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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS
Neoliberalismo se acentua na crise da globalização
GILSON SCHWARTZ
ARTICULISTA DA FOLHA
Uma crise de proporções
catastróficas se abateu, ao
longo dos últimos cinco anos,
sobre os países cuja política econômica mais fielmente seguiu o
modelo neoliberal. A ideologia
econômica neoliberal, no entanto, saiu fortalecida.
O sociólogo Pierre Bourdieu
definiu a "essência" do neoliberalismo como sendo a destruição metódica de tudo o que é coletivo, mesmo (ou até principalmente) quando aborda problemas eminentemente sociais.
Todas as políticas de desregulamentação, privatização e flexibilização de contratos sociais
compartilham essa essência negativa, cuja contrapartida supostamente positiva seria o surgimento de um mercado puro.
Ocorre uma universalização absoluta da oposição entre respeito ao mercado e toda e qualquer
outra lógica coletiva (do "cluster" industrial à Nação, passando por sindicatos e ONGs). A
utopia subjacente é a mais ampla e desimpedida movimentação de capitais pelo globo.
As novas tecnologias e mídias
digitais contribuem para essa
associação entre mobilidade
máxima e acumulação de capital e poder cada vez mais concentrado em escala internacional. O circuito onde esse "efeito
de rede" mais ganhou destaque
sempre foi o mercado financeiro, mas a tendência é muito
mais ampla.
No ano passado, uma pesquisa indicou o "efeito de rede" como fator crítico para o lucro e a
dominação de mercado das empresas de alta tecnologia. Elaborado pela consultoria Deloitte
Touche Tohmatsu, o estudo revela que empresas de alta tecnologia, para crescer, aumentar a
rentabilidade e dominar mercados, precisam maximizar o
"efeito de rede".
Esse "fator de mercado" está
na base de um enfoque denominado Hipercrescimento Para
Sobrevivência - Relatório sobre Práticas da Indústria de Tecnologia, Mídia e Telecomunicações. O efeito é simples de entender: é a tendência de um produto ou serviço de alta tecnologia aumentar de valor à medida
em que o número de usuários
ou empresas complementares
aumentam.
Um exemplo concreto é a
abertura do setor de mídia para
o capital estrangeiro. O fluxo de
conteúdo e os padrões de uso
das redes globais tenderiam, segundo o estudo, a aumentar a
concentração de poder global
sobre mentes e corações.
No Brasil, um dos poucos militantes e pesquisadores que
alertou para esses riscos foi Jair
Borin, jornalista e professor da
Escola de Comunicações e Artes
da USP, falecido na semana passada. Borin dizia que novidades
como a TV digital podem ser a
ponta do iceberg num processo
renovado de colonização cultural e indicavam outras tendências econômicas associadas ao
surgimento de novas mídias.
Ele estimava o mercado midiático brasileiro como uma
oportunidade de U$S 20 bilhões,
com base no tamanho da população, na cobrança por maior alfabetização (ampliando o mercado consumidor) e na diversificação de produtos e serviços
(mídia não é só informação,
mas agrega vendas de serviços
em grande escala).
Servindo como suporte e ao
mesmo tempo como alvo dos
"efeitos de rede", a mídia é sensível aos argumentos neoliberais
(que acentuam ainda mais o
processo de concentração).
Não é portanto absurdo que,
justamente diante de sinais evidentes do seu fracasso do ponto
de vista social, do desenvolvimento humano e da diversidade
cultural, a ideologia neoliberal
se apresente com mais força ainda. Na visão à la Bourdieu-Borin, está em curso a realização de sua própria essência.
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