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NO VERMELHO
Empresas pedem à CVM para dividir as perdas em quatro anos e, assim, melhorar seus balanços financeiros
Escalada do dólar cria buraco de até R$ 14,5 bi
ADRIANA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
As empresas já perderam, só no
segundo trimestre, R$ 3,1 bilhões
com a escalada do dólar após a seca da moeda no mercado. Esse
montante ainda deve crescer: os
dados são dos balancetes publicados pelas próprias companhias, e
aquelas que ainda não fizeram as
contas irão entregar os números
nesta semana. Há expectativa de
que o rombo total -das 250 empresas mais negociadas na Bolsa- fique entre R$ 10 bilhões e R$
14,5 bilhões, segundo auditores
ouvidos pela Folha.
Até o momento, o buraco de R$
3,116 bilhões nada mais é do que a
diferença entre a despesa financeira que as 50 empresas que já divulgaram balanço tiveram em junho (R$ 4,438 bilhões) menos a
registrada em março (R$ 1,322 bilhão). Essa despesa total que as
companhias tiveram em junho já
bateu o recorde do acumulado em
setembro de 2001 (R$ 4 bilhões).
Os dados são da Economática.
Sempre que a dívida em dólares
de uma empresa cresce, por causa
da desvalorização do real, a companhia precisa declarar o rombo
no balanço. O crescimento desse
buraco vai parar no item "despesa
financeira" da companhia -que
ainda inclui os juros pagos sobre o
endividamento em dólar.
Havia a expectativa de que as
empresas conseguiriam a liberação de um "artifício contábil" que
pudesse livrá-las de declarar essa
perda. Elas queriam que a CVM
(Comissão de Valores Mobiliários), que fiscaliza o mercado de
ações, desse permissão para jogarem o rombo no chamado "ativo
diferido". Assim, o prejuízo não
cresceria -quanto maior a despesa, maior a chance de ficarem
no vermelho.
A idéia era abater esse buraco
em quatro anos e aos poucos, declarando 25% da perda -com a
subida do dólar- por ano. Mas
não deu certo. Até o momento a
CVM não quer saber dessa história. A Folha apurou que ainda há
a possibilidade de a comissão voltar a discutir esse tema nesta semana. E liberar o artifício -já
usado em 99 e em 2001. Enquanto
isso não sai, as empresas seguram
seus balanços. Na prática, elas
têm até a quinta-feira para apresentar os números, segundo determinação da CVM. Se o órgão
der o sinal verde, terão de alterar
os números e o prejuízo cairá.
"Isso não é nada saudável. Pode,
de forma equivocada, dar a entender que há mais empresas com a
conta em dia do que realmente
existe", diz Edson Gonçalves, diretor da Trevisan Auditores.
O tamanho do buraco
A disparada do rombo nas contas das empresas, após a decolagem do dólar, atingiu em cheio
grupos como Telefônica, Aracruz,
Votorantim, Gerdau e Klabin
-as cinco empresas com a maior
despesa financeira (em valor absoluto), segundo ranking da Economática elaborado para a Folha.
Na Aracruz a despesa bateu em
R$ 415 milhões em junho -expansão de 881,3% em relação a
março. Na Votorantim, ela passou de R$ 82,6 milhões para R$
368,8 milhões -crescimento de
272,5%. A Klabin acumulou despesa de R$ 339,1 milhões de abril a
junho. E mais de 70% do total refere-se apenas às perdas com a
desvalorização do real.
"De uma forma muito rápida, as
empresas passaram de um ganho
financeiro, em dezembro do ano
passado, quando o real se valorizou, para uma disparada na despesa financeira que ainda não se
sabe o tamanho", diz Einar Rivero, coordenador da Economática.
Três empresas de auditoria, que
pediram sigilo, estimam que o
rombo na despesa, por conta do
dólar, deve variar de R$ 10 bilhões
a R$ 14,5 bilhões no segundo trimestre. Isso corresponde apenas
aos dados de 250 empresas no
país com ações com liquidez
-ou seja, negociadas com frequência nas Bolsas.
Além dessa questão das dívidas,
ainda há outra pendência em jogo. As companhias vão ter de declarar nos balanços os calotes que
já esperam levar nesses tempos de
dinheiro curto. Trata-se da "provisão para créditos duvidosos",
item que consta nos balanços e
onde são jogadas as perdas com
clientes ou fornecedores.
Se a empresa fez uma venda e
sabe que não vai receber por isso
nos próximos meses, ela joga a
perda no item "provisão". A provisão já cresceu no caso dos bancos. Como têm dúvidas de que
pessoas jurídicas e físicas vão arcar com as dívidas, Itaú e Bradesco elevaram as provisões.
O Itaú aumentou em 32,1% e o
Bradesco em 26% no primeiro semestre, em relação a 2001.
Com medo dos atrasos no pagamento, o grupo Pão de Açúcar
elevou o valor total da provisão
em quase R$ 3 milhões do primeiro para o segundo trimestre. A Ripasa aumentou menos, em R$
500 mil, e a Rhodia em R$ 700 mil.
Entre as empresas, as de telefonia têm maiores problemas com
perdas de clientes. A Folha apurou que a TIM tem postergado a
data de recebimento de equipamentos. A empresa também fez
apenas o pagamento parcial da
compra já encomendada à Ericsson. As companhias negam.
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