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LUÍS NASSIF
Um dos brasileiros do século
O mundo antigo consagrou
algumas profissões que o
mundo moderno derrogou.
Outras que surgiram e desaparecerão -algumas por serem
supérfluas, outras por serem essenciais, essas sufocadas pelo
universo de irrelevâncias que
compõe o pensamento contemporâneo.
No Rio de Janeiro mora uma
dessas figuras que podem ser
chamadas de essenciais, adepta
de uma profissão raríssima, e
que tende à extinção: a de construtor de uma nação, exercício
ao qual se dedica diuturnamente há quase 50 anos, mesmo nunca tendo se ocupado da atividade política.
Perto de seus 80 anos, o velho
senhor surpreende não apenas
pelo fato de falar nove idiomas,
dominar da língua japonesa ao
grego clássico, mas pela capacidade de entender seu analisado,
o Brasil.
Com olhos espertos, mesmo
afetados por uma trombose, e
com pálpebras algo carregadas
pela idade, com cabelos brancos
um tanto revoltos, ele lembra esses sábios intemporais da saga
narrada no livro "Senhor dos
Anéis".
Poucos brasileiros vivos ou
mortos -um Barão de Mauá
aqui, um Vargas do segundo governo acolá- conseguiram ao
mesmo tempo pensar o Brasil estrategicamente de maneira tão
completa, avançada e pragmática, e deixar um legado de realizações tão significativo.
Nova solução
Que mané Michael Porter! O
norte-americano consagrou-se
como a maior voz do pensamento desenvolvimentista contemporâneo, mas perto do velho
mestre não passa de um compilador de experiências bem-sucedidas de terceiros, que tenta replicar pelo mundo afora.
Nada de minimizar seu papel,
mas o velho mestre está atrás e
acima disso: é o construtor da
experiência original, da nova solução.
Na sala que lhe é reservada na
Federação das Indústrias do Rio
de Janeiro (Fierj), Eliezer Batista
estende o mapa do Brasil e vai
mostrando os eixos de desenvolvimento, as idéias do desenvolvimento sistêmico e integrado que
agregou ao debate nacional.
É o autor dos conceitos que resultaram no "Avança Brasil" e
que, agora, estão sendo debatidos por todos os governos dos
países da América do Sul, para a
integração econômica do continente.
A bíblia é seu livro "Infra-Estrutura para o Desenvolvimento
Sustentado e a Integração da
América do Sul".
Não demonstra corujice de pai
exibindo crias brilhantes.
Apenas relata, como se tudo
fosse normal, como se fosse natural a um funcionário público do
setor de mineração deixar uma
obra diplomática -a aproximação Brasil-Japão nos anos
70- sem paralelo na moderna
diplomacia nacional, tendo como ferramenta apenas o fato de
dirigir a então pequena Vale do
Rio Doce.
O Japão tinha dinheiro e tecnologia, mas havia resistência
das grandes potências em permitir a construção de uma grande
siderurgia.
O Brasil tinha minérios, mas o
minério ficava do outro lado do
porto, e o Japão do outro lado do
mundo, tornando o custo da
operação inviável.
O então jovem mestre resolveu
a equação melhorando a logística interna nacional e convencendo os japoneses a construir
navios de grande calado que pudessem levar minérios e trazer
petróleo.
O Japão se tornou potência
mundial, a Vale do Rio Doce se
transformou em uma das maiores mineradoras do mundo e dona da segunda maior frota mercante do planeta.
Mais tarde, Eliezer introduziu
em Carajás o conceito do desenvolvimento sustentável, a primeira experiência internacional
na matéria.
Depois, em plena agonia do
governo de Fernando Collor,
trouxe para o planejamento público a noção de desenvolvimento integrado.
Resistências
O primeiro fruto dessa nova
concepção foi uma estrada asfaltada ligando Manaus a Puerto
La Cruz, no litoral venezuelano,
no leito da qual passa a linha de
transmissão que poderia ligar a
barragem de Guri, na Venezuela, a Manaus, e que acabou em
Boa Vista por conta dos interesses paroquiais do governador
Amazonino Mendes.
Em breve as obras transformarão Roraima em uma nova Paraná, além de dar vazão aos produtos da Zona Franca de Manaus (AM).
Para chegar a esse ponto, para
superar as resistências regionais,
estaduais e nacionais, Eliezer
montava projetos levando em
conta aspectos geoeconômicos
(tratando regiões sem levar em
conta as suas fronteiras estaduais e nacionais) e comparava
com os geopolíticos (com cada
planejamento sendo feito sem sinergia, restrito a cada um dos
Estados).
Depois mostrava as duas contas para os governantes, como
uma forma de convencê-los a
aderir à integração.
Nos anos 70 ajudou a mudar a
navegação e a redefinir a siderurgia mundial.
Em 2002, pretende criar a infra-estrutura para o comércio
eletrônico. Aos 78 anos, ficou
viúvo de sua esposa, mas continua casado com o Brasil.
E-mail -
lnassif@uol.com.br
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