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DEPOIS DO CALMANTE
Analistas consideram que dívida é sustentável, mas há incerteza quanto à atitude do novo governo
Dúvida da dívida assola investidor comum
SANDRA BALBI
DA REPORTAGEM LOCAL
Nas duas últimas semanas o cidadão comum, que aplica suas
economias em fundos DI e de
renda fixa, amargou a perda de
0,5% e 1,25%, respectivamente,
em suas aplicações. Foram para o
ralo R$ 3,5 bilhões desde o dia 29
de maio até o último dia 12.
Muitos, assustados, sacaram
seus investimentos assaltados pela dúvida que já tomava analistas
financeiros: a dívida interna é sustentável? O novo governo dará calote na dívida?
Ouvidos pela Folha, alguns desses analistas afirmam: não há a
menor chance de calote ou reestruturação da dívida, ganhe quem
ganhar as eleições. "A dívida pública é perfeitamente manejável",
afirma Walter Mundel, economista e consultor financeiro.
Por que, então, a histeria dos últimos dias? É que a dúvida da dívida chegou ao cidadão comum.
Há uma máxima no mercado financeiro: quando o jornaleiro começa a discutir a cotação das
ações, é hora de vender.
Foi o que aconteceu nos últimos
dias com os investidores dos fundos DI. Eles descobriram que os
ganhos de 243,28% obtidos desde
1996 foram proporcionados pelos
títulos da dívida mobiliária do governo, que há tempos preocupa
analistas locais e internacionais,
mas que eles ignoravam.
A dívida mobiliária federal, o
papelório do governo em poder
do mercado, corresponde hoje a
48,3% do PIB. Somada à dívida
externa líquida e à dívida não mobiliária, o endividamento total do
governo corresponde a 54,5% do
PIB, segundo dados do BC.
Os investidores de fundos e participantes de fundos de pensão
são os principais credores desse
papagaio. Esses investidores detêm 35,7% da dívida mobiliária
interna do governo federal.
Nas últimas semanas, eles conheceram a volatilidade (oscilação) das LFTs (Letras Financeiras
do Tesouro), os papéis que até então eram garantia de ganhos polpudos e estáveis das suas aplicações, e descobriram que não há
porto seguro para investimentos.
E passaram a temer um calote.
Efeito Orloff
Os analistas consultados pela
Folha descartam a possibilidade
de ocorrer um calote, ou uma megatroca de títulos públicos, como
fez o ex-ministro Domingo Cavallo na Argentina, forçando uma
reestruturação da dívida em condições desfavoráveis aos credores.
Há razões técnicas para tal crença."Nem o tamanho nem o prazo
da dívida é problema, o problema
é saber se existe uma política fiscal
que financie o pagamento dos juros", observa Mundel.
Se o novo governo mantiver o
superávit primário no patamar
atual, de 3,75% do PIB, terá bala
para continuar rolando a dívida.
Para Walter Mendes, diretor da
Schroder Investment Brasil, não
existe risco de explosão da dívida
se houver um mínimo de estabilidade. Uma conta que costuma ser
feita pelos analistas para demonstrar que a dívida pública é sustentável mostra que, com uma taxa
de juro real de 10% ao ano, como a
atual, é preciso um crescimento
de 3% do PIB e um superávit primário de 3,6% do PIB para manter a atual relação dívida/PIB.
Se reduzir o juro real para 9% ao
ano e houver um crescimento de
2% no PIB, é preciso um superávit
primário de 3,7% do PIB para
manter a dívida estável. "Mas,
nessa simulação, se o PIB crescer
4% em vez de 2%, a dívida cai no
longo prazo", diz Mendes.
Na sua opinião, o medo da dívida decorre de seu tamanho, do
baixo crescimento do PIB e dos
juros altos. Além disso, há a indefinição dos candidatos de oposição sobre como tratarão a dívida.
Rejeição do governo
O receio dos analistas é que,
apesar de controlável, a dívida
mobiliária comece a ser rejeitada
pelos credores caso as oposições
não dêem sinais inequívocos de
que honrarão os pagamentos. No
limite, estaremos rolando a dívida
diariamente, no overnight, a partir de agosto ou setembro.
Se as tensões atuais não forem
desarmadas, "o mercado poderá
requerer um juro elevado na rolagem da dívida no início de 2003",
diz Octávio de Barros, economista-chefe do BBV Banco.
A hipótese de a nova equipe
econômica não aceitar pagar os
juros pedidos pelo mercado, segundo ele, lembra a troca de dívida feita pela Argentina.
"Se isso ocorrer, o risco Brasil
irá para perto de 2.000 pontos, as
agências de risco rebaixarão o "rating" do país, o crédito externo secará, haverá fuga de investimentos diretos, pressão cambial, pressão inflacionária, juros altos, crescimento medíocre", diz Barros.
Para Gabriel de Moura, diretor
do Banco1.net, "a pior situação
seria uma "renegociação involuntária" da dívida, como na Argentina". Na sua opinião, se o mercado
não aceitar as condições de rolagem da dívida do novo governo, a
saída seria ele resgatar os títulos,
trocando parte da dívida por
moeda, o que geraria inflação. "O
calote está descartado; o governo
perderia credibilidade e não conseguiria mais se financiar."
Há analistas que sonham até
com o impensável para acalmar o
mercado. Para Vladimir Caramaschi do Vale, analista da corretora Fator Dora Atherino, é preciso um pacto político entre o governo e o PT em torno de medidas
fiscais fortes.
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