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MERCADO EM TRANSE
Tática consiste em segurar os estoques e frear a comercialização de soja para o mercado externo
Exportadores especulam com a alta do dólar
ÉRICA FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL
Produtores e exportadores de
soja decidiram apostar todas as fichas na alta do dólar. Enquanto
esperam o real se desvalorizar
ainda mais, estão segurando seus
estoques e freando as vendas do
produto para o mercado externo.
Essa tem sido uma fonte extra de
pressão sobre a moeda norte-americana que, por conta da crise
que assola o mercado financeiro
do país, atingiu cotação recorde
de R$ 2,84 na última sexta-feira.
Estimativa do BankBoston indica que, nos últimos dois meses,
cerca de US$ 400 milhões deixaram de entrar no país por conta
do atraso nas exportações da soja.
Em tese, esse cenário deveria ser
diferente. As exportações de soja
neste primeiro semestre já poderiam ter representado a entrada
de um volume de dólares para o
país superior ao conseguido no
mesmo período em 2001 por, pelo
menos, três razões.
Mesmo nível de 2001
O preço internacional da soja se
recuperou recentemente e está
agora, pelo menos, no mesmo nível do de 2001.
A safra esperada para este ano
no Brasil deve superar a do ano
passado e atingir a marca recorde
de mais de 40 milhões de toneladas. Além disso, segundo analistas, o Brasil não teria dificuldades
em aumentar seu volume de vendas no mercado externo.
Apesar disso tudo, dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior mostram que a receita conseguida
com as exportações de soja neste
ano tem estado aquém da registrada no mesmo período em 2001.
Queda de 40%
Essa diferença se acentuou ainda mais em maio e nas primeiras
duas semanas de junho, quando a
média diária da receita de exportações de soja está cerca de 40%
abaixo do valor apurado no mesmo período de 2001.
Não por acaso, foi nos últimos
dois meses que a desvalorização
do real frente ao dólar se acelerou.
O objetivo de exportadores e
produtores, ao segurar as vendas
da soja, é tentar conseguir lucros
mais altos com a desvalorização.
Como a soja é comercializada lá
fora em dólares, quanto mais alta
a cotação da moeda norte-americana no Brasil, maior será o retorno do exportador em reais quando a transação for fechada.
A média diária das exportações,
que estava girando em torno de
US$ 17 milhões em maio e início
de junho, só subiu para US$ 23
milhões na segunda semana deste
mês, depois que o Banco Central
passou a intervir no mercado para
conter a desvalorização. Sinal de
que o valor das exportações poderá melhorar agora.
Ainda assim, segundo Iwao
Myiamoto, presidente da Associação Brasileira de Produtores de
Soja (Aprosoja), cerca de 50% dos
estoques do produto estão guardados à espera do momento ideal,
em que o produtor poderá embolsar mais com a venda.
"Os produtores estão guardando os grãos como capital de giro.
É a moeda soja", disse Myiamoto.
De acordo com Myiamoto, é
mais rentável guardar a soja do
que aplicar dinheiro em banco.
Anderson Galvão, analista da
consultoria MPrado, especializada em agricultura, diz que a soja
tem ficado armazenada nos portos, enquanto os exportadores esperam o dólar se valorizar.
Atraso
Mas ele lembra que há outros
motivos para o atraso nas vendas
de soja este ano. Segundo Galvão,
a China passou a exigir certificados de que a soja não é transgênica dos países dos quais importa .
Isso encareceu o custo dos exportadores. A recente paralisação da
Receita Federal também é citada
como motivo de possível atraso
no embarque da soja.
Por tudo isso, o analista revisou
sua estimativa de volume de exportação da soja em 2002. Antes,
previa vendas de 17,5 milhões de
toneladas. Agora, espera menos:
16,8 milhões. De toda forma, a cifra deve superar as 12,6 milhões
de toneladas exportadas em 2001.
Analistas lembram que os produtores têm o direito de esperar
para vender a soja no momento
que considerarem mais apropriado. Mas ressaltam que o atraso na
comercialização acaba contribuindo para a piora da crise financeira e do cenário econômico.
"Agora, qualquer fluxo de entrada de dólares contribuiria para
uma menor desvalorização do
real", diz Marcelo Cypriano, economista do BankBoston. Isso poderia levar a uma pressão menor
sobre a inflação, disse.
Receita de café
A exportação de outros produtos agrícolas está representando
ganhos menores em dólar neste
ano do que em 2001. As exportações de café significaram uma entrada média de US$ 3,3 milhões
por dia no país durante a primeira
quinzena de junho. O valor está
23% abaixo que o conseguido no
mesmo período em 2001. Mas, no
caso do café, a receita menor é
consequência principalmente na
queda do preço do produto no
mercado internacional.
Alexandre Schwartsman, economista-chefe da BBA Corretora,
lembra que a redução de preços
das commodities no mercado externo nos últimos anos explicam
porque a desvalorização do real
não trouxe o boom esperado para
as exportações.
Segundo Schwartsman, mais do
que nunca as exportações de produtos primários serão importantes para o país. Com a crise argentina, a expectativa é que o Brasil
venda menos produtos manufaturados que iam, em sua maioria,
para o país vizinho.
Colaborou Cíntia Cardoso,
da Reportagem Local
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