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LUIZ GONZAGA BELLUZZO
Ciclo de crédito e regulação
As bolhas de ativos são endêmicas, e os BCs têm obrigação de lidar com elas enquanto é tempo
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NA EDIÇÃO deste mês, a revista
inglesa "Prospect" publica
um debate sobre a crise financeira. Entram em campo alguns
graúdos da finança e da opinião econômica: George Soros, Anatoly Kaletstky, do "London Times", Martin
Wolf, do "FT", John Gieve, do Comitê de Estabilidade Financeira do
Banco da Inglaterra, entre outros.
Vou reproduzir os trechos do debate que julguei de maior interesse
para o leitor brasileiro. Os trechos
foram traduzidos de forma livre e se
concentram na controvérsia sobre
os instrumentos mais adequados
para administrar um ciclo de crédito
com inflação de ativos.
Alto dirigente do Banco da Inglaterra, Gieve não escapa pela tangente ao comentar a responsabilidade
das autoridades no desenvolvimento das práticas e inovações que levaram ao desfecho indesejado. Diz ele:
é impossível negar que a ausência de
regulação no mercado de hipotecas
contribuiu para a eclosão da crise.
Na última euforia com a valorização
de ativos, as operações estruturadas
de crédito (vender títulos lastreados
em empréstimos hipotecários e outros) fizeram a diferença. Os que inventavam e promoviam tais produtos não tinham a menor idéia sobre
o comportamento de seus preços
em condições econômicas distintas.
O assim chamado megaespeculador George Soros desconfia das teorias que informam as decisões dos
protagonistas dos mercados financeiros. Para ele, as autoridades e os
demais participantes do jogo de avaliação da riqueza apóiam-se em uma
falsa interpretação sobre o funcionamento dos mercados. Imaginam
que tendem ao equilíbrio, e os desvios são aleatórios. Essa falsa concepção permitiu a elaboração dos
produtos estruturados e produziu
uma crise muito maior e mais
abrangente do que uma simples bolha imobiliária americana. Bolhas de
ativos são endêmicas. As autoridades reguladoras têm obrigação de lidar com elas enquanto é tempo. Não
é o caso de utilizar a política monetária, ou seja, de tentar furar a bolha
com a alta dos juros. Trata-se de
operar através do canal do crédito.
Soros, como Minsky, assegura que
os mercados financeiros lidam com
promessas e avaliações sobre o curso futuro dos ativos e dos títulos de
dívida. Estão, portanto, sujeitos a gerar endogenamente euforia e pânico. O Banco Central deve estar sempre pronto para modificar as exigências de reservas e de capital conforme a toada do ciclo econômico.
Gieve não só concorda com Soros,
como acrescenta: usar a taxa de juros para controlar um ciclo de ativos
pode produzir graves danos à economia: as taxas devem subir muito para conter as expectativas altistas e
eufóricas dos investidores. As autoridades -leia-se o BC- devem recorrer à ampliação das exigências de
capital e de liquidez para dar eficácia
anticíclica às suas políticas.
No Brasil, autoridades encarregadas da gestão da moeda e do crédito,
assim como participantes do mercado, sugerem em suas manifestações
que as receitas de Soros e Gieve são
velharias. Deveriam estar mofando
no Museu da Política Monetária. Assim pensava o ex-maestro Greenspan quando os críticos alertavam
para o desastre que se aproximava.
LUIZ GONZAGA BELLUZZO , 65, é professor titular de Economia da Unicamp. Foi chefe da Secretaria Especial de Assuntos Econômicos do Ministério da Fazenda (governo
Sarney) e secretário de Ciência e Tecnologia do Estado de
São Paulo (governo Quércia).
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