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ENTREVISTA
"As pessoas estão perdidas", diz deputado, que aprova alta dos juros
"Coeficiente de ignorância" puxa a inflação, diz Delfim
Patrícia Santos -19.dez.02/Folha Imagem
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O deputado federal Delfim Netto em seu escritório em São Paulo |
DA REPORTAGEM LOCAL
O Brasil não tem como fugir da
política de juros altos para combater as pressões inflacionárias
causadas por erros do governo
passado. Essa é a opinião do economista Antonio Delfim Netto,
crítico mordaz da gestão de FHC.
Para Delfim Netto, a dispersão
nas expectativas de inflação, provocada pela perda de credibilidade do BC, criou um "coeficiente
de ignorância" que leva as pessoas
a jogar os reajustes de preços e salários para cima e gera inflação.
Em entrevista à Folha, o economista, que é deputado federal pelo
PPB, elogiou a condução da política econômica do governo Lula:
"O PT está na direção certa".
(ÉRICA FRAGA)
Folha - A política monetária no
Brasil é menos eficiente que em outros países?
Antonio Delfim Netto - A idéia de
que a política monetária é um instrumento totalmente eficaz é
equivocada. Por trás disso está a
idéia de que a taxa de juros nominal de curto prazo influencia totalmente a taxa de juros real, de
que essa relação é direta. Mas ela
não é direta nem totalmente segura. No Brasil há outros entraves à
eficácia da política monetária. O
fato, por exemplo, de se usar pouco crédito atrapalha. Quanto menos crédito você usa, menor a eficiência do mecanismo de transmissão dos juros [da taxa básica
para as taxas de mercado".
Folha - O governo Lula está promovendo um repeteco das políticas do governo FHC?
Delfim - Nós temos hoje um modelo de metas de inflação. Temos
também um regime de câmbio
flutuante e a consciência clara da
necessidade de perseguir um absoluto equilíbrio fiscal. Esses três
pilares foram adotados e continuam aí porque são fundamentais para o bom funcionamento
da economia. A coisa cômica é
imaginar que esses pilares foram
inventados pelo FHC. Seria a
mesma coisa que imaginar que ele
inventou a lei da gravidade.
Folha - Mas a principal crítica ao
PT é em relação à condução da política econômica, aos juros altos...
Delfim - O Brasil sofreu graves
problemas no ano passado. A
partir de abril de 2002, tivemos
grandes barbeiragens do Banco
Central. Essa inflação que está aí
foi criada pelo FHC, ao emitir títulos cambiais em excesso, ao aumentar a base monetária, ao dizer
que, se o candidato dele não vencesse, o Brasil viraria a Argentina.
Isso exacerbou o efeito dos choques externos sobre a economia,
contribuiu para a alta do dólar.
Folha - Isso criou a necessidade
de uma política monetária mais
contracionista também?
Delfim - Você sobe os juros para
cortar a demanda de setores que
não têm tarifa fixada. É triste mesmo, é desagradável, mas é isso aí.
O PT está na direção certa.
As pessoas ficam falando, sugerindo leniência ao governo, dizendo que a gente pode aguentar
um pouco de inflação. Mas não
dá, nosso passado nos mostrou isso. Se o governo fizer isso, a inflação do ano que vem virá ainda
maior. E os custos da política monetária no futuro acabarão sendo
muito maiores do que agora.
Outra besteira é sugerir que o
controle do câmbio pode conter a
inflação. Isso, na verdade, é uma
daquelas tolices que não morrem.
O câmbio não é uma variável que
se possa controlar. Essa discussão
assumiu um caráter que, em vez
de ajudar a resolver os problemas,
atrapalha um pouco.
Folha - Por que as expectativas de
inflação continuam subindo?
Delfim - As expectativas deixaram de ser coordenadas. As pessoas ficam, então, perdidas, não
sabem quanto esperar de inflação,
então não sabem quanto pedir de
reajuste de salário, não sabem
quanto aumentar seus preços.
Então, todo mundo passa a aplicar um coeficiente de ignorância
sobre seus preços [risos". E o problema é que o coeficiente de todo
o mundo é positivo. Isso exerce
um papel de pressão que acaba
aumentando a inflação.
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