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Sistema norueguês prevê forte ação estatal
Modelo cogitado pela equipe de Lula dá ao governo poderes para escolher empresas privadas que vão explorar os campos de petróleo
No padrão adotado pelo país nórdico, não há leilão nem licitação para decidir as petrolíferas que vão extrair o óleo de sua costa marítima
VALDO CRUZ
ENVIADO ESPECIAL A OSLO
Decidida a criação de uma estatal para gerir a riqueza do
pré-sal, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria de definir
se também copiará outras regras do modelo norueguês. Entre elas, a que dá ao governo
nórdico praticamente plenos
poderes para escolher as empresas privadas que vão explorar os campos de petróleo do
país, inclusive nos quais a sua
estatal será a parceira.
No modelo norueguês, considerado o preferido pelo governo brasileiro, não há leilão nem
licitação para decidir que companhias petrolíferas vão extrair
o óleo de sua costa marítima. A
última palavra é do governo.
Criado em 2001 pelo Partido
Trabalhista, hoje no comando
do país numa coalizão que conta também com socialistas e
conservadores, o atual modelo
norueguês estipula que as empresas interessadas devem
apresentar suas propostas para
exploração de determinado
campo ao Diretório de Petróleo
da Noruega.
Órgão similar à ANP (Agência Nacional de Petróleo), mas
não independente e vinculado
ao Ministério do Petróleo e
Energia. Cabe a esse diretório
analisar tecnicamente as propostas. O passo seguinte é informar aos ministros de Finanças e do Petróleo as empresas
que considera mais experientes, com capacidade financeira
e tecnologia para ganhar o direito da exploração.
Com base nesses estudos do
diretório, o governo faz a escolha. Inclusive se a estatal norueguesa, a Petoro, será ou não
sócia daquele campo. Decisão
sempre tomada de acordo com
o potencial da reserva em disputa pelas empresas privadas.
No Brasil, seria o mesmo que
a ANP convocar as empresas a
apresentar propostas para explorar um campo da camada de
pré-sal, analisá-las tecnicamente e preparar um relatório
ao Palácio do Planalto apontando aquelas que o órgão acredita terem as melhores condições para ganhar a disputa.
Em seguida, o governo brasileiro analisaria o relatório da
ANP, faria a escolha final e decidiria se a futura estatal entraria naquele negócio.
Nesse caso, se for copiar totalmente o modelo do país nórdico, a estatal brasileira, que alguns já chamam de "Petro-Sal",
teria de investir dinheiro próprio na exploração daquele
campo na proporção de sua
parte na sociedade.
É assim na Noruega, onde a
Petoro, a estatal 100% controlada pelo governo, tem participações que vão de 5% a 65% em
vários campos de petróleo na
plataforma continental. Optando por essa via, o Brasil teria de
garantir fontes de financiamento para a futura estatal.
Na Noruega, o governo pode
também decidir que a sua empresa ficará de fora de certas
áreas. Nesse caso, o Estado deixa de ter participação direta no
negócio, não lucrando com o faturamento do consórcio, mas
recebe impostos pagos pelas
petrolíferas -hoje na casa dos
78%. Tributos cobrados de todas as empresas do setor. Já a
Petoro, a estatal pura, é isenta.
Ela funciona hoje como administradora da riqueza do petróleo. Não é, porém, operadora,
não comanda plataformas. Isso
fica por conta de uma das empresas que participa com ela da
exploração do campo.
Statoil
Além da Petoro, o governo
também controla a Statoil, a
primeira estatal norueguesa no
setor, da qual possui 62,5% das
ações. É a Petrobras daqui, que
opera diretamente os campos,
tem ações em Bolsa e investimentos em outros países, o que
a sua irmã puramente estatal
não pode fazer. Criada em 1971
também pelo Partido Trabalhista, legenda de linha parecida com a do PT, a Statoil surgiu
logo depois das descobertas dos
megacampos de petróleo. Até
então, o setor privado era quem
se arriscava no negócio de encontrar óleo na costa do país.
Ao longo dos anos, tornou-se
uma empresa poderosa com as
descobertas das grandes reservas de óleo, que fizeram da Noruega o terceiro maior exportador mundial de petróleo e o
quinto produtor.
O tamanho e a autonomia da
Statoil incomodaram o governo local, da mesma forma que a
Petrobras no Brasil. Quando os
conservadores assumiram o
poder, decidiram em 1985 reduzir a força da estatal. Retiraram dela vários privilégios, como o que garantia ser dona de
ao menos 50% de todo campo
de petróleo explorado no país.
Essa riqueza foi transferida a
um fundo, que passou a administrar os interesses do Estado
no petróleo. Hoje tem em caixa
quase US$ 400 bilhões. No início, porém, a Statoil ainda era
responsável pelo fundo, apesar
de não lucrar com ele.
Os recursos têm como objetivo, como dizem os noruegueses, garantir as futuras gerações, bancando, por exemplo,
aposentadorias. São totalmente aplicados no exterior. No
país, só podem ser gastos 4%
dos rendimentos.
Em 2001, veio a última mudança, com a volta ao poder do
Partido dos Trabalhadores. A
Statoil perdeu o controle do
fundo e, em contrapartida, foi
autorizada a abrir seu capital.
Passou a ser uma empresa mista, como a Petrobras. Em seu
lugar, a Petoro foi criada para
administrar o dinheiro do fundo e ser a representante do governo norueguês no setor.
O jornalista VALDO CRUZ
viajou a convite do governo da Noruega
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