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RETOMADA RESIDUAL
Com crescimento da renda e do consumo, volume coletado pelas prefeituras cresce até 10% em julho
Reação da economia chega ao cesto de lixo
FÁTIMA FERNANDES
CLAUDIA ROLLI
DA REPORTAGEM LOCAL
A retomada da economia já pode ser medida no cesto de lixo.
Quem estuda e quem vive do lixo
notou o aumento dos resíduos sólidos por conta da reação da economia. Em pelo menos quatro capitais brasileiras -São Paulo, Rio
de Janeiro, Belo Horizonte e Vitória- subiu o volume de resíduos
gerados pelas famílias.
O aumento na coleta de lixo feita pelas prefeituras -um dos indicadores do consumo da população- chega a 10% em julho, como em Vitória, na comparação
com igual mês do ano passado.
A expansão na quantidade de lixo recolhido nas residências coincide com a recuperação da atividade econômica e com a melhora
do emprego e da renda a partir de
maio. É reflexo principalmente do
aumento das vendas de embalagens de papelão, de eletroeletrônicos e de alimentos.
Em São Paulo, a coleta de resíduos domiciliares subiu 3,2% em
julho, na comparação com igual
período do ano passado, atingindo 263,2 mil toneladas. "Esse aumento se deve principalmente ao
aquecimento da economia", diz
Fábio Pierdomenico, diretor do
Departamento de Limpeza Urbana da Prefeitura de São Paulo.
O crescimento da coleta domiciliar na cidade só não foi maior
por causa dos programas de reciclagem e da taxa do lixo, segundo
informa. Cerca de 2 milhões de
paulistanos pagam hoje essa taxa,
criada no ano passado, que varia
de R$ 6,67 a R$ 133,15.
"Quando a economia cresce, a
arrecadação de impostos aumenta, a produção sobe, e o consumo
se expande. Isso tudo tem reflexo
no que é jogado fora. Aumentam
os resíduos coletados e despejados nos aterros", afirma o economista Paulo Sandroni.
Estudo da consultoria Proema
Engenharia e Serviços mostra que
a renda tem relação direta com a
geração de lixo domiciliar. A
constatação foi feita ao estudar o
lixo gerado por diversas classes de
renda no período de 1996 a 2004
na cidade de São Paulo.
O que se verificou, segundo o
estudo, é que, nos anos em que o
PIB (Produto Interno Bruto) da
cidade cresceu, a geração de lixo
per capita também aumentou. "O
poder aquisitivo tem influência
direta no volume de lixo gerado",
diz Maria Helena de Andrade
Orth, diretora-presidente da
Proema e presidente da ABLP
(Associação Brasileira de Limpeza Pública e Resíduos Sólidos).
"A geração de lixo é um indicador de renda. Cidades como Nova
York e Tóquio geram mais lixo
que São Paulo e Buenos Aires, as
quais geram mais lixo que Bangladesh", afirma Christopher
Wells, gerente de Risco Sócio-Ambiental do Banco Real.
Outras capitais
Em Vitória, a coleta de lixo domiciliar aumentou 10,6% de janeiro a julho deste ano em comparação com igual período do ano
passado. "Em 2003, quando a economia ainda estava em recessão, a
quantidade de resíduos recebidos
pela unidade de triagem e compostagem da capital caiu. Neste
ano, já houve aumento", diz José
Celso Motta, diretor do Departamento de Tratamento de Resíduos Sólidos da Secretaria de
Meio Ambiente de Vitória.
Na capital mineira, foram coletadas, nos primeiros sete meses
deste ano, 293,1 mil toneladas de
lixo domiciliar -o que significa
crescimento de 2,17% em relação
a igual período de 2003.
Na cidade do Rio, o aumento na
quantidade de lixo recolhido nos
domicílios foi de 10,9% em junho
sobre igual período do ano passado. No semestre, o crescimento
foi de 6,11%. Apesar desse aumento, José Guimarães Bulus, diretor
industrial da Comlurb (Companhia Municipal de Limpeza Urbana), avalia que ainda é cedo para
atribuir o crescimento da coleta à
melhora da economia no Rio. "É
preciso um estudo mais detalhado sobre o lixo gerado para dizer
isso."
O que pode mascarar a relação
entre o lixo gerado e o desempenho econômico são: 1) a ampliação de coleta regular de lixo em algumas cidades; 2) a expansão de
programas de reciclagem nos
bairros e 3) o volume coletado informalmente pelos catadores.
Embora a coleta seletiva ainda
tenha pouca participação no total
de lixo coletado pelas cidades
-hoje representa no máximo
5%-, ela serve para diminuir o
volume de lixo coletado regularmente pelas prefeituras.
"O fato de uma cidade coletar
mais lixo reciclável não significa
necessariamente que a geração de
resíduos aumentou. Pode ser que
a cidade aprimorou seu sistema
de coleta", afirma Luciana Ziglio,
consultora da área ambiental.
Curitiba, primeira cidade brasileira a implementar o sistema de
coletiva seletiva e que tem o maior
índice de aproveitamento do lixo
reciclável no país, é exemplo disso. A coleta na região metropolitana da cidade vem caindo mês a
mês. No mês passado, a coleta domiciliar foi de 52,7 mil toneladas.
Em julho do ano passado, foi de
57,2 mil toneladas.
"As pessoas estão descartando
menos porque estão reciclando
mais", afirma Gisele Martins dos
Anjos, gerente de Limpeza da Prefeitura de Curitiba. Há três anos, a
coleta mensal média chegou a 61
mil toneladas.
Em Porto Alegre, também houve queda no lixo domiciliar. Em
quase todos os meses deste ano, a
coleta domiciliar foi menor do
que no ano passado. Em julho
deste ano, foi 0,75% menor que
igual mês de 2003.
Marcelo da Silva Hoffmann, engenheiro e diretor da Divisão de
Destino Final do Departamento
Municipal de Limpeza Urbana de
Porto Alegre, informa que a diminuição na coleta se deve à mudança de hábito do consumidor, ao
aumento do recolhimento informal de lixo, a alterações no tipo de
embalagens usadas pelas indústrias e aos projetos de educação
ambiental -como o de compostagem caseira.
"A população tem mais consciência ambiental. Também é fato
que o empobrecimento do país levou mais pessoas a viver do lixo",
afirma Hoffmann.
Para Ariovaldo Caodaglio, presidente do Sindicato das Empresas de Limpeza Urbana do Estado
de São Paulo, o crescimento no
volume de lixo coletado informalmente (por catadores) também
pode ser sinal de empobrecimento. "Se tivesse emprego, não estaria catando lixo", afirma.
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