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Todo mundo ganha
Sem vencedores, jogo cooperativo propõe contar histórias a partir de palavras sorteadas em um baralho; renda será revertida para entidade de contadores que atua em 70 hospitais
FLÁVIA MANTOVANI
DA REPORTAGEM LOCAL
Era uma vez... uma história que não existe
em nenhum livro. Ou
melhor, uma não,
inúmeras histórias, com infinitas possibilidades de início,
meio e fim, existentes apenas
na imaginação das crianças que
vão contá-las. É essa a proposta
do jogo "Eu Conto", criado pela
Associação Viva e Deixe Viver,
entidade sem fins lucrativos
que reúne voluntários que contam histórias para crianças e
adolescentes hospitalizados.
O jogo traz um baralho com
104 cartas, divididas em cinco
temas: personagens, objetos,
ações, qualidades e lugares. A
idéia é que os participantes
contem uma história em conjunto a partir das palavras escritas nas cartas que forem sendo desviradas (por exemplo:
"montanha", "príncipe",
"anel", "triste", "escorregar").
O final não poderia ser mais
feliz: não há um vencedor. Todos os participantes ganham.
"No início, pensamos em criar
duas regras: uma competitiva e
outra cooperativa. Mas, na hora
dos testes com as crianças, a
parte competitiva não teve vez.
Elas foram nos dizendo como o
jogo teria que ser na prática",
conta Valdir Cimino, fundador
da Viva e Deixe Viver. Em quase 11 anos de atividades, a associação reúne 1.144 contadores,
que atuam em 70 hospitais de
20 cidades brasileiras.
Cimino conta que a idéia de
produzir um jogo para ajudar
na dinâmica de contar histórias
vem de muito tempo e envolveu vários colaboradores do
grupo. Por cerca de dez anos, os
protótipos iniciais, complexos
e cheios de peças, foram sendo
refinados até chegar ao modelo
atual, mais simplificado.
O jogo é inédito. "Dois especialistas na área nos disseram
que não há outro com esse caráter", diz Cimino.
Com a parceria da Bovespa
Social, foram produzidas 15 mil
unidades, das quais 9.000 serão
utilizadas nos projetos da associação e 6.000, vendidas ao preço de R$ 22 (vendas e informações no site www.vivaedeixeviver.org.br). Toda a verba será revertida para a entidade.
Após testes com os filhos de
seus contadores, a entidade levou o jogo para ser usado com
crianças com transtornos psiquiátricos, atendidas no Hospital Dia Infanto-Juvenil do Serviço de Psiquiatria da Infância
e da Adolescência do Instituto
de Psiquiatria do Hospital das
Clínicas de São Paulo.
Segundo a pediatra Marisol
Sendin, do IPQ, foi possível observar uma nítida mudança
nos pacientes que passaram
por atividades lúdicas em geral
e pela contação de histórias em
particular. "Há uma intensa
melhora no relacionamento
com as pessoas, na escola, nos
sintomas. E isso porque atendemos casos bastante graves."
Ela diz que o jogo ajuda os
pequenos a se expressarem.
"Ao contar as histórias, eles
acabam falando de questões
que mexem com a cabeça deles." O grupo desenvolve um
estudo para avaliar cientificamente o impacto da contação
de histórias e do brincar no
quadro clínico dos pacientes.
Valdir Cimino afirma que,
apesar de o trabalho da associação Viva e Deixe Viver focar
em crianças hospitalizadas, o
jogo foi feito para ser utilizado
também fora do ambiente hospitalar. "É indicado para qualquer criança ou adolescente e
pode ser usado por toda a família. É interessante para ser levado à sala de aula também. Ele
aumenta o repertório de palavras, estimula a criatividade e a
atenção e ajuda a introduzir o
hábito da leitura."
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