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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS
Pacotes do Fundo não elevam o risco moral global
GILSON SCHWARTZ
ARTICULISTA DA FOLHA
E mprestar dinheiro para
devedores irresponsáveis é
um péssimo negócio e apenas
perverte o comportamento de
todos os outros devedores,
atuais ou potenciais. Em torno
dessa hipótese, conhecida como
"risco moral", gira boa parte dos
debates em torno de como funcionam os sistemas financeiros.
Ela imediatamente voltou ao
centro das atenções na semana
passada, quando o FMI e o governo dos EUA surpreenderam
o mundo com o pacote de US$
30 bilhões para o Brasil.
Não é por acaso que muitos
analistas, a começar pelos burocratas do Fundo e do governo
Bush, insistiram tanto na retórica de que o empréstimo se justifica pelo bom comportamento
do governo brasileiro e pela
qualidade de sua política econômica (supostamente melhor
que a praticada pela Argentina).
Os dados disponíveis, no entanto, desmentem que haja aumento do risco moral antes ou
depois de pacotes de resgate financeiro organizados pelo FMI.
Ao menos é o que demonstra
um estudo publicado há pouco
mais de um ano por dois técnicos da instituição ("Does IMF
Financing Result in Moral Hazard?", disponível no site
www.imf.org/external/pubs/
ft/wp/ 2000/wp00168.pdf).
Os técnicos do Fundo estudaram as taxas de juros e descobriram que, entre 1995 e 1999, apenas 2 de 22 episódios de crise financeira em que houve intervenção do FMI restam dúvidas
com relação ao risco moral.
Um dos casos duvidosos é o da
crise russa, em 1998. Os investidores, antecipando a tese de que
a Rússia era grande demais para
quebrar, foram surpreendidos
quando o FMI afinal não agiu
para evitar a moratória.
Mas a instabilidade que se espalhou pelos mercados pode ter
sido causada menos pela mudança na percepção da receita
do FMI e mais pelo puro e simples contágio da crise russa.
Na prática, os técnicos do Fundo alertam para o tamanho relativamente pequeno dos recursos do Fundo diante do tamanho das crises, especialmente
quando elas ameaçam o sistema
global. Seria ingenuidade, dizem, acreditar que a intervenção
do FMI é forte o suficiente para
mudar o comportamento dos
investidores.
Se a hipótese do risco moral
fosse verdadeira, a dispersão entre as taxas de juros tenderia a
diminuir com a montagem de
operações amparadas pelo Fundo. A existência de taxas de risco
diferenciadas é uma demonstração "dolorosamente simples" de
que os investidores não contam
com a garantia de que o FMI estará sempre disposto a intervir
para evitar a moratória.
Uma das provas mais convincentes de que o risco moral é
uma fantasia dos economistas
mais conservadores, aliás, está
na trajetória das taxas de juros
de economias consideradas
grandes demais para quebrar.
Além da Rússia, o caso mais notório é o do Brasil. Se os mercados de fato aceitassem essa tese,
as taxas de juros para créditos
oferecidos a essas economias seriam menores e nem sequer
existiriam crises de liquidez,
pois os mercados antecipariam
a intervenção supostamente saneadora do FMI.
Esse estudo é importante porque toma como base um sinal
do próprio mercado, as taxas de
juros, para desmentir a hipótese
de que o funcionamento dos
mercados torna-se menos eficiente por causa da ação de órgãos estatais.
A intervenção do FMI pode
até piorar a situação das economias que caem sob seus cuidados. Mas a evidência empírica
desmente o discurso de que os
mercados perdem racionalidade antes, durante ou depois dessa intervenção.
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