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LIÇÕES CONTEMPORÂNEAS
Estabilidade e desenvolvimento
LUCIANO COUTINHO
Como conciliar prudência
e credibilidade no controle
da inflação -especialmente a
política de juros- com a obtenção de uma trajetória de alto crescimento do PIB (Produto Interno
Bruto)? Essa é, sob a égide da globalização financeira, a questão-chave para os países em desenvolvimento. As pistas para uma resposta poderão ser encontradas
nos debates da 11ª Unctad (Conferência das Nações Unidas sobre
Comércio e Desenvolvimento)
que se realiza nesta semana em
São Paulo.
A observação de muitos exemplos bem e malsucedidos por parte dos economistas da Unctad indica que, para alcançar juros
reais baixos, expansão do PIB e
inflação sob controle, é imprescindível ter uma taxa de câmbio
"credivelmente estabilizada" e finanças públicas saudáveis (isto é,
endividamento público sob controle, bem estruturado).
O que significa ter uma taxa de
câmbio credivelmente estabilizada? Significa reunir duas condições: 1) resultados do balanço de
pagamentos (posição da conta
corrente, nível de reservas) objetiva e indiscutivelmente sustentáveis e sólidos e 2) baixa volatilidade da taxa de câmbio (sob flutuação administrada).
Essas condições serão alcançadas somente se a taxa de câmbio
for suficientemente depreciada
para gerar exportações firmemente crescentes e para produzir
um superávit persistente em conta corrente (ainda que de pequena monta). Vale dizer: um superávit que dê curso a um processo
de redução do endividamento em
moeda estrangeira, com robustecimento progressivo da posição
externa do país -o que resultará
em queda substancial e persistente da taxa de risco-país.
Somente nas condições acima é
possível conciliar a estabilidade
com um alto crescimento do PIB.
Pois, do contrário, se a posição externa é frágil e o déficit em conta
corrente é elevado, a taxa de câmbio tende a ser altamente volátil
e, portanto, causadora de incertezas e de choques ou inflacionários
ou deflacionários.
Esses choques, porém, não são
simétricos. Os choques inflacionários, freqüentes, causados por depreciações cambiais nas economias com moedas fracas são, em
geral, desestabilizadores das expectativas e exigem que os bancos
centrais ajam com uma firmeza
dissuasória mais que proporcional, aumentando agressivamente
a taxa de juros.
Se a posição externa continua
frágil, eventuais choques deflacionários não propiciam efeitos tão
elásticos que permitam aos bancos centrais reduzir significativamente as taxas de juros. É essa a
constatação do BIS (Banco de
Compensações Internacionais)
em recente balanço da política
monetária feito em um conjunto
de países em desenvolvimento (*).
Em resumo, em condições de
vulnerabilidade externa, a política monetária fica incontornavelmente onerosa, pois precisa, obrigatoriamente, buscar atenuar as
pressões depreciadoras da taxa de
câmbio através de juros reais altos, o que, por sua vez, contém o
crescimento e tende a corroer a
sustentabilidade da dívida pública.
Com efeito, se a trajetória da taxa de câmbio tende a ser volátil,
dívidas, ativos e contratos indexados à taxa de câmbio (ou denominados em moeda estrangeira)
passam a carregar uma alta dose
de incerteza e isso se traduz em
um elevado diferencial de risco-país. Há que considerar ainda os
efeitos disruptivos sobre as expectativas de inflação.
Assim, embora os regimes de
metas de inflação não o admitam
explicitamente, os bancos centrais não podem deixar de ter um
olho permanentemente voltado
para a taxa de câmbio. A tentação de estabilizá-la artificialmente é sempre onerosa: 1) se isso for
feito através de juros altos, a economia estagna; 2) se for feito
através da moratória ou de controles infligidores de perdas aos
investidores, a reação dos mercados será implacável. A única maneira eficaz é construir uma robustez consistente da posição externa que enseje a estabilização
da taxa de câmbio (em bases pró-exportadoras) e da taxa de inflação, viabilizando juros reais baixos e crescimento acelerado.
A economia brasileira ainda se
encontra no início do caminho
nessa empreitada. A sustentação
de um forte desempenho exportador nos próximos cinco anos é imprescindível, pois só assim serão
obtidos indicadores robustos de
solvência externa, que permitirão
rebaixar substancialmente a taxa
de risco-país, o que viabilizará a
queda expressiva e duradoura da
taxa de juros e induzirá à melhoria da estrutura da dívida doméstica.
Para chegar a esses objetivos
(que, afinal, conciliam uma política monetária sólida com o desenvolvimento acelerado), nossas
autoridades econômicas precisarão evoluir para uma visão estratégica. Lições poderão ser extraídas da 11ª Unctad em matéria de
competitividade e de indução de
investimentos. As políticas industrial, tecnológica, regional, financeira e de mercado de capitais,
bem como as condições institucionais e de regulação estão no núcleo dessa agenda.
(*) Vide "BIS Working Papers" nº 149
-"Monetary policy rules in emerging
market economies: issues and evidence", por M.S. Mohanty e Marc Klau.
Luciano Coutinho, 54, é professor titular do Instituto de Economia da Universidade de Campinas (Unicamp). Foi secretário-geral do Ministério da Ciência e
Tecnologia (1985-88).
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