mercado que acompanha o crescimento demográfico. Um país com 170 milhões de pessoas indica que devem existir 50 milhões vivendo na classe média para cima. Se você está pensando em redes de varejo para esse mercado, o comportamento delas será o mesmo aplicado em outras partes do mundo, como Europa e América do Norte, independentemente de questões pontuais, como a volta da inflação.
Folha - Isso quer dizer que uma disparada nos preços não altera a política de marcas e produtos de uma empresa?
Sealey - A inflação rouba das pessoas o poder de compra. Eu acredito que o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, encontrará vontade e determinação para realizar uma reforma tributária e manter a atual política econômica. Isso porque o mercado será cruel com qualquer um que violar as leis de estabilidade econômica e produzir inflação. O problema todo está no mercado acreditar que o preço subirá no futuro e começar a antecipar a subida, elevando preços antes mesmo de os custos crescerem.

Folha - No livro "Marketing de Substituição", o senhor defende os "4 Rs" -recolocar, reposicionar, reagrupar e repor- como estratégia para fazer um produto virar sucesso. Na hora de vender uma mercadoria, em qual desses passos as empresas mais cometem erros?
Sealey -
Os erros mais comuns acontecem quando a empresa precisa reposicionar um produto. Seja para torná-lo mais acessível ou para mudar uma imagem ou conceito antigo. É esse reposicionamento correto que impede que marcas antigas morram. E tudo deve ser feito tendo na cabeça a razão pela qual um cliente decide ou não comprar um produto. Um erro aqui pode ser fatal porque a empresa está arriscando a promessa de uma marca perante o consumidor.

Folha - O senhor poderia citar exemplos? Sealey - Um exemplo é a Mercedes. Quando, em 1994, ela reduziu o preço de uma de suas linhas caras para, em média, US$ 30 mil, a empresa permitiu que mais clientes tivessem acesso à marca. E não só reduziu preço como alterou o estilo de propagada e de comunicação com o mercado.

Folha - Como é possível convencer uma empresa a simplificar, cortar linhas ou recolocar itens se o concorrente "enche" o mercado de novos produtos, um atrás do outro?
Sealey -
Nesse caso, prefiro usar um exemplo. A General Motors, nos EUA, anunciou o fim de uma de suas divisões, a Oldsmobile. A GM descobriu que cinco divisões eram demais. Ficava difícil definir uma posição no mercado para cada segmento. Com isso, pode focar o negócio nos departamentos mais lucrativos. A DaimlerChrysler também acabou com a divisão Plymouth . Ambas precisavam ficar "mais magras" e mais focadas.


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