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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS
Futuro da UE pode estar nas mãos da Inglaterra
GILSON SCHWARTZ
ARTICULISTA DA FOLHA
A construção da União
Européia sempre encontrou nos ingleses uma forte resistência, talvez um resquício da
resistência oferecida pelo país
aos ataques aéreos alemães na
Segunda Guerra Mundial.
Aliás, o tema está a tal ponto
vivo que David Letterman, célebre entrevistador televisivo nova-iorquino, comentou em tom
de piada que da última vez em
que os franceses vacilaram diante do "inimigo comum" foram
os norte-americanos que afinal
tiveram de guerrear para libertar o país da ocupação alemã.
O fato é que a ruptura dos Estados Unidos com a aliança
franco-alemã, que constitui o
alicerce econômico da União
Européia, coloca agora a Inglaterra numa posição de força
diante dos planos de fortalecimento da zona do euro.
A ponta do iceberg é a disputa
em torno do destino dos despojos da guerra do Iraque, butim
que inclui nada menos de 30%
das reservas mundiais de petróleo e, adicionalmente, a julgar
pela intensidade dos bombardeios da última sexta-feira, volumosos contratos de engenharia civil que surgirão quando começar a reconstrução do país.
Os ingleses já apresentaram
resolução à ONU (Organização
das Nações Unidas) em favor da
criação de uma autoridade de
ocupação no Iraque, responsável pela administração do processo de reconstrução. A França
rapidamente repudiou a proposta.
O primeiro-ministro Tony
Blair tenta apelar para o pragmatismo, mas esse é um valor
mais britânico que continental.
O mecanismo de controle econômico mais importante é a gestão dos chamados recursos humanitários provenientes da venda de petróleo iraquiano. Ao
transferir esse controle para as
autoridades iraquianas, as Nações Unidas acomodaram preferencialmente os interesses comerciais e militares da França e
da Alemanha.
Agora, os Estados Unidos exigem que a reconstrução do Iraque comece com a transferência
desse poder para as Nações Unidas, uma vez aprovada uma resolução autorizando a liderança
de ingleses e americanos na instalação de uma autoridade de
ocupação.
O fato é que, além do Iraque, a
União Européia também precisará de uma reconstrução. Reconstrução geopolítica, mas
também econômica e financeira. Os bancos alemães já solicitam um programa emergencial
de socorro.
O acesso a energia é um fator
importante na organização do
desenvolvimento econômico.
No mapa mundial do petróleo, as reservas do Golfo são relativamente mais importantes
para a União Européia do que
para os Estados Unidos, que têm
amplas reservas domésticas e
contam com fornecedores ao
norte e ao sul das Américas (como os recursos do Canadá, mas
também do golfo do México e da
Venezuela).
Ao atacar e tomar as reservas
do Golfo, os Estados Unidos
controlarão fontes que são decisivas para o crescimento principalmente dos países europeus (e
da Ásia, especialmente a China,
que está passando o Japão como
consumidora de energia não-renovável).
Erram os que vêem na ocupação do Golfo uma simples relação linear entre controle de reservas e queda nos preços do petróleo, algo que favoreceria o
crescimento em todo o mundo,
sobretudo o dos EUA. A dimensão geopolítica estratégica crucial é o controle do crescimento
mundial.
A Inglaterra, ao se colocar como a mediadora entre a UE e o
poder norte-americano, pode
estar com o futuro da economia
européia nas mãos.
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