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RECEITA ORTODOXA
Inflação replicante não cede, embora taxa básica tenha subido
Política monetária está em
xeque, apesar dos juros altos
ÉRICA FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL
A resistência da inflação em
cair, apesar das constantes elevações das taxas de juros, tem colocado em xeque a eficiência da política monetária no Brasil. Essa
questão ocupa o centro do debate
econômico no país recentemente.
A lógica por trás de uma política
monetária restritiva, de alta de juros, é o combate ao descontrole
inflacionário.
Em tempos de inflação, famílias
e empresas preferem consumir e
investir mais a ver seus recursos
corroídos pela alta de preços. Para
acompanhar o aumento da demanda, os preços sobem, podendo levar a um surto inflacionário.
O governo, então, lança mão de
instrumentos de política monetária, que têm na alta de juros seu
principal representante.
Quando a Selic sobe, provoca a
elevação de todas as outras taxas
de juros da economia. Assim, o
crédito -fundamental para a viabilização do consumo e dos investimentos- fica mais caro.
As pessoas e empresas passam a
evitar contrair financiamentos e
se sentem estimuladas a aplicar
seus recursos para lucrar com os
juros mais altos. Menor demanda
leva a uma redução dos preços.
Essa é a lógica por trás de uma
política monetária restritiva em
todo o mundo. O que muda é o
grau de eficiência que os instrumentos de política monetária têm
em cada economia.
O problema no Brasil é que desequilíbrios macroeconômicos
fazem com que a eficácia da política monetária seja normalmente
menor do que em outros países.
Em primeiro lugar, cerca de
60% da dívida interna brasileira é
corrigida por taxas de juros pós-fixadas e de curto prazo.
A renda dos detentores dos títulos dessa parcela de dívida, portanto, aumenta cada vez que os
juros sobem. Ou seja, o efeito do
aperto monetário é, parcialmente,
comprometido.
Os investidores acabam tendo
dinheiro extra para consumir, em
vez de se sentirem compelidos a
poupar para recuperar a riqueza
perdida (o que acontece quando a
dívida é remunerada por taxas
prefixadas que ficam defasadas
quando os juros sobem).
Esse tema foi discutido em um
estudo do economista Affonso
Celso Pastore ("Por que a política
monetária perde a eficácia?"), de
1996 e, mais recentemente, em
um artigo publicado na Folha pelo também economista João Sayad.
Outro empecilho à inibição do
consumo por conta da alta de juros, como lembra Octavio de Barros, economista-chefe do BBV
Banco, é a pequena demanda por
crédito no Brasil em comparação
a outros países.
Esses problemas, somados a
deslizes recentes, têm corroído a
credibilidade da autoridade monetária, segundo Joel Bogdanski,
atual gerente de política monetária do Itaú e ex-coordenador da
equipe do BC que implantou o regime de metas de inflação.
Dois fatores principais contribuíram para isso: o não-cumprimento das metas de inflação em
2001 e em 2002 e a decisão do BC
de passar a utilizar, a partir do ano
passado, o conceito de meta ajustada, que muda ao sabor dos choques sofridos pela economia.
Segundo Bogdanski, para piorar, os cenários traçados pelo BC
têm se mostrado cada vez mais
distantes dos esperados pelo mercado. "Quando as expectativas do
mercado começam a ficar contra
o BC, o regime está morto."
A recuperação dessa credibilidade é considerada fundamental
para que a eficácia da política monetária aumente.
João Luis Mascolo, economista
e professor do Ibmec, lembra que
outro passo fundamental para o
controle da inflação é a realização
de reformas que levem à redução
da necessidade de financiamento
do governo e ao aumento da sua
credibilidade. "A credibilidade
abalada levou o BC a ter de emitir
moeda para se financiar, pressionando a inflação."
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