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Fluxos excessivos de investimentos de curto prazo são vistos como perigosos para economias em desenvolvimento
Debate sobre controle de capital ganha força
ÉRICA FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL
A apreciação do real nos últimos meses ressuscitou no Brasil o
debate sobre a eficiência de controles de capital e mecanismos de
intervenção cambial em mercados emergentes.
Tem crescido no país a defesa,
até por partidários da ortodoxia,
da adoção de medidas que evitem
uma valorização cambial excessiva causada pela entrada de capitais de curto prazo.
Essas discussões acontecem
quase paralelamente a semelhante debate no exterior.
Até ícones da ortodoxia mundial, como a revista britânica "The
Economist" e o economista John
Williamson -pai do receituário
liberal conhecido como Consenso
de Washington- vieram a público recentemente retificar sua antiga posição contrária à intervenção e aos controles de capital.
Ainda que persistam várias divergências entre pensamentos ortodoxos e heterodoxos em relação
a esse assunto, o debate deve se
manter em evidência por um
bom tempo. Ao menos enquanto
persistir a impressionante tendência de volta de capitais especulativos para países emergentes.
Dados da consultoria AMG Data mostram que, neste ano até a
última sexta-feira, os hedge funds
dedicados a investir em mercados
emergentes contabilizavam captação líquida de US$ 1,93 bilhão.
O número é quatro vezes superior
ao registrado em todo o ano passado, sendo que em 2000 e 2001 a
captação havia sido negativa.
Investimentos volumosos deveriam ser motivo para comemoração, não para queixa, certo? Ao
menos o receituário liberal pregou durante muitos anos a seguinte tese: embora quanto mais
longo melhor, todo e qualquer
fluxo de capital é bom. Isso inspirou a abertura do mercado de capitais em vários países em desenvolvimento, como o Brasil, no início dos anos 90.
Mas experiências seguidas de
crises financeiras em mercados
emergentes modificaram bastante essa percepção. Hoje, de forma
geral, fluxos excessivos de investimentos de curto prazo são vistos
como perigosos para economias
em desenvolvimento.
Em um mundo globalizado em
que capitais circulam livremente e
podem se deslocar de um país a
outro num piscar de olhos, os riscos associados a um refluxo de
saída desses recursos são altos.
Essa é a questão que tem embalado o debate sobre controles de
capital. A economia brasileira tem
abocanhado uma grande fatia
desses recursos de curto prazo.
Prova disso são a apreciação do
real que já chega a 20% neste ano
-embora a última semana tenha
sido de desvalorização- e o recuo de 40% no risco-país.
Segundo Luis Fernando Lopes,
economista-chefe do JP Morgan,
os investimentos em títulos da dívida soberana de países emergentes têm sido de, aproximadamente, US$ 650 milhões por uma média móvel de quatro semanas. O
Brasil, nas contas do economista,
tem recebido 20% disso, ou cerca
de US$ 130 milhões: "Desde antes
da crise asiática, não vemos nada
parecido com isso".
Esse movimento tem despertado duas preocupações principais.
A primeira se refere às contas externas. Alguns economistas temem que uma forte valorização
da moeda prejudique a competitividade do país, reduzindo o saldo
da balança comercial.
A segunda é fruto do trauma
das crises financeiras dos últimos
anos e está associada ao temor de
que uma saída repentina e maciça
de capitais de curto prazo desestabilize a economia do país.
É quase unanimidade entre os
economistas que o governo deveria tomar alguma medida para
evitar que o real se aprecie excessivamente. Mas o cardápio de receitas sugeridas é variado. Sergio
Werlang, diretor do Banco Itaú, e
Lopes, do JP Morgan, acham, por
exemplo, que o Banco Central poderia começar reduzindo o percentual de rolagem da dívida atrelada ao câmbio, hoje equivalente a
34,7% do endividamento total.
"Sou a favor de um câmbio mais
desvalorizado, em torno de R$
3,10", afirma Werlang. O dólar
encerrou a última sexta-feira cotado a R$ 2,945.
Lopes diz que as operações de
"swap" cambial ofertadas pelo BC
têm dado ao mercado chances de
arbitragem: bancos, por exemplo,
têm captado recursos lá fora e
aplicado aqui a taxas mais altas. A
remuneração do chamado cupom cambial (taxa de juros em
dólar recebida por quem compra
"swap cambial") já caiu bastante,
mas ainda tem dado ganhos
anuais em torno de 6%. "Se o BC
elimina essa chance de arbitragem, reduz o apetite do capital de
curto prazo pelo país", diz Lopes.
Para o economista Fernando
Cardim, da UFRJ, o governo já
poderia ter tomado outras medidas mais heterodoxas, como a intervenção direta no mercado de
câmbio ou a adoção de alguma
forma de controle cambial na entrada de recursos do país.
"O atual governo, como o anterior, parece imune às evidências
do risco de fluxos de capital especulativo. O risco disso é que, novamente, a gente acabe aprendendo à força num momento de refluxo desses capitais", diz Cardim.
Divergências sobre o que fazer
no curto prazo à parte, os economistas concordam que, se o fluxo
de capitais de curto prazo aumentar muito, vale considerar alguma
forma de controle que limite a entrada desses recursos. Sugestão
que, há bem pouco tempo, ofenderia ouvidos mais liberais.
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