São Paulo, domingo, 29 de setembro de 2002

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EM TRANSE

Tentativa de lucrar mais com dívida do governo e nova pesquisa Datafolha devem fazer dólar passar barreira dos R$ 4

Mercado prepara amanhã terça-feira gorda


ÉRICA FRAGA
FABRICIO VIEIRA
ISABEL CAMPOS
DA REPORTAGEM LOCAL

O dólar poderá bater um novo recorde nesta segunda-feira. Se o mercado financeiro continuar reagindo como na última semana, a cotação da moeda, que fechou em R$ 3,88 na sexta-feira, poderá passar dos R$ 4.
Três fatores estarão influenciando o câmbio amanhã: a nova pesquisa de intenção de votos divulgada hoje pelo Datafolha e os vencimentos, na terça-feira, de US$ 1,25 bilhão em dívida cambial e do mercado futuro de dólar. Esses vencimentos serão liquidados com base na cotação do dólar Ptax (preço médio do dólar, medido diariamente pelo BC) de segunda-feira.
A pesquisa divulgada hoje pelo Datafolha (leia no caderno Eleições) mostra o que o mercado mais temia: aumentaram as chances de Luiz Inácio Lula da Silva, candidato do PT, ganhar as eleições no primeiro turno.
Segundo o Datafolha, Lula cresceu um ponto percentual em relação à pesquisa divulgada domingo passado e atingiu 45% das intenções de voto. O tucano José Serra e Anthony Garotinho, do PSB, ficaram na mesma posição, com 19% e 15% das intenções de voto, respectivamente.
Já Ciro Gomes, do PPS, voltou a cair. Está com 11% das intenções, contra 13% da semana passada.
Considerando os votos válidos, o percentual de participação de Lula subiu de 48% para 49%. Em tese, o petista está a apenas um ponto percentual da vitória no primeiro turno. Para isso, é preciso atingir 50% dos votos válidos mais um. A margem de erro da pesquisa é de dois pontos percentuais para mais ou para menos.
O mercado deverá reagir negativamente a essa pesquisa, pois acredita que, se houver um segundo turno entre Lula e Serra, o tucano teria chance de inverter o quadro e ganhar a disputa.
Serra é o candidato do mercado e dos investidores estrangeiros. Para eles, significa a continuidade da atual política monetária e risco mínimo de atitudes radicais, como calote na dívida pública e restrições à saída de dólares do país.

Vencimentos preocupam
O vencimento de dívida pública atrelada ao câmbio na terça-feira é outro fator que tem tudo para pressionar o dólar amanhã.
O Banco Central já havia avisado que rolaria no máximo 70% do vencimento de US$ 1,25 bilhão. Na sexta, o BC deu início à operação e foram renegociados 21% dos papéis, pagando taxas próximas a 30% ao ano. O BC tentou fazer uma rolagem maior, mas falhou no intento, pois o mercado pediu taxas ainda mais elevadas. A expectativa agora é saber quanto dessa dívida será repactuado.
Na semana passada, venceram US$ 1,5 bilhão em dívida cambial. O BC optou por quitar o vencimento todo. O que se viu no mercado, nos dias que antecederam o vencimento, foi o dólar bater novos recordes.
Na avaliação de analistas, os bancos, principais detentores dos papéis, forçaram a cotação do dólar para cima com a intenção de lucrar mais com a operação. Como a liquidação desse tipo de papel é feita em reais com base no dólar Ptax, quanto mais sobe a cotação, maior é o ganho do detentor dos títulos quando a dívida é liquidada.
A expectativa é que o movimento se repita amanhã. Operadores afirmam que não há demanda suficiente no mercado para que o governo consiga rolar os 70% do lote pretendidos, exceto se pagar os juros que os detentores da dívida querem.
A taxa que o governo paga para rolar sua dívida atrelada ao câmbio acompanha o cupom cambial -projeção do valor da taxa de juros em dólar da BM&F (Bolsa de Mercadorias & Futuros).
Na sexta, o FRA -Forward Rate Agreement, que melhor mede o cupom cambial- de janeiro fechou com taxa de 54% ao ano na BM&F. Se o BC quisesse, na sexta-feira, colocar no mercado papéis cambiais que vencem em janeiro (para substituir títulos que estivessem vencendo), teria de se dispor a pagar taxas nesse nível.

Queda-de-braço
Amanhã, como em todo último dia útil do mês, também deverá haver uma disputa no mercado futuro de câmbio entre os "vendidos" (que se beneficiam com a queda do dólar) e os "comprados" (que apostam na valorização). Cada um tentará adequar a cotação a seu interesse. A previsão é que os vendidos prevaleçam sobre os comprados, ou seja, que a pressão maior seja para o câmbio se valorizar.
O estresse do mercado não deverá acabar nesta segunda-feira. Nos próximos dias, outros fatores poderão influenciar negativamente a cotação do dólar em outubro, como a pesquisa de intenção de voto do Ibope na terça-feira e o vencimento, ao longo do mês, de lotes de dívida pública e privada em dólar.
O mercado está particularmente temeroso em relação à dívida pública cambial que vence no dia 17 de outubro, no valor de US$ 3,62 bilhões. O lote é grande, e o novo presidente da República já poderá estar eleito.
Não há consenso entre os analistas sobre como a cotação do dólar reagirá se Lula for eleito já no primeiro turno. Parte acha que o mercado deve se acalmar um pouco, pois os preços tendem a antecipar a vitória. Outros prevêem mais turbulência.


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