São Paulo, domingo, 18 de abril de 2004

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ARTIGO

É hora de dar fim à farra dos juros baixos

FLOYD NORRIS
DO "NEW YORK TIMES"

Alan Greenspan levou a melhor sobre seus críticos. O único teste que resta é determinar se ele conseguirá reconduzir as taxas de juros a um nível normal sem causar dor excessiva. Infelizmente para o presidente do Federal Reserve (banco central dos EUA), os mercados talvez não estejam dispostos a lhe conceder o prazo de que ele gostaria de dispor para executar a tarefa.
No final dos anos 90, Greenspan ignorou a bolha das ações de tecnologia. Em 96, resmungou alguma coisa sobre a "exuberância irracional", mas logo mudou de idéia e passou a elogiar a nova economia. Quando a loucura chegou ao pico, em 2000, citava, com alegria, projeções absurdas dos analistas de Wall Street.
Quatro anos passados, o medo da deflação e de uma desaceleração prolongada foi derrotado completamente. Assim, por que os investidores não estão comemorando? Por que indícios de uma economia em florescimento prejudicariam as commodities?
Uma resposta é que o Fed manteve as taxas de juros tão baixas por tanto tempo que um volume considerável de especulação lastreada por dívidas se acumulou no chamado "comércio de carga", que leva esse nome porque os lucros esperados são mais que suficientes para carregar o custo dos empréstimos tomados para financiar a transação.
Isso é especialmente aplicável aos títulos públicos, mas vale também para ações, operações de câmbio e commodities. Os bancos e os fundos de hedge parecem estar envolvidos em um grande volume de transações de carga.
Os bons números econômicos lembraram os operadores de que os juros têm de subir um dia. Os investidores endividados parecem estar reduzindo suas posições em todos os mercados, do cobre ao câmbio.
O relatório sobre a inflação indicou que a alta nos preços das commodities começa, finalmente, a ser repassada. A inflação mais alta vinha ocorrendo em áreas não sujeitas à concorrência internacional. Mas, agora, os preços estão crescendo até mesmo em áreas onde estavam em queda até recentemente.
Discursos de diretores do Fed desconsideraram a inflação, e será interessante verificar se isso começará a mudar. "Eles vão enfrentar um sério problema de credibilidade, se não reconhecerem que existe mais inflação do que esperavam", diz Roger Kubarych, economista do HBV Group.
Ao manter taxas inferiores à inflação, Greenspan sustentou a economia, mesmo que isso acarretasse o risco de estimular a especulação. Parte do aumento nos preços do cobre se deve à demanda crescente. Mas outra parte se relaciona à especulação.
De maneira semelhante, a busca por melhores rendimentos permitiu que empresas e países com históricos dúbios de crédito captassem dinheiro a baixo custo. Uma taxa de 2,5%, bem acima do 1% atual, pode se provar razoável. Isso não acontecerá rapidamente, mas crescem as especulações de que o Fed terá de começar a elevar os juros antes de novembro.
É preciso que o Fed comece a alterar as expectativas para que as transações especulativas possam ser liqüidadas sem causar danos. "O último truque que Alan Greenspan terá de executar será elevar a taxa sem que, com isso, as pessoas tenham de deixar de viver felizes para sempre", diz Robert Barbera, economista-chefe da corretora ITG/Hoenig.


Tradução de Paulo Migliacci


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