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CURTO-CIRCUITO
Setor atravessa crise desde 99; desvalorização cambial, apagão e efeitos da privatização minam empresas
Balanços das elétricas devem continuar no vermelho
SANDRA BALBI
DA REPORTAGEM LOCAL
Os balanços de 2002 das principais empresas do setor elétrico
deverão mostrar prejuízos, mais
uma vez, segundo projeções de
analistas de mercado. As empresas começarão a divulgar seus resultados no próximo mês, estampando a crise que o setor atravessa desde 1999.
Os analistas do Unibanco projetaram os resultados de nove empresas, distribuidoras e geradoras, com ações em Bolsa. Dessas,
seis devem ter prejuízo: Eletropaulo (R$ 480 milhões), Light (R$
638 milhões), Cemig (R$ 1,138 bilhão) Celesc (R$ 56 milhões),
Tractbel (R$ 296 milhões) e Cesp
(R$ 3,286 bilhões).
Três empresas registrarão a última linha do balanço em azul, embora pálido. São elas: Coelce (R$
77 milhões), Copel (R$ 81 milhões) e Emae (R$ 63 milhões).
Segundo Sérgio Tamashiro,
analista do Unibanco, os prejuízos só devem começar a virar lucro neste ano.
O que deve reanimar o setor
neste ano é um leve aumento do
consumo, estimado em 2%, e os
reajustes tarifários, que ficarão
entre 10% e 30%.
A partir do ano que vem, as projeções são de crescimento anual
de 4,5% da demanda de energia, o
que dará novo gás às empresas.
"As exceções serão a Cesp e a
Light", diz Tamashiro.
A Light continuará no vermelho
por mais cinco anos. "As projeções mostram que a empresa só
deverá ter lucro a partir de 2008",
afirma Tamashiro.
O alto endividamento e um índice de perda de energia em torno
de 20%, devido aos roubos praticados por meio de ligações clandestinas, tornam a empresa um
caso à parte.
Já a Cesp continuará no negativo, pressionada pelo pesado endividamento, mas reduzirá o prejuízo para R$ 1,899 bilhão neste
ano e para R$ 863 milhões em
2004.
Origens
As dificuldades em que mergulharam nos últimos anos as gigantes do setor, como as distribuidoras Eletropaulo e Light e geradoras como a Cesp, devem ser analisadas à luz da história do setor.
Segundo especialistas ouvidos
pela Folha, na base da crise atual
está o modelo de privatização que
levou ao endividamento das empresas, não estimulou novos investimentos e desembocou no racionamento de energia e na queda
da qualidade dos serviços. Nas estatais, a raiz da crise está no seu
uso para absorver parte da dívida
externa do governo e a contenção
das tarifas, no passado.
"O modelo de privatização desenhado pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) induziu as distribuidoras à situação atual de inadimplência e desequilíbrio financeiro", diz James Correia, diretor
da DZ Negócios com Energia.
O modelo desenhado pelo
BNDES, segundo ele, visava obter
o maior retorno possível nos leilões de privatização e, para isso,
deixou de incluir cláusulas que
obrigassem as empresas a investir
na expansão e na garantia de continuidade dos serviços.
"Se as distribuidoras fossem
obrigadas a investir após a privatização, isso teria de entrar no fluxo de caixa descontado, o que reduziria o valor da empresa", observa Correia. O fluxo de caixa
descontado (que mede a capacidade de gerar receitas) foi o método de avaliação das empresas usado pelo governo para fixar seu
preço mínimo.
Do ponto de vista do governo, a
privatização foi um sucesso: repassou US$ 7,5 bilhões de dívidas
das antigas estatais aos novos
controladores e carreou para os
cofres públicos (federal e estaduais) US$ 22,2 bilhões, segundo
o BNDES. Desse total, 48% vieram do próprio banco, via empréstimos, e de fundos de pensão.
O restante foi recurso externo,
dos controladores. Esses investimentos foram feitos por meio de
uma Sociedade de Propósito Específico (SPE), que tinha capital
simbólico e era controlada por
empresas criadas em paraísos fiscais pelos grupos internacionais
que participaram da privatização.
"Para realizar a compra, a SPE
contraía empréstimos com a própria matriz e com o BNDES", diz
Carlos Kirchner, diretor do Ilumina (Instituto de Desenvolvimento
Estratégico do Setor Elétrico).
Segundo ele, com a aprovação
da Aneel, essas SPEs acabaram incorporadas pelas empresas privatizadas, que assumiram, assim, as
dívidas com sua privatização e
aquelas transferidas pela estatal
ao novo proprietário. Com as desvalorizações do real em 1999 e em
2002, as dívidas explodiram, desequilibrando as empresas.
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