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Trajetória de Erundina é marcada por choques com o PT
ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
Luiza Erundina sempre se autodefine como "mulher, nordestina
e pobre". Além disso, ela, que diz
disputar hoje sua última eleição
ao Executivo, é católica de ir à
missa todo domingo e, aos quase
70 anos, que completa em 30 de
novembro, continua solteira convicta e mora sozinha.
Tudo somado, o principal traço
da personalidade dessa mulher
que superou inúmeros obstáculos
para se tornar prefeita da mais rica e importante capital do país é
este: a austeridade.
Isso se reflete no falar, no vestir,
no caminhar e foi decisivo -para
o bem e para o mal- na sua gestão na Prefeitura de São Paulo, entre 1989 e 1992. Em nome da austeridade, Luiza Erundina obteve
seus principais êxitos e também
cometeu seus principais erros.
Entre os êxitos, mesmo os adversários de antes e de hoje reconhecem que ela foi rigorosa ao fechar as contas da prefeitura e
rompeu com a tradição paulistana das obras e das propinas, dando prioridade às periferias e aos
desvalidos -dos quais se sente
legítima representante.
Como erros: foi arredia com a
imprensa, fechou-se a composições políticas, não teve maioria na
Câmara Municipal e não cedeu
um milímetro às pressões da cúpula do PT, partido que ajudou a
fundar em 1980 e pelo qual se elegeu vereadora e prefeita.
Resultado: isolou-se. E, apesar
de ter herdado um déficit de 36%
e tê-lo reduzido a 6% (o menor
em dez anos) e de ter feito avanços sensíveis em saúde, educação
e transportes, saiu do cargo com
um índice de rejeição imenso.
Segundo pesquisa Datafolha de
janeiro de 1990, ela ficou perdida
em 18º lugar entre os prefeitos do
país. Nada animador para quem
detinha, na época, o terceiro Orçamento da República (depois da
União e do Estado de São Paulo) e
um rol de feitos de bom tamanho.
A vitória de Erundina nas eleições de 1988 foi contra tudo e contra todos, a começar da própria
cúpula do PT, que, à "mulher,
nordestina e pobre", preferia o intelectual Plínio de Arruda Sampaio, homem, paulistano e bem-nascido. Mas ela conquistou o
principal: as bases do partido. E
com elas tentou governar. Como
reação, virou saco de pancadas
nas reuniões da cúpula.
As duras relações de Erundina
com o PT definiram não só seu futuro político como a mágoa que
marca, uma a uma, todas as suas
campanhas eleitorais. Especialmente a atual, em que amarga o
quarto lugar das pesquisas.
O auge da guerra foi em 1993,
quando Erundina, dando de ombros para uma decisão da cúpula
nacional do PT (tomada, aliás,
com diferença de apenas um voto) aceitou ser ministra da Administração Federal do governo de
transição de Itamar Franco, o vice
que tomara posse com a queda de
Fernando Collor de Mello.
"Nós contribuímos para a deposição do Collor, éramos co-responsáveis pelo governo Itamar.
Não era um favor para o Itamar,
era um dever com o país", diz ela.
De um lado, Erundina rompia
com o PT, que a suspendeu por
um ano. De outro, jamais se adequou ao governo Itamar, aliando-se aos ministros de esquerda e enfrentando os "conservadores" encastelados no Planalto. Foi uma
passagem meteórica, de 28 de janeiro a 20 de maio de 1993, até ser
demitida por telefone.
A saída definitiva do PT veio em
setembro de 1997, quando se filiou ao PSB, o mesmo pelo qual
concorre agora à Prefeitura de
São Paulo, em aliança com o
PMDB de Orestes Quércia.
"Aprendi com os erros do passado. Hoje, seria uma prefeita
completamente diferente, mais
tolerante, mais paciente, com
uma capacidade muito maior de
reconhecer os erros", diz.
Com 1m56, Erundina clareou os
cabelos e mantém o jeito de falar
apertando os olhos azuis que, na
sua terra natal, a pequenina Uiraúna, na Paraíba, lhe valeram o
apelido de "Galega".
Filha de pai artesão, numa família de oito irmãos -dois morreram neste ano de campanha-,
Erundina foi professora primária,
formou-se assistente social na Paraíba e concluiu mestrado em sociologia na USP.
Colaborou RICARDO WESTIN, da Reportagem Local
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