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Piora de cenário atrai
profecia auto-realizável
ÉRICA FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL
Em outubro de 2001, após os
atentados terroristas nos Estados
Unidos, o mercado financeiro
brasileiro viveu crise parecida
com a atual. Mas estimativas feitas recentemente sobre o desempenho da economia este ano estão
longe do cenário dramático traçado naquela época. O que preocupa, porém, é a piora de previsões,
como a que aponta juros reais
médios de 11,87% para 2002.
Isso mostra que: 1) o mercado
financeiro tem exagerado, 2) começa a surgir o risco de que esse
exagero redunde em um cenário
econômico de fato pior. É a chamada profecia auto-realizável.
As conclusões foram tiradas por
economistas ouvidos pela Folha
com base em dados de um estudo
do BBV Banco. O departamento
de análise econômica do BBV no
Brasil está traçando uma evolução das estimativas semanais feitas por analistas desde o início do
ano passado, que são coletadas
pelo Banco Central.
Os gráficos com a evolução dos
dados podem surpreender quem
se sente inspirado a comparar o
que se passa agora com o que
aconteceu depois dos ataques terroristas do ano passado.
Afinal, o risco-país brasileiro
-indicador dos juros que o governo paga para conseguir empréstimos fora- ultrapassou
1.300 pontos na última sexta-feira,
nível maior que o alcançado em
outubro de 2001. O dólar rondou
os R$ 2,80, como naquela época.
Mas as estimativas para indicadores econômicos estão longe do
fundo do poço que atingiram no
segundo semestre de 2001. A atual
previsão dos economistas para o
PIB (Produto Interno Bruto) em
2002 é de 2,23%. Em outubro do
ano passado, chegou a 1,84%.
A previsão para a taxa de juros
básicos caiu de 17,38% em outubro para 16,96% no último dia 7.
A inflação é exceção, esperava-se
no ano passado número inferior
que o projetado atualmente.
"Em outubro, o Brasil enfrentava um cenário pior de deterioração, mas a economia acabou reagindo. Agora, nossos fundamentos estão muito melhores", diz o
economista Fernando Barbosa,
do BBV Banco.
A diferença, explicam economistas, é que, depois dos atentados às torres gêmeas, existia uma
ameaça real à economia brasileira. Crescia a certeza de que os Estados Unidos entrariam em recessão, o país ainda vivia os efeitos
do racionamento de energia e a
crise na Argentina se acentuava.
Agora, o pânico do mercado se
explica pelo receio de que Luiz
Inácio Lula da Silva, candidato do
PT à Presidência, ganhe as eleições e não honre os pagamentos
de juros da dívida do governo.
O medo é reforçado pela composição perigosa da dívida interna, corrigida principalmente por
juros pós-fixados e câmbio e sujeita, portanto, a aumentar sempre que esses indicadores sobem.
"O comportamento do mercado está muito descolado da realidade", diz Alexandre Schwartsman, economista-chefe da BBA
Corretora. "O desempenho do
balanço de pagamentos melhorou e a inflação começava a ceder", afirma Schwartsman.
Mas o que preocupa os economistas é o risco de que os exageros
do mercado, que levaram dólar e
risco-país a dispararem, acabem
em fundamentos, de fato, piores.
Principalmente em um ano em
que as expectativas para a economia já não eram das melhores.
Um sinal disso era a estimativa
dos economistas do mercado na
semana passada para os juros
reais (descontada a inflação) médios para este ano. A expectativa é
de que fiquem em 11,87%, contra
a taxa atual próxima a 10%.
"Os juros reais subirão pois a inflação está caindo, mas a crise reduziu a margem para corte de juros", diz Sandra Utsumi, economista-chefe da BES Securities.
Segundo a economista, a atividade econômica, que já anda lenta, tende a se contrair ainda mais
com os juros reais em alta. Ela já
considera rever sua projeção de
crescimento do PIB para este ano
de 2,1% para 1,5%, caso o BC
mantenha a taxa de juros inalterada em sua reunião desta semana.
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