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VEÍCULOS
Presidente da montadora no Brasil quer transformar empresa em plataforma exportadora; ociosidade chega a 40%
Volks pede fim gradual da isenção do IPI
GUILHERME BARROS
EDITOR DO PAINEL S.A.
Há um ano na presidência da
Volkswagen do Brasil, o inglês
Paul Fleming, 43, não acredita numa grande recuperação da economia em 2004, apesar dos sinais
positivos dos últimos meses. "A
economia se estabilizou num nível baixo", afirma.
Fleming teme o fim da redução
do IPI (Imposto sobre Produtos
Industrializados) dos automóveis, previsto para este mês. Ele
propõe ao governo que a volta ao
IPI antigo seja feita de forma gradual, com aumento de um ponto
percentual ao mês.
O executivo diz que a Volkswagen investiu muito nos últimos
anos e agora precisa preencher a
capacidade ociosa. "Ficamos esperando pelo sonho brasileiro e
ele não veio." A seguir, trechos da
entrevista à Folha:
Folha - Como foi seu primeiro ano
no Brasil?
Paul Fleming - Do ponto de vista
pessoal e mesmo profissional, eu
diria que foi um ano instigante.
Ao mesmo tempo, foi também
um ano frustrante. A Volkswagen
do Brasil acreditava que, neste
ano, fosse ter uma operação com
resultado positivo. Mas três coisas
aconteceram, e isso não se realizou: 1) o mercado interno de automóveis foi o menor em dez
anos; 2) as taxas de juros se mantiveram artificialmente altas; 3) e o
câmbio se mostrou muito instável, em especial no começo do
ano. Se não fossem esses três fatores, estaríamos fechando o ano no
azul. Como não estamos fazendo
dinheiro, tivemos de reestruturar
nosso negócio profundamente.
Folha - Como anda a relação da
Volkswagen com o governo?
Fleming - Eu costumo não fazer
comentários sobre o governo. O
governo faz a parte dele, e nós, a
nossa. O presidente Lula sabe exatamente o que fazer, assim como
nós sabemos produzir carros. É
claro que, quando temos projetos
novos, falamos com o governo e
mostramos nossas idéias. Foi assim com a Autovisão [empresa
criada para realocar funcionários
excedentes e dar formação para
desenvolvimento de novas oportunidades de negócios]. Lula foi a
primeira pessoa fora da Volkswagen a saber do projeto no Brasil.
Folha - A economia melhora?
Fleming - A economia se estabilizou num nível baixo. Há quatro
meses, pouco mais que isso, atingimos essa condição, o que é fantástico, mas infelizmente nesse nível baixo. Há muitos sinais positivos no cenário. O câmbio está
num nível realista, a Selic provavelmente cairá ainda mais nas
próximas semanas, mas o mercado interno de carros não está se
recuperando. Há quem preveja
uma recuperação grande, projetando mais de 10%, até 15% de
crescimento para o próximo ano.
Mas não vemos esses sinais no varejo e preferimos manter os pés
bem plantados no chão, calculando que o crescimento será de 3%
ou 4%. O mercado tem muito a
ver com a confiança do consumidor no futuro. As pessoas estão
voltando lentamente às compras.
Folha - Há lugar para tantas montadoras no Brasil?
Fleming - Em princípio, não.
Nós entendemos isso há alguns
anos, e essa é a razão de a Volks
estar criando no Brasil uma plataforma exportadora muito forte.
Hoje, exportamos um terço dos
nossos carros. Em 2005, um em
cada dois veículos será exportado.
Nós vamos exportar 160 mil carros neste ano, o mesmo que todas
as outras montadoras somadas. A
capacidade ociosa chega a 40%.
Parece que todo mundo ficou esperando pelo "sonho brasileiro",
algo como "amanhã o sol vai nascer e tudo vai melhorar". Na
Volks, ficamos seis anos esperando por esse dia e ele não veio.
Folha - O governo pode ajudar?
Fleming - Sim, basicamente gerando confiança nos consumidores e nos mercados. Para decidir
investir em um carro, um bem
que custa mais de R$ 15 mil, é preciso confiança no futuro. É por isso que períodos de recessão nos
afetam tão duramente.
Folha - A Volkswagen tem planos
de novos investimentos no Brasil?
Fleming - Há alguns meses, o
ministro [Antonio] Palocci [Filho, da Fazenda] disse que a volatilidade do real estava resolvida,
os juros estavam caindo e a inflação estava sob controle. Com a
economia estabilizada, dizia ele,
era chegada a hora de investir no
Brasil. Eu concordo. Ocorre que a
Volks já investiu, e muito, nos últimos anos. Agora, temos de
preencher a capacidade ociosa. A
situação favorece a que outras indústrias realmente invistam no
Brasil. Investimos de R$ 450 milhões a R$ 500 milhões anualmente nos últimos seis anos. O que investirmos daqui em diante será
em produtos, e não em instalações, porque esse investimento
está feito. Essa é a filosofia agora.
Folha - A redução do IPI, de três
pontos percentuais, ajudou a vender mais?
Fleming - Sim, um pouco. E isso
vai criar um problema quando
acabar, agora em novembro. Seria
uma boa idéia, em vez de simplesmente voltar ao IPI de antes, fazer
isso em degraus: dezembro, janeiro e fevereiro, por exemplo, um
ponto percentual ao mês. Se o governo puder manter a redução,
melhor ainda. Vamos ver como
fica. O fato é que os impostos sobre os carros são, no Brasil, maiores do que em qualquer outro lugar do mundo. Se o governo reduz a taxação, vendemos mais.
Folha - O sr. conversa com o governo sobre a reforma tributária?
Fleming - Bem, sabemos que os
impostos sobre veículos não são a
coisa mais importante da agenda
de Lula. Mas, uma vez, o encontrei em um evento em São Paulo e
ele me disse que gostaria de ver as
ruas do país, um dia, cheias de
carros novos. O presidente entende que o setor precisa de ajustes e
ele sabe bem quais são eles, acredito. O presidente conhece nosso
negócio. Sabe que as pessoas não
compram carros novos porque
não podem. Carros novos na rua
significam que a economia vai
bem, significam prosperidade.
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