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"FASE DOIS"
Segundo documento do governo, setores considerados estratégicos terão prioridade na concessão de benefícios
Política industrial deve estimular fusões
VALDO CRUZ
DIRETOR-EXECUTIVO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Um dos pilares da "fase dois" da
economia no governo Luiz Inácio
Lula da Silva, a política industrial
vai estimular a fusão de empresas
de pequeno e médio porte e dará
prioridade à concessão de benefícios e incentivos fiscais a quatros
setores da economia que foram
classificados como estratégicos:
componentes microeletrônicos,
programas de computador, medicamentos (sobretudo os genéricos) e bens de capital (máquinas e
equipamentos).
A Folha teve acesso ao documento "Diretrizes de Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior". É a versão quase
acabada para o que há de mais polêmico hoje no debate econômico
e que opõe os chamados "desenvolvimentistas" aos que se preocupam mais com o ajuste das
contas públicas. O texto ensaia
um difícil equilíbrio entre as duas
correntes.
No caso das fusões -uma novidade no debate da política industrial-, a intenção do governo seria aumentar as condições para as
empresas nacionais competirem
no mercado internacional. Não
há indicações no documento dos
setores que poderão ser alvos desse "estímulo" governamental.
Depois de meses de discussão
na Câmara de Política Econômica, agora só falta o grupo composto por representantes dos ministérios da Fazenda, do Planejamento, do Desenvolvimento e do
Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) bater o martelo. Isso está marcado para acontecer na quarta-feira.
Em favor dos "desenvolvimentistas", o documento diz que o
mercado não dá conta de construir nem sustentar um ambiente
fértil para as inovações e defende
claramente o uso de mecanismos
de política industrial, como incentivos fiscais e subsídios, além
de crédito facilitado.
Somente neste ano, a Receita
Federal já abrirá mão de arrecadar cerca de R$ 24 bilhões em benefícios tributários.
O documento não fala em custo
da nova política industrial, mas o
Ministério da Fazenda condiciona a concessão de novos incentivos ao cancelamento de parte daqueles concedidos atualmente,
como as deduções de gastos com
educação e saúde no Imposto de
Renda da classe média.
A principal contribuição dos
chamados "fiscalistas" aparece
nas contrapartidas que o documento exige dos futuros beneficiários de incentivos fiscais, a serem concedidos por um tempo limitado.
Os empresários que forem beneficiados terão de cumprir metas de exportação ou criação de
empregos. As contrapartidas, diz
o texto, têm um objetivo: "Premiar a eficiência, para que a política não seja entendida com uma
benesse".
Os resultados dos programas
deverão ser divulgados em relatórios anuais e checados por meio
de auditorias -outra novidade
introduzida na história dos incentivos fiscais no país.
Um grupo interministerial ficará encarregado de monitorar
mercados, empresas, setores econômicos e detectar arranjos produtivos. Além disso, o grupo também deverá acompanhar o cumprimento dos compromissos assumidos.
Opções estratégicas
O objetivo da política industrial
é reafirmado na introdução do
documento: a intenção do governo é tornar a indústria brasileira
mais competitiva para disputar o
mercado externo e substituir importações. Como não sobram recursos públicos, será dada prioridade a setores de tecnologia de
ponta, aqueles em que a balança
comercial brasileira mostra maior
fragilidade.
O documento apresenta os quatro setores que merecerão "ação
governamental mais intensa" por
representarem novas oportunidades de negócios na fronteira do
conhecimento tecnológico. No
jargão dos técnicos, são setores
"portadores de futuro".
A indústria de microcomponentes é uma das que mais crescem. A intenção do governo não é
atrair empresas estrangeiras para
produzir aqui a um custo menor e
exportar seus produtos, como se
cogitou no governo Fernando
Henrique Cardoso, mas engajar o
país na pesquisa tecnológica.
O documento da política industrial menciona que já houve no
país 23 companhias produzindo
semicondutores no final dos anos
80, a maioria ligada a grupos estrangeiros; atualmente, elas estão
limitadas a três empresas. "A retomada da produção de semicondutores é um desafio", diz.
No caso dos programas de computador, a política industrial procurará garantir competitividade
aos softwares brasileiros no mercado internacional. O país tem o
sétimo maior mercado de programas do mundo, que movimentou
US$ 7,7 bilhões em 2001. Mas as
importações superaram em muito as exportações: US$ 1 bilhão
contra US$ 100 milhões.
A balança comercial também
está no vermelho em outro setor
considerado estratégico, o de fármacos e medicamentos. Diz o documento que as importações de
medicamentos prontos mais do
que quintuplicaram na última década, e a importação de fármacos
quase dobrou no mesmo período.
A intenção é concentrar esforços na produção de princípios ativos e de fármacos a partir de plantas encontradas no país. A produção doméstica seria estimulada
não apenas por financiamentos
especiais como por garantia de
compras governamentais.
O documento critica a abertura
da economia nos anos 90, que teria "desprotegido" a indústria local de máquinas e equipamentos
por meio de incentivos à importação desses bens de capital.
A indústria automotiva é citada
como exemplo disso. O objetivo é,
mais uma vez, limitar a importação quando não houver similares
nacionais.
Setores tradicionais
Embora a atenção da política industrial esteja voltada para tecnologias de ponta, os setores mais
tradicionais da indústria podem
ser contemplados com apoio a financiamento destinado à modernização: aumento da capacidade
de produção, inovação tecnológica ou melhoria de design, por
exemplo.
O documento demonstra preocupação com as indústrias de
bens intermediários, como aço e
celulose, que estiverem produzindo próximas do limite da capacidade instalada.
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