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ANÁLISE
Investidor descobre o déficit americano
VINCENT BOLAND
DO "FINANCIAL TIMES"
Alan greenspan é famoso
pela fleuma. Por isso os comentários do presidente do Federal Reserve (banco central americano) sobre a sustentabilidade do
déficit em conta corrente dos
EUA, que está em anualizados
US$ 550 bilhões, tentaram compreensivelmente tranquilizar os
mercados sobre a capacidade do
país de financiá-lo.
Como Greenspan lembrou,
"durante o ano passado, o financiamento de nosso déficit externo
foi auxiliado pelo grande acúmulo de dólares nos bancos centrais
estrangeiros". Mas algo perturbador aconteceu nos últimos meses:
apesar da queda do dólar, que deveria tornar os ativos americanos
mais atraentes, houve uma notável aceleração no ritmo em que os
investidores estrangeiros estão
comprando títulos americanos.
Segundo relatório do Tesouro,
os influxos líquidos para os mercados americanos caíram para
US$ 4,2 bilhões em setembro, o
nível mais baixo desde 1998,
quando houve a crise do fundo de
investimentos Long Term Capital
Management. A queda tem sido
acentuada: de US$ 110,4 bilhões
para US$ 90,6 bilhões em junho,
para US$ 73,4 bilhões em julho e
para US$ 49,9 bilhões em agosto.
Os comentários de Greenspan
salientam esse fato: o déficit e seu
impacto sobre o dólar são questões que os mercados não poderão ignorar por muito tempo.
O presidente do Fed disse que
até agora há "poucas evidências
de tensão no financiamento" do
déficit. Mas um exame mais minucioso dos números do Tesouro
indica que os investidores podem
ter certa razão para se preocupar.
Como disse Michael Woolfolk,
estrategista monetário do Bank of
New York, a tendência nos influxos "descobriu" o déficit em conta corrente. "Não deveríamos
exagerar os números de setembro, mas o declínio levanta uma
bandeira vermelha", diz ele.
Um dos motivos pelos quais os
investidores estrangeiros estão
vendendo títulos dos EUA, tanto
do Tesouro como de agências governamentais norte-americanas,
é o declínio dos rendimentos em
comparação com ativos em outros lugares e com as ações. Parte
da venda de títulos foi compensada pela compra de ações.
Isso não leva em conta o comportamento da categoria mais importante de detentores de títulos
americanos: os bancos centrais
asiáticos. Segundo Woolfolk, as
compras de títulos pela China,
que sustentaram a alta do dólar
durante anos, diminuíram consideravelmente, coincidindo com o
aumento do déficit comercial dos
EUA com a China.
Os asiáticos possuem pelo menos a metade do US$ 1,4 trilhão
em títulos do Tesouro americano
e de agências detidos por investidores estrangeiros.
Guerra comercial
A continuidade de seu envolvimento com esse mercado será essencial para financiar o déficit.
Vários analistas afirmaram que as
crescentes tensões entre os EUA e
seus aliados na Europa e na Ásia
poderão complicar a capacidade
americana de atrair capital.
Em particular, os EUA podem
ser obrigados a oferecer aos investidores estrangeiros condições
mais atraentes que as atuais. A
China é vital para isso. A economia chinesa poderá crescer de
10% a 12%, segundo David Bowers, principal estrategista do
banco Merrill Lynch, em uma nota a investidores.
Se a China decidir que seu capital terá retornos maiores na economia doméstica, então os EUA
terão um problema. Uma maneira de manter o fluxo estrangeiro,
portanto, será aumentar as taxas
de juros. As taxas americanas estão numa baixa de 45 anos, e há
uma sensação entre investidores
de que os juros baixos são um fenômeno permanente.
O Fed talvez seja tão responsável por essa visão popular quanto
qualquer outro. Mas embutida no
discurso de Greenspan pode estar
uma palavra de advertência para
os consumidores americanos de
que, se houver um aperto no déficit de conta corrente, as taxas de
juros terão de subir para compensar. Se for necessária uma reação
de política, como um aumento
dos juros, ela se tornaria um problema para qualquer governo.
Também pode haver um sinal
mais imediato no que Greenspan
disse. O que mais chamou a atenção foi uma advertência sobre os
riscos das guerras comerciais.
Diante das tensões no comércio
com a China e a Europa, as últimas coisas em que os EUA deveriam pensar são taxas e subsídios.
Quer os EUA gostem ou não, os
destinos do déficit e do dólar dependem muito do humor de seus
parceiros comerciais.
Tradução de Luiz Roberto Gonçalves
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