|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS
Ortodoxia econômica some sob o peso da crise global
GILSON SCHWARTZ
ARTICULISTA DA FOLHA
"Não somos neoliberais,
nunca fomos", afirmou
o ministro da Fazenda, Pedro
Malan, em debate na sexta-feira
organizado pelo BNDES, no Rio
de Janeiro.
Entre os economistas estrangeiros também ganham força as
visões ultracríticas de nomes como Joseph Stiglitz, que chegou a
denunciar o baixo nível educacional de técnicos do FMI e do
Bird e nos últimos anos aderiu a
uma campanha permanente de
denúncia do Consenso de Washington (que reuniria as tais políticas neoliberais).
Será o caso de declarar o economista liberal ortodoxo uma
espécie em extinção?
O fato é que parece ter surgido
um outro consenso, antiliberal.
Os efeitos da crise global sobre
os países em desenvolvimento
são tão dramáticos que os defensores das políticas neoliberais e mesmo alguns dos que colaboraram com a sua execução
tornaram-se invisíveis ou mudaram de discurso.
Uma leitura um pouco mais
detalhada das notícias, no entanto, ajuda a desfazer um pouco essa impressão. No BNDES,
por exemplo, Malan teria dito
sobre política industrial que é
"perda de tempo definir o que é
isso".
O importante, teria dito o czar
da economia do real, é evitar o
retorno a políticas do passado,
como emprestar "dinheiro a
empresários com taxas de juros
bem inferiores à inflação, criando até mesmo o gosto das empresas pela política inflacionária".
O ministro da Fazenda usa
muito a palavra "eficiente". O
BNDES, afirma, faz uma "política eficiente de investimentos".
Não interessa a Pedro Malan o
que significa "política industrial", mas a defesa de um "Estado eficiente".
Observei, ao longo dos últimos 20 anos de jornalismo econômico nesta Folha, várias ondas, pacotes e modas no debate
econômico, sempre criticando o
consenso ultraliberal. Entretanto, diante desse novo consenso
antiliberal, arrisco uma defesa
das preocupações da ortodoxia.
O principal argumento dos
economistas que não têm vergonha de criticar a ação do Estado
ou de defender as virtudes dos
mercados é o que alerta para a
falta de critérios objetivos ou
neutros para a ação do Estado.
Nada seria mais eficiente que o
sistema de preços para orientar
as decisões privadas de investidores e consumidores.
O Plano Real, por exemplo, tinha como objetivo central garantir ao sistema de preços um
funcionamento mais eficiente.
A correção monetária era uma
regra, imposta pelo Estado, que
impedia o funcionamento eficiente dos mercados.
Outras medidas, sempre no
sentido de desestatizar a economia, também atenderam prioritariamente a esse objetivo de garantir que o sistema de preços,
influenciado pelas forças do
mercado, ganhasse eficiência.
Resta saber se é possível falar
de Estado eficiente como contraponto ao ideário neoliberal.
Nesse ponto, entretanto, interessa discutir o conceito de eficiência do Estado. Qual o significado, quais os indicadores de
eficiência da ação do Estado?
No caso da política industrial,
por exemplo, é impossível encontrar uma definição e mesmo
indicadores de eficiência objetivos. Trata-se de estratégias,
sempre subjetivas, ligadas a interesses e projetos políticos.
Ao defender a eficiência do Estado sem admitir a discussão do
que afinal se entende por política industrial, o ministro Malan
entra em contradição. Não há
como dizer se o Estado é eficiente sem debater os critérios subjetivos de sua ação, como sempre
alertaram, acertadamente, os
autênticos e ortodoxos liberais.
Texto Anterior: Lições contemporâneas: A globalização como ela foi Próximo Texto: Luís Nassif: O presidente bossa-nova Índice
|