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Grão inflaciona cerrado do Piauí
MAELI PRADO
ENVIADA ESPECIAL A URUÇUÍ (PI)
A jornada é árdua. São 550 km
partindo de carro da capital, Teresina, em direção ao sul do Piauí,
passando pelo Maranhão. No caminho, vacas assustadas cruzando rodovias, solavancos em estradas de terra e uma viagem de balsa para atravessar o rio Parnaíba,
que separa os dois Estados.
Do outro lado, surge Uruçuí,
município de estimados 25 mil
habitantes escondido no cerrado
piauiense, onde há cerca de quatro anos o único movimento era o
de bicicletas e carroças puxadas
por jegues em ruas de terra.
Hoje, oito lojas de material de
construção, 13 farmácias, quatro
hotéis, cinco armazéns, duas revendedoras de motos e uma
quantidade razoável de carros e
caminhões circulando por ruas
asfaltadas movimentam a cidade.
Morar lá custa caro. Uma casa
em um terreno de 300 m2 no centro pode custar R$ 60 mil. Em 99,
bastavam R$ 5.000, em média.
A explicação para a transformação em curso aparece quando se
rodam mais alguns quilômetros,
onde ficam as fazendas que, juntas, cultivam 180 mil hectares de
soja na região. Área que deve aumentar, pois produtores chegam
ao local todos os dias.
O mesmo impulso que muda a
cara de outros municípios ligados
ao agronegócio e que em Uruçuí
ganhou ímpeto extra por causa da
gigante do grão Bunge, que se instalou na cidade em 2003.
A multinacional, com capacidade para esmagar 658 mil toneladas do grão por ano -até 2007, o
número aumentará para 1,3 milhão-, emprega hoje 141 pessoas.
A maioria das vagas aparece indiretamente, no aquecido comércio local, onde há espaço para se
estabelecerem de lojas de trator a
uma franquia do Boticário.
Em 2000 foram abertas sete empresas em Uruçuí, segundo dados
da Junta Comercial do Piauí. Nos
anos seguintes, a quantidade disparou: em 2001, 103; em 2002, 141;
em 2003, 185 empresas, a maior
parte em comércios e serviços.
O objetivo é atender à crescente
demanda dos "gaúchos" -como
são chamados na cidade os migrantes de qualquer Estado que
chegam à cidade- e dos filhos
pródigos de Uruçuí, nativos que
há anos deixaram o município à
procura de trabalho ou educação
e que retornam agora.
É um ciclo que, em uma cidade
pequena, localizada em uma região que ainda está sendo desbravada, é possível acompanhar de
perto. Quem chega, além de algumas vezes gerar empregos diretamente, precisar construir, consumir ou reformar.
Quem é morador vê a possibilidade de abrir uma pequena loja,
prestar serviços, ganhar mais com
um negócio já estabelecido ou trabalhar para comerciantes e prestadores de serviço. Também passa a consumir mais -até pelo
acesso a produtos diferenciados.
O armazém Paraíba, por exemplo, uma espécie de Casas Bahia
da região Nordeste, chegou há
cerca de 25 anos na cidade. Vendia eletrodomésticos e móveis da
linha popular. Hoje, há demanda
por geladeiras dúplex e por aparelhos de som de R$ 3.300.
O crescimento ainda é incipiente, mas a grande aposta é no futuro da região, novíssima fronteira
agrícola: são extensas áreas planas
-que reduzem custos na hora do
plantio e colheita mecanizados-
e preços de terra mais baixos, apesar da recente valorização.
A Bunge, por exemplo, se instalou na cidade de olho no consumo
do mercado nordestino, para onde pretende fornecer farelo e óleo
de soja em larga escala. Atraiu
também a proximidade do porto
de São Luís (MA), que permite escoar a produção para a Europa.
Nem tudo, no entanto, são flores. Muitos moradores da cidade
estão desempregados e sofrem
com os preços inflacionados pelo
desenvolvimento da região e pela
falta de infra-estrutura para atender à população crescente.
Além disso, a Bunge, que foi beneficiada com isenção de ICMS
por 15 anos no Estado, está em litígio com ambientalistas e com o
Ministério Público, que a acusam
de devastar árvores na região para
fazer funcionar suas caldeiras.
Para a empresa, a quantidade de
lenha consumida está dentro das
normas permitidas pelos órgãos
de regulação ambiental.
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